quarta-feira, 17 de maio de 2017

Exit, brexit, lexit...


Ao contrário do que dizem os europeístas por aí, aparentemente não é verdade que o Reino Unido esteja dividido ao meio sobre o Brexit. Segundo o Financial Times, 45% do eleitorado quer mesmo sair da UE, 22% quer mesmo ficar (os chamados hard leavers e hard remainers, respectivamente) e 23% votou pela permanência, mas agora acha que o governo tem o dever de assegurar a saída.

Repito o que disse: Theresa May compreendeu bem o sentimento popular prevalecente, que tratou logo de liderar, no seu discurso sobre as escalas da cidadania, as reais e as outras. Desgraçadamente, Corbyn teve neste decisivo assunto do Brexit uma postura demasiado hesitante, de meio da ponte, antes e depois do referendo. Devia ter seguido os seus instintos eurocépticos, típicos do melhor socialismo britânico. Não foi ajudado por intelectuais influentes como Owen Jones, que depois de apelar ao Lexit inicialmente acabou a discursar nas patéticas manifestações a favor da UE depois da vitória do Brexit: até parece que confundiu o eleitorado popular com parte significativa do leitorado do The Guardian. Enfim, intelectuais públicos dominantes...

Agora, um bom e bem recebido manifesto eleitoral trabalhista, que recupera temas urgentes e populares de nacionalização de sectores estratégicos, ali onde a privatização foi uma desgraça, de defesa dos serviços públicos e de recuperação de direitos laborais, pode não resistir eleitoralmente a uma má leitura do sentimento nacional e popular, combinada com uma imprensa invulgarmente hostil.

Não está tudo perdido ainda, claro, há ali também um popular combate às desigualdades, uma prioridade ao investimento público necessário, mas é evidente que qualquer manifesto trabalhista deste tipo teria também na UE um adversário externo de peso. E fazer da pertença ao mercado único um elemento programático não lembra a quem queira desenvolver uma política de desfinanceirização e de reindustrialização digna desse nome.

13 comentários:

Jose disse...

«...um popular combate às desigualdades, uma prioridade ao investimento público necessário, mas é evidente que qualquer manifesto trabalhista deste tipo teria também na UE um adversário externo de peso. »

Estranho essa do adversário externo. Então o Brexit não assegura a plena soberania?
É preciso é brexitar depressinha.

Jaime Santos disse...

Regressam as racionalizações para explicar o que será uma vitória em toda a linha da Direita a 8 de Junho, depois do barrete que enfiou Mélenchon. Theresa May tinha no seu manifesto ideias interessantes relativamente à co-gestão empresarial, em linha com o modelo germânico, que foram rapidamente esquecidas. O RU encaminha-se para um Hard Brexit que levará provavelmente a um agravamento da situação económica, o que não beneficiará de todo as camadas mais pobres da população, mas que importa isso se a UE pode servir de bombo da festa. Desgraçada desta Esquerda que acaba sempre a fazer fretes à Direita mais neoliberal e reacionária...

Anónimo disse...

Cherry picking no manifesto eleitoral trabalhista. É sempre assim ...

Anónimo disse...

Os portugueses estão a revelar serem os mais estúpidos da Eurolândia. Eles criam elementos semânticos que não podem ser utilizados sem se destruírem a si próprios. Eles criam mitos de livre comércio que eliminam seus empregos. Eles criam princípios de informação aberrante que destrói sua liberdade. Isto a propósito do RU + Brexit e etc. e tal.
Em consequência da ignorância que lavra nos círculos do poder, e, por incapacidade, fica-se a´ espera de que os resultados exteriores lhes resolvam os seus problemas.
«Tempos houve em que nossa cortiça só chegava ao destino por intermedio do RU»
Por este andamento não passamos da cepa torta!
Faz lembrar o Mármore de Extremoz que por magia, ainda em território nacional, passava a ser Mármore de Carrara.
de Adelino Silva

Aleixo disse...

Nesta "coisa" da esquerda e direita, não tenho o objectivo do Macron mas, admitindo que em DEMOCRACIA,
a vontade da maioria será a decisão última,
persistir na "vanguarda esclarecida", desconsiderando a VONTADE do POVO...ou melhor, nem querendo saber qual a VONTADE!

Para quem defende a democracia representativa...
( A artimanha(!), está na SEGREGAÇÃO da "coisa"... )

LÁ QUEREM SABER DO POVO!

Anónimo disse...

Talvez um dicionário para esse tal de Jose?

Desde quando a soberania, plena ou incompleta, não tem adversários externos?

Mais uma vez se comprova que devia haver mínimos quando se debatem assumtos sérios.

Sob pena de se ter que sistematicamente desmontar a vacuidade argumentativa e ou a pesporrência ideológica

Anónimo disse...

Melenchon enfiou um barrete?

