segunda-feira, 27 de maio de 2013

Três notas sobre Investimento Estrangeiro

A anunciada descida do IRC sobre as empresas é normalmente apresentada como forma de atracção de capital estrangeiro a um país em quebra de investimento. Embora a medida seja (pouco) discutida quanto à sua eficácia (o IRC é uma variável significativa nas decisões de investimento dos agentes exteriores?) e impactos redistributivos (devem ser os trabalhadores os únicos a pagar impostos?), não existe qualquer discussão sobre o papel do Investimento Directo Estrangeiro (IDE) no desenvolvimento do país. O IDE seria sempre bom, ponto. Vale a pena fazer três notas para reflexão sobre o assunto

1- Há bom e mau investimento directo estrangeiro. É um erro ver o IDE como entidade homogénea nos impactos na economia portuguesa. Comparemos o exemplo da Autoeuropa, empresa estrangeira que criou capacidade produtiva adicional e que, aparentemente, contribuiu quer para o desenvolvimento de um conjunto de empresas portuguesas com novas competências quer para a qualificação dos seus trabalhadores, agindo como motor de progresso de uma pequena parte da economia portuguesa, com o investimento da Three Gorges na EDP, simples mudança da propriedade e cujos efeitos no país não se conseguem vislumbrar. Ou melhor, vislumbram-se nos milionários dividendos distribuídos pela EDP aos seus accionistas no exterior. Acresce ainda que, com o seu intuito de utilizar a EDP como veículo para a sua internacionalização, investindo fora de portas, o investimento da Three Gorges pode facilitar a exportação de capital. Uma empresa estratégica é assim colocada ao serviço não das necessidades do país, mas sim dos seus accionistas.

2- Há um deve e um haver no investimento. O investimento é apresentado como positivo porque, mesmo que os seus efeitos no todo da economia sejam diminutos, cria emprego e isso, num país onde o desemprego é tão elevado, é mais do que suficiente. No entanto, tal perspectiva esquece que o capital beneficia de um conjunto de custos não suportados por si, mas sim por toda a comunidade. A educação dos seus trabalhadores, a saúde destes, as infraestruturas utilizadas (o Estado Social não beneficia só os seus utentes directos), os recursos naturais explorados pela empresa são custos não cobrados que devem ser levados em conta na avaliação dos projectos. Os seus lucros devem, por isso, ser taxados de forma a devolver parte dos custos não suportados à comunidade. No caso do IDE, a evasão fiscal é mais fácil. Por exemplo, práticas de multinacionais como sub e sobrefacturação na relação entre diferentes subsidiárias, comprando inputs ao exterior acima do preço de custo e vendendo outputs abaixo do preço de custo, permite a evasão a impostos sobre lucros que se tornam aparentemente inexistentes. O pouco que se pretende cobrar em IRC facilmente se transforma em nada.

3- O investimento estrangeiro pode ser fonte de instabilidade económica. Embora a noção de IDE implique uma participação de pelo menos 10% na estrutura de capital de uma empresa doméstica, medidas como a descida do IRC não descriminam quanto à natureza do capital. Assim, fluxos de capitais de curto prazo são aqui particularmente valorizados. É neste caso que as variáveis ficais são mais relevantes face a outras variáveis mais estruturais na decisão de investimento (serviços públicos, custos energéticos, salários, etc.). Ora fluxos de curto prazo, em busca de ganhos rápidos, tendem a ser maiores em períodos de prosperidade, muitas vezes alimentando bolhas especulativas, e a rapidamente escaparem em situações de crise, agravando-a. A entrada deste tipo de capital estrangeiro, ao agravar as fases do ciclo, deve, nestes casos, ser limitada e não promovida.

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