quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Opacidade fiscal

Passos Coelho declarou no 2º debate de Passos/Costa que o "enorme aumento de impostos" de 2013 foi feito para aumentar a progressividade do imposto. Ou seja, pôr quem mais tem a pagar proporcionalmente mais imposto. Mas foi mesmo assim? A Autoridade Tributária já devia ter divulgado as estatisticas de IRS de 2013 em Março passado. E não o fez...

Diz Passos Coelho: "A revisão dos escalões foi feita de modo a criar progressividade, mais progressividade no imposto. Sabe que 7% dos contribuintes pagam aproximadamente 70% da receita fiscal e isso acontece justamente porque nós fizemos a revisão desses escalões. Por um lado e por outro lado porque há muitos portugueses que têm baixos rendimentos...

Dito desta forma até parece que o Governo está a fazer um assalto aos ricos. Mas a que correspondem esses 7% de contribuintes? Em 2012, correspondia aos contribuintes com rendimentos acima de 40 mil euros anuais (3,3 mil euros mensais brutos). E nessa altura pagavam 64% do IRS liquidado.

Olhe-se para este gráfico de 2012 sobre o rendimento declarado e a sua distribuição por grupos de rendimento.



Alguém acredita que, em 2012, os rendimentos acima de 100 mil euros anuais correspondessem apenas a 7% dos 81 mil milhões de euros de rendimento? E que os rendimentos até 40 mil euros anuais (1900 euros mensais) detivessem 60% do rendimento total? Havia em Portugal 2732 pessoas que declaravam ter tido, em 2012, rendimentos acima de 250 mil euros anuais e que tiveram - todos - 1,2 mil milhões de euros de rendimento. Assim qualquer coisa como 439 mil euros de rendimento anual per capita. Acredita?

Daqui retira-se o quê?

1) Sobre a progressividade do IRS em 2013 que o que importa saber é que o que aconteceu a cada escalão de rendimento: os que ganhavam menos passaram a pagar menos? Ou viram o seu imposto agravar-se? E se assim foi, quais foram os escalões que sentiram maior agravamento de imposto? Os mais pobres ou os mais ricos? Por isso, é essencial conhecer as estatísticas fiscais guardadas pelo secretário de Estado Paulo Núncio.

2) O IRS não tributa de facto todos os rendimentos. Tributa os rendimentos declarados. E o problema são os rendimentos não declarados. Essa seria a verdadeira reforma fiscal - englobar todos os rendimentos e tributá-los progressivamente. E encontrar forma de detecção de rendimento não declarado. Mas como chegar aos rendimentos não declarados? Esse é o verdadeiro combate à fraude e evasão fiscais. E esse não dá automóveis...

Há vontade? Duvido. Trata-se de um problema que se mantém há muitos e muitos anos. E que obviamente colidirá com a chamada competitividade fiscal. Assim, são os rendimentos conhecidos - salários e pensões - que continuam a pagar o Estado Social de que cujos detentores são precisamente os beneficiários.

6 comentários:

Jose disse...

Um comentério oportuníssimo que estabelece uma evidência apetecível: atá ao confisco ainda há margem!

Unabomber disse...

A propaganda diz que houve um enorme aumento de impostos, mas de facto o que houve foi um colossal aumento do IRS: de 2012 para 2013 as receitas de IRS aumentaram aprox. 30%. Quem pagou este colossal aumento do foi a minoria de parvos do costume - todos sabem que a maioria de 60% dos "contribuintes" que não paga IRS, ou paga valores anuais inferiores a 100€, inclui muitos "contribuintes" que não declaram os rendimentos que efectivamente auferem - alguns até trabalham quase há borla, limitando-se a receber apenas o reembolso das despesas que fazem.
Por isso, o confisco que fala o amigo José só atinge os parvos - há por ai muitos patriotas a viverem no off-shore Tuga - e apara acabar com isto, nada tem sido feito: apenas se utiliza a propaganda, como é o caso da facturinha electrónica, que é apenas pura propaganda de combate à famigerada fraude e evasão fiscual.

Anónimo disse...

A questão é ainda mais complexa já que os escalões e portanto a progressividade só se aplicam aos rendimentos englobados ou seja rendimentos do trabalho e pensões os rendimentos do capital mais valias e após a reforma do Prof Vitor Gaspar os rendimentos prediais pagam no máximo 28%.

Ou seja a progressividade cai sobre os trabalhadores por conta d outrem eu auferem remunerações fixas e mais elevadas, vulgo função publica mais qualificada e quadros de algumas empresas que são os "ricos" para este governo e não para quem aufere rendimentos da especulação e também agora rendimentos prediais.


Gonçalo Avelãs Nunes g.avelas.nunes@ua.pt

J.a.lourenco@sapo.pt disse...

Sobre esta matéria gostaria apenas de dizer que o grupo parlamentar do PCP no passado dia 28 de Maio fez uma pergunta por escrito à Ministra das Finanças exactamente sobre o atraso que se verifica, por parte da Autoridade Tributária, na divulgação das estatísticas desagregadas do IRS, IRC e IVA. Até hoje não obtivemos qualquer resposta, embora teoricamente a Ministra seja obrigada a responder-nos no prazo de um mês, e percebe-se porquê. É que essa informação em falta refere-se no caso do IRS e IRC a 2013, o ano do enorme aumento de impostos, e quando essa informação for conhecida os portugueses terão oportunidade de saber afinal em que escalão de rendimento se situam os trabalhadores que mais sofreram com esse enorme aumento de impostos, resultante essencialmente da redução de 8 para 5 escalões de IRS. Paulo Núncio, Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, sabe muito bem o que está a fazer e de certeza que não irá libertar essa informação antes das eleições de 5 de Outubro.Hoje talvez mais do que nunca quem detem a informação tem o poder e estes srs sabem-no muito bem.

João Ramos de Almeida disse...

Caro foicebook,
Fico muito contente que a exigência da divulgação obrigatória das estatísticas oficias não fique apenas a cargo dos jornalistas. E que o grupo parlamentar do PCP já o tenha feito.

Adianto apenas um conselho: quando os jornalistas não recebem resposta oficial aos seus pedidos, podem recorrer à Comissão de Acesso aos Documentos Oficiais. E se após a intervenção da CADA, as autoridades continuarem em silêncio, o jornalista pode ir para tribunal com o apoio da CADA. Mas quem são os jornalistas que o fazem? devem contar-se pelos dedos de uma mão...

O que sugiro é que os grupos parlamentares - os verdadeiros "donos" do espírito da lei - obriguem os detentores do poder a executar a lei. Nem que seja nos tribunais.

E entretanto podem agravar as sanções para quem não cumprir a lei...

Anónimo disse...

Englobar tudo e progredir mais e mais!
Quer isto dizer que o prémio à poupança é cair-lhe em cima com impostos.
Por outras palavras, palavra de comuna: pagas sobre o rendimento do trabalho, e gasta-o todo que o Estado há-de pagar-te uma reforma, e mais umas mordomias que havemos de ir buscar aos idiotas que pouparam.
Porque o futuro é esse, o Estado - pela mão dos camaradas dirigentes - é que decide quem tem o quanto e o quando.
Os pastores é que definem o pasto do rebanho.