segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

O caso GameStop contado na primeira pessoa


Uma forma de avaliar as repercussões de um acontecimento nos seus intervenientes é ouvi-los. Sobretudo quando estas podem ser contraditórias, como no caso da GameStop. O Financial Times publicou um testemunho de um dos participantes no movimento de compra de ações da GameStop, a empresa cuja cotação em bolsa disparou para valores estratosféricos depois de um conjunto de pequenos investidores ter tentado contrariar a aposta feita por dois grandes fundos de investimento de que a empresa não iria sobreviver. O texto dá algumas pistas.

Andrew Farry, de 21 anos, estudante de Inglês na Universidade de Chicago, confessa que quando leu um post sobre a empresa no Reddit não percebeu bem do que se tratava. Mas isso não diminuiu a sua curiosidade: "A minha vida não é muito preenchida, como muitas vidas de jovens durante a pandemia. O post sobre a GameStop oferecia algo de novo." Depois de falar com os colegas e constatar que nenhum percebia o que era um "short squeeze" (o nome dado ao que o grupo do Reddit se preparava para fazer, investindo nas ações da empresa), fez algumas pesquisas e decidiu participar. Farry comprou $250 de ações da GameStop e, no espaço de um dia, o seu valor já atingia $800. "Rendi-me ao entusiasmo e comecei a procurar outros potenciais investimentos. [...] Só costumava abrir a conta do Robinhood [aplicação que permite fazer investimentos na bolsa online] quando sabia que o mercado estava a subir. Agora, abria-a a cada hora", admite.

Farry acabou por vender as ações pouco depois, quando percebeu que o seu valor começaria a descer. "Se aprendi algo com o caso da GameStop, é que os períodos de euforia nos mercados são imprevisíveis, alucinantes e aleatórios", reconhece. Na verdade, a única certeza que existe é que todas as bolhas especulativas chegam, eventualmente, ao fim. Não costumam é durar tão pouco tempo. É também por isso que a atuação dos pequenos investidores acaba por ser inconsequente e não ter um impacto sistémico, como o próprio Farry sublinha: "Gosto de pensar que eles [os pequenos investidores] são revolucionários a trabalhar para deitar abaixo os fundos de investimento de Wall Street [...] No entanto, creio que não sou ingénuo. Se uma revolução acontecer, será através de algo muito maior do que a GameStop." Podemos estar seguros disso.

Talvez seja este o ponto mais importante do texto: o reconhecimento, mais ou menos explícito, de que a verdadeira mudança vem através da organização social estruturada, pelo trabalho de movimentos, associações, sindicatos ou partidos. Estruturas construídas coletivamente para fazer face a problemas coletivos. É por aqui que a transformação social continua a passar. E pode ser que o que este acontecimento o tenha mostrado a quem nele participou.


2 comentários:

Anónimo disse...

Mt bom

Miguel Madeira disse...

Outra entrevista com outros desses investidores, esta em tom mais entusiastico

https://taibbi.substack.com/p/this-is-for-you-dad-interview-with/

"That was it for me. I found myself thinking, I didn’t care if I lost every last dollar doing it, I was going to put it on GameStop, just to see them panic for once. Even if for just one moment they have to think about how they’re going to make their payments for their Manhattan apartments, that’s worth it. They’re playing these games while there are people out there who can’t afford Christmas presents for their kids, can’t afford food. What are these families supposed to do?"