terça-feira, 14 de setembro de 2021

Alojamento local e crise de habitação no Porto

Tal como no caso de Lisboa - e igualmente em contraciclo com a evolução à escala da área metropolitana e do continente - a cidade do Porto registou, na última década, uma diminuição do número de alojamentos. Aliás, esta variação negativa é também inédita em termos censitários, invertendo a tendência de gradual expansão do parque habitacional que se verificava desde 1981 (a rondar um acréscimo de cerca de 10 mil fogos por década), com a perda de 5 mil casas entre 2011 e 2021 (-3,4%, valor que contrasta com os +0,8% da AMP e os +1,4% do continente).


Tal como em Lisboa, também no Porto a relevância do alojamento local para o decréscimo do parque habitacional não pode ser ignorada nem subvalorizada. Desde logo pelos universos em causa: cerca de 8 mil unidades de AL em 2021, que comparam com a perda de 5 mil habitações. Ou seja, se pelo menos parte das unidades de alojamento local tivesse hoje uma função residencial, e não turística, o Porto não teria assistido a uma redução de casas na última década, período em que, note-se, o número de famílias residentes na cidade aumenta 1,4% (quase mais 1.500 que em 2011).


O impacto da intensificação do turismo, e em particular do alojamento local, na estrutura residencial do centro das grandes cidades, torna-se ainda mais evidente quando se procede a uma análise por freguesias. No caso do Porto, constata-se que é na União de Freguesias de Cedofeita, São Ildefonso, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória - que concentra cerca de 73% da oferta de alojamento local da cidade em 2021 - que as perdas de população (-7,4%), famílias residentes (-6,0%) e alojamentos (-12,6%) são mais pronunciadas. O que recomenda, à semelhança de Lisboa, que se trave e reduza, ou redistribua, a oferta de alojamento local na cidade.

5 comentários:

Anónimo disse...

Não faz muito sentido tirar o AL das zonas históricas da cidade. Os turistas não vêm visitar os bairros periféricos ou os dormitórios da cidade. A maior parte do AL ou está ali ou não tem razão de existir.
Os bairros históricos estão a perder população muito antes de existir AL. Um AL, ao contrário do que se pensa não dá um lucro substancialmente superior a um aluguer de longa duração. Se se criarem condições que tornem os alugueres de longa duração viáveis eles aparecem. Se não se mudar nada e se fecharem os AL os edifícios voltam ao que estavam, fechados e em ruínas.
Seria interessante verificar quantos dos AL resultam de recuperação de casas devolutas e quantos resultam de substituição de arrendamento convencional. É que ninguém lhe garante que as casas de habitação que desapareceram foram para AL, muitas estão simplesmente fechadas à espera de melhores tempos.

Jose disse...

Dar segurança às rendas é que nunca é solução proposta.
O inquilino, tadinho, é que tem que ser protegido (à conta do senhorio!).

Nuno Serra disse...

Caro Anónimo, dois ou três pontos:
- Não se trata de «tirar o AL das zonas históricas da cidade». Trata-se de assegurar um equilíbrio entre a função residencial e a função turística. O que não se pode, creio, é assistir às quebras, a uma escala inédita, de população e famílias residentes no centro das cidades;
- Quanto à não existência de «um lucro substancialmente superior», no caso do AL, «a um aluguer de longa duração», tenho as maiores dúvidas, mas seria de facto interessante conhecer os valores. Não por acaso a adesão ao AL dispara e a afetação dos alojamentos a longa duração é crítica. Ou seja, essa tese parece-me contraditória com o que diz (relativamente a um risco de fecho das casas se o AL não for permitido);
- É difícil também perceber o que são «melhores tempos», num tempo em que os valores das rendas dispararam, em particular, justamente, nas freguesias mais centrais, de Lisboa ou do Porto.

Anónimo disse...

Caro Nuno Serra
O AL está limitado nas zonas da cidades que cita, há vários anos. Nos últimos dois anos o turismo caiu quase a zero em alguns meses. Qual foi a o aumento que se verificou no arrendamento tradicional?
Não digo que o AL não tenha de ser regulamentado como tudo o resto, mas está a ser usado como homem de palha nesta discussão. Nos bairros onde não existe arrendamento local a oferta de arrendamento também é reduzida e a preços altos.
Ninguém diz concretamente o que se quer fazer nos bairros históricos, posso apresentar algumas propostas:
Liberalizar a alteração das construções existentes, deixar o mercado funcionar e teremos alojamento para os muito ricos
Subsidiar as rendas da classe média, deixar alterar em parte o edificado o que implica o afastamento dos atuais moradores.
O Estado comprar aquilo tudo e fazer um gigantesco bairro social com rendas controladas.
Todas as soluções têm méritos e deméritos, nenhuma está dependente do turismo. O que está dependente do turismo é o atual estado de coisas, se não fosse o turismo tudo se continuaria a degradar.
Foi o turismo e o AL que permitiram a pouca reabilitação que existe e, ao trazer movimento aos bairros, a existência de alguns pequenos negócios de que vivem grande parte dos moradores. Perseguir o AL sem ter uma ideia do que se pretende para aquilo é cuspir no prato em que se come.

Anónimo disse...

Este Anónimo que escreveu a mensagem de 15 de setembro de 2021 às 15:25 deve votar com toda a certeza no Iniciativa Liberal.
Talvez, não fosse má ideia o mesmo Anónimo dar um pulo à freguesia de Santo António e ver como aquilo está. Ali está a sua realidade de Alojamentos Locais e Turismo a funcionar numa sociedade à deriva e cada vez mais caótica.
E se quiser pagar caro por uma habitação e viver no meio do lixo, sugiro a habitação em Santo António. É o sonho ou o desmazelo de um pensamento associado ao novo-riquismo e que empobrece uma cidade.
Na verdade, não existe reabilitação, porque não existe uma política de habitação neste país. Para que existisse interesse na reabilitação, o Estado teria de ter uma pasta para a habitação e resolver os enormes problemas que tem para resolver. Estar aqui a elogiar o trabalho de alguns novos-ricos que querem fazer dinheiro à custa de um turismo «pé descalço» dado ao consumo e que produz lixo na cidade e ainda por cima dizer que isso traz vantagens à habitação, isso é que é «cuspir no prato em que se come».