quinta-feira, 9 de maio de 2013

O efeito BCE

Num comentário a este post, o Pedro Magalhães coloca uma questão pertinente. Se a descida generalizada das taxas de juro das dívidas soberanas (nomeadamente nos países intervencionados) ocorre em resultado das garantias dadas por Mario Draghi - em Setembro de 2012 - de que o BCE se posicionaria como «credor de último recurso», porque razão essa descida das taxas de juro começa a verificar-se antes dessa data? Isto é, a partir de Julho de 2011 na Irlanda, de Fevereiro de 2012 em Portugal, de Março de 2012 na Grécia e de Julho de 2012 em Espanha (clicar no gráfico para ampliar)?

O Pedro Magalhães tem de facto razão quando conclui, num comentário ao seu próprio post, que não se trata de uma «causalidade única», ditada pelas palavras de Mario Draghi em Setembro de 2012. Em comentário no Twitter, o João Galamba e o Diogo Serras (bem como o Nuno Teles, por email), esclarecem os casos da Irlanda (em que a descida dos juros decorre essencialmente da percepção de que não seria necessário mais dinheiro para resgatar a banca, uma vez que o problema do défice irlandês esteve essencialmente centrado nos spreads) e de Portugal, Itália, Espanha e Grécia (com um novo impulso para a Irlanda) em resultado das «operações de refinanciamento [bancário] de longo prazo» (LTRO), adoptadas pelo BCE no final de 2011 (para além de uma descida generalizada das taxas de juro, à escala mundial, nesta altura). Como referem Galamba e Serras, trata-se sobretudo, na verdade, de um «efeito BCE em crescendo» (LTRO + frase de Mario Draghi + OMT). Ou, se se preferir usar a expressão de Paul Krugman, do «novo activismo do BCE».

Seja como for, o essencial a reter parece apontar para que a descida das taxas de juro das dívidas soberanas decorra essencialmente dos (sempre tardios) sinais e decisões cumulativas do BCE. É isso que poderá justificar, aliás, que a descida das taxas de juro se tenha consolidado e estabilizado a partir de Setembro de 2012. O que é mais difícil, de facto, é associar essa descida a uma consequência benéfica e intencional das políticas de austeridade. A menos que se acredite, claro está, que são as economias mortas (ou as moribundas) as que conseguem gerar confiança e pagar as suas dívidas.

3 comentários:

Anónimo disse...

Eu penso que basta ver (ou ler) o lento desenrolar dos acontecimentos desde que Draghi assumiu a presidência do BCE(e.g. ver o Eurozone blog do The Guardian e a lenta mas decisiva mudança dos mercados perante o que se estava a passar na Zona Euro e as missivas de Draghi).
Antes da LTRO, o CEO da Pimco e de vários outros fundos andavam a afirmar que a EZ estava por um triz. Logo após a LTRO essa "conversa" passou para secundária e assim que as OMTs ficaram no linguajar financeiro, foi o golpe decisivo. Isto não tem nada a ver com austeridade, essa sim vergonhosamente ideológica e moralista.Como aliás vós apontais neste blog. Os grandes problemas da EZ são dois: um BCE demasiado deutsch e distorções em balança de pagamentos intramuros sem política macro fiscal. O primeiro a pouco e pouco tem sido atenuado. Mas o segundo caminha para o desnorte e desul total.

JL

Anónimo disse...

Na verdade, a descida nas taxas de juro é um fenómeno nacional, europeu e, em larga medida, até mundial.

Não desvalorizo a afirmação do Mario Draghi, em Julho (e não Setembro) do ano passado, de que o "BCE fará tudo o necessário para sustentar o euro".

Mas o efeito desta intervenção está muito sobrevalorizado. Nesse sentido, é errado, no mínimo muito exagerado, falar no "efeito Draghi".

A grande razão é o enorme aumento de liquidez a nível mundial (o que é nítido, nomeadamente, no incremento das bases monetárias, da diminuição das taxas de juro e das taxas repo dos bancos centrais dos principais centros capitalistas mundiais: EUA,UE, Japão).

A prolongada recessão e estagnação económica mundiais, especialmente europeia (na verdade, visto à grande escala, uma verdadeira depressão económica), continua a desincentivar o investimento produtivo e, sem dúvida, a recomendar prudência nos investimentos financeiros. O resultado evidente é a diminuição das taxas de juro dos títulos de dívida pública considerados refúgio seguro, como por exemplo das bonds alemãs, que em várias maturidades se tornam realmente, e até nominalmente, negativas.

No entanto, o excesso de liquidez é de tal ordem que, por muito minoritários que sejam (e são-no), há sempre capitais suficientemente dispostos (ou doidos) para arriscar na compra de dívida pública de longo prazo de estados insolventes como a Grécia e Portugal.

É preciso perceber que há, um pouco como em tudo na vida, uma grande dispersão na predisposição para o risco dos investimentos financeiros. O grosso até pode, à cautela, abrigar-se, mesmo com perdas, na aquisição de títulos de dívida pública como, falando aqui da Europa, os alemães. Mas há uma fracção que não se conforma com menores rentabilidades e está disposta a lançar-se noutras aventuras mais arriscadas.

Essa fracção é pequena, em percentagem. Mas é muito grande em volume, dado o enorme (e crescente, com os "quantitative easings" americano e japonês ou, mais envergonhado, europeu) excesso de liquidez. O suficiente para sustentar uma procura e uma descida das taxas de juro dos títulos de países como Portugal (ou mesmo a Grécia).

Claro, a intenção manifestada pelo presidente do BCE ajuda o fenómeno, e nessa medida não deve ser desprezado, mas seria de um grande subjectivismo atribuir-lhe um peso que, na verdade, não tem, nem pode ter.

HM

Anónimo disse...

Agora só falta algum tipo de documentação técnica sobre as OMT, até agora nada foi produzido, temos apenas uma declaração de um banqueiro (central)