sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Dos «especialistas» à ausência de pluralismo e contraditório

Intuem-se coisas muito interessantes a partir desta notícia do Negócios, que garante, no seu título, que para os especialistas «é inoportuno mexer nas leis laborais». A primeira coisa que se deduz, atendendo ao perfil monolítico de quem o Negócios quis ouvir, é que o «verdadeiro» especialista em Direito do Trabalho está ligado a escritórios de advogados. É o caso de Carmo Sousa Machado (sócia da Abreu Advogados), Diogo Leote Nobre (sócio da Miranda Advogados), Nuno Morgado (sócio da PLMJ) e Fátima Remelgado (da RSN Advogados), os quatro especialistas consultados. Ou seja, esqueçam as universidades, incluindo os docentes da área nas faculdades de Direito, e esqueçam investigadores, sindicatos, empresas, organizações da sociedade civil, movimentos sociais e outros especialistas. Para saber se é «oportuno mexer nas leis laborais» basta consultar sociedades de advogados.


Conclui-se também, num segundo monolitismo, que isto das leis e das relações laborais é matéria exclusiva do Direito do Trabalho. Ou seja, esqueçam sociólogos, economistas e outros especialistas em questões laborais, oriundos de distintos domínios das ciências sociais. No seu conjunto, esse contributo, necessariamente menos afunilado e mais abrangente, como convém a uma verdadeira economia política do trabalho, não é para aqui chamado. Se estamos a tratar de legislação laboral, basta ouvir juristas, não é? Para quê perder tempo com quem pode melhor conhecer os impactos, sociais e económicos, para trabalhadores e empresas, de «mexidas» no atual quadro legislativo?

Não está em causa, note-se, a pertinência de ouvir juristas ou a opção por escritórios de advogados. E menos ainda o conhecimento ou as legítimas perspetivas dos consultados em apreço. Apenas se estranha que no Negócios não se estranhe a redundância de opiniões que daqui resulta, a ponto de as poder subsumir (apesar das nuances entre elas) no título taxativo que se deu à notícia. O que está em causa é mesmo este persistente enviesamento e monolitismo que, por preguiça, pressa, desleixo ou orientação ideológica, continua a viciar e a empobrecer, no campo mediático, o contraditório e o pluralismo no debate.

8 comentários:

Hélder Rocha disse...

Ainda assim acho que faltou consultar um representante da CIP e um gestor de recursos humanos do pingo doce.

TINA's Nemesis disse...

Também faltou consultar o Ferraz da Costa do "Fórum para a Competitividade".

Jaime Santos disse...

Não se chama 'Jornal de Negócios'? Foram naturalmente ouvir os especialistas relevantes para os negócios.

Nuno Serra, está em boa altura da Esquerda ter os seus próprios projetos editoriais em vez de se andar sempre a queixar de um viés ideológico que é absolutamente transparente na imprensa que existe.

Aliás, no mundo anglo-saxónico os jornais assumem declaradamente a sua orientação política. Só nós é que continuamos a sonhar que o jornalismo pode ser independente...

Anónimo disse...

A imprensa portuguesa é que faz questão de assumir a sua independência como se estivesse adstrita aos deveres de imparcialidade e isenção dos trabalhadores em funções públicas, salvo nos caso de imprensa partidária que, naturalmente, vê o mundo conforme a respetiva cor.

Estamos a falar de negócios/empresas que necessitam de mão-de-obra...laboral,já que gostam de advogados, e porque não o Sr. Garcia Pereira :)

Lúcio Ferro disse...

Um "viés ideológico" diz o demagogo de trazer por causa, como se não soubessemos bem que a agenda do viés ideológico é sempre a mesma: fortalecer o capital e empobrecer o trabalho, aumentando as desigualdades sociais no processo. Os meios de comunicação não passam, como diria Marx, de meios de produção e o controlo destes por parte de uma ínfima elite financeira, que o demagogo tanto parece apreciar, tem tido nas últimas décadas efeitos ruinosos ao nível da redistribuição da riqueza. Ignora ele olimpicamente esse dado e depois, cândido e inocente, clama por "projetos editoriais" que possam equilibrar a balança. Que lindo, e onde estão as somas colossais necessárias para manter esses "projetos"? Aliás, seria interessantíssmo investigar como podem continuar no ativo tantos "projetos editorais" que há décadas só dão prejuízo. Vejamos, eu próprio tenho um pequeno negócio, se este der sistematicamente prejuízo, décadas a fio, donde virá o bago para ele continuar a funcionar e, pior, dar-me rendimentos? Isso não interesa ao demagogo, mas convinha.

Anónimo disse...

Pensemos nas condições de trabalho que essas sociedades de advogados têm internamente e o tratamento que dão a estagiários e a recém contratados.
Seria o mesmo que, no séc XIX, se fosse perguntar a um capitão negreiro se achava que estava na altura de acabar com a escravatura.

Jose disse...

«como se estivesse adstrita aos deveres de imparcialidade e isenção dos trabalhadores em funções públicas»

Pode proclamar-se adstrita a esse vínculo sem correr risco de se tornar independente!

Anónimo disse...

A caixa de comentários dos Ladrões tornou-se um lixo irrelevante. Abre-se e só cá estão os três trolls do costume.

O sempre facho José e o seu Dupond, Jaime Santos, que começou por nos dizer que era socialista e que agora em nada se distingue na irrelevância provocatória do outro.
E, por fim, um terceiro que faz questão de continuamente contestar aquilo que os outros dois dizem, como se valesse a pena.

Há doze anos debatia-se e com muita gente. Agora, é terrível. Feche-se, que só serve para terapia desses três e é um desperdício abrir a caixa a procurar algo útil que só muito de quando em quando surge.

Claro que cá irá cair alguém a dizer que também o meu comentário é irrelevante. Mas eu não passo a vida metido na caixa de comentários e comentários meus há muito que nem vê-los.