segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016
Meia dúzia de notas sobre a viragem de página
1. António Costa fez no passado sábado uma declaração simples e particularmente importante: o Orçamento de Estado (OE) ficou pior depois de ter ido a Bruxelas. No fundo, Costa sabe que a "Europa" já não está connosco e esse realismo é vital, mesmo que dele não se retirem as implicações necessárias.
2. A viragem de página da austeridade é isso mesmo: não é superar a austeridade, mas sim virar a página e começar um novo capítulo do mesmo livro cheio de ideias perigosas, como bem sublinhou o Nuno Teles hoje na Antena 1.
3. Um orçamento é de esquerda se fizer duas coisas imbricadas: em primeiro lugar, se promover uma política económica orientada para o objectivo do pleno emprego, estimulando as forças produtivas nacionais, e, em segundo lugar, se reduzir as desigualdades socioeconómicas.
4. Este orçamento não é de esquerda, porque o país não dispõe ainda dos instrumentos de política para prosseguir tais objectivos, sendo a forma como são destratados o investimento público e o emprego no OE dois sinais deste facto.
5. Não sendo de esquerda, este orçamento merece o apoio das esquerdas, já que muda a repartição dos fardos da austeridade e isso não é socialmente, nem macroeconomicamente, indiferente num contexto em que a correlação de forças gerada pela história recente, interna e externa, é estruturalmente tão desfavorável.
6. Participando naturalmente da ficção de que o défice é controlado pelo governo, e não uma variável endógena e portanto dependente de um andamento sempre medíocre da economia no Euro, este OE é de difícil execução, o que significa que o embate com os vigilantes de Bruxelas vai ser repetido, esperemos, e é isso que podemos fazer, alertar e esperar, que em circunstâncias nacionais com maior vitalidade social.
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6 comentários:
"Este orçamento não é de esquerda, porque o país não dispõe ainda dos instrumentos de política para prosseguir tais objectivos..."
Então é mesmo só por isso que não é de esquerda este orçamento...
Um excelente artigo do João Rodrigues que duma forma notável põe alguns pontos nos is.
Duma forma particularmente clara. Um plano B, enfrentando as élites neoliberais/pesporrentas de Bruxelas
Mais o menos temos o seguinte mantra:
Como o Estado é o fundamento do pensamento de esquerda, comecemos por privilegiar os funcionários públicos que eles nos darão a base de apoio para estatizar a cena toda.
Exato, por isso é que com este OE, a função pública continua a perder funcionários. José, a sua argumentação é ridícula.
Nos anos 30 e 40 do século passado a culpa era inevitavelmente dos judeus e dos comunistas.
Agora o mantra repetido ate´à exaustão é que a culpa é dos funcionários públicos. Assim se tenta repetir no mesmo sentido o tal "mantra" ensaiado há cerca de 80 anos. E com os mesmos objectivos. Reconhecem-se os métodos e os processos. Adivinham-se os objectivos.
E "estatização" de toda a cena provavelmente é outro mantra ensaiada como auto-defesa para a fuga de impostos.
"O Estado como fundamento do pensamento de esquerda" (?) no entanto já não é nada. Apenas uma assinatura da iliteracia, a mostrar que o ódio ao conhecimento tem consequências desastradas
É por isso que achei um disparate a Mariana Mortágua, numa intervenção parlamentar da semana passada sobre o orçamento socialista, depois de reconhecer que não faz tudo o que devia para dar ao país o impulso que precisava para ter um rumo diferente, afirmar logo de seguida que, e cito, "é um orçamento que faz o essencial". Tanta ilusão cor-de-rosa, santo deus.
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