A gratuidade desta afirmação revela o nível argumentativo e a manipulação que lhe está subjacente.

Parte-se duma opinião pessoal, subjetiva e polêmica e assume-se como uma verdade inquestionável. Contamina-se o debate. Atira-se para outros aquilo que é da sua própria responsabilidade.

Fazem-se fretes à direita mais neoliberal e reacionária. E assobia-se para o lado? Agora até já chegámos às queixas sobre o bombo da festa? Ja nem sequer há argumentos para além destes ziguezagues pouco honestos sobre May?

Será preciso trazer aqui o que Jaime Santos já disse sobre o Brexit e a própria May?

E a responsabilidade pela situação presente de quem é? De quem não abdica de princípios ou de quem tenta fazer face ao descalabro ou pelo contrário de quem trai os seus próprios valores?

Quem abriu e quem abre a porta a todos os oportunismos e vampiros?

Anónimo disse...

"A epidemia potencialmente letal que atinge hoje os partidos socialistas e social-democratas terá começado com Anthony Blair à frente dos trabalhistas britânicos, embora a degeneração gradual viesse de trás.

No entanto, a conversão ao ultraconservadorismo de Thatcher e Reagan, a submissão às inquestionáveis ordens do mercado, as ânsias de privatização do Estado e os ataques sem piedade aos direitos sociais e laborais dos cidadãos representaram um salto qualitativo na degradação, a que se foram juntando, numa vertigem que agora se conclui ser suicida, as mentiras na cena internacional, o culto da guerra, a rapina generalizada.

Há pouco mais de um ano, o então presidente francês, François Hollande, eleito pelo Partido Socialista, defendeu que os novos tempos exigiam um «hara-kiri do PS», uma transformação em algo de ideologia muito mais abrangente e indefinida, que imaginou como «Partido do Progresso»; na mesma altura, um dos primeiros-ministros que nomeou durante o seu mandato, Manuel Valls, declarou a necessidade de o Partido Socialista mudar de nome.

Há poucos meses, o ministro da Economia de ambos, Emmanuel Macron, também ele uma figura do PSF, lançou o movimento En Marche que, sem militantes e estrutura mas com financiamento dos bancos e banqueiros para os quais trabalhou, e com o apoio operacional de agentes enviados pelo Partido Democrático dos Estados Unidos, o catapultou quase do zero até à Presidência da República.

Enquanto isso, o candidato oficial do PS – ou do que dele resta – ficou abaixo dos sete por cento nas eleições presidenciais, abandonado pelo aparelho do partido, pela sua Fundação Jean Jaurès e pelas figuras de proa, com destaque para Hollande e Valls, que logo se puseram en marche com Macron.

Em tudo o que é comunicação social situacionista, a nível interno e internacional, as manobras conduzidas em torno da figura de Macron serviram para redesenhar «a esquerda» institucional, embora o candidato agora presidente tenha sido inicialmente definido como «centrista». O resto é «extrema-esquerda» ou «esquerda radical», isto é, organizações «desfocadas» da realidade, «agarradas ao passado», incapazes de se adaptarem aos novos conceitos evolutivos, em suma, entidades que se atrevem a rejeitar a doutrina única e oficial, o capitalismo selvagem."

Anónimo disse...

"Dos casos citados a propósito do Reino Unido, Itália e França, só os trabalhistas britânicos ainda resistem à dissolução, por continuarem a recorrer, pelo menos até agora, a consultas às bases partidárias para elegerem os dirigentes e não ao artifício anti partidário das primárias, importado, claro, dos Estados Unidos da América. Porém, mesmo desacreditado perante o reconhecimento geral dos seus crimes e mentiras no drama do Iraque, Tony Blair e a sua teia de propaganda voltam a estar activos na intriga e desestabilização do Partido Trabalhista, de modo a reencaminhá-lo na senda da destruição que muitos outros estão a percorrer.

Os casos de Itália e França são exemplares. Renzi e Macron parecem saídos da mesma forma tecnocrática de políticos robotizados em práticas de direita, envolvidos na mentira, agora cada vez mais grosseira, de que eles são «a esquerda».

Outras situações do género, que traduzem a destruição de partidos socialistas, estão consumadas ou na calha. Em Espanha, a deriva do PSOE é total, acelerada depois de ter entregado o poder, de novo, aos neofranquistas de Rajoy; e, na Alemanha, o SPD está a pagar cara a submissão feita de cumplicidade ao autoritarismo de Merkel.

Na Grécia, a miniaturização do PASOK é idêntica à do PS francês, embora sem o efeito Macron; pelo menos por enquanto, embora não seja seguro que o tsiprarismo, cada vez mais fiel às ordens de Bruxelas à custa do ainda e sempre penalizado povo grego, não vá no mesmo sentido.

Na Holanda e na Bélgica, os partidos da Internacional Socialista pulverizaram-se devido ao envolvimento na gestão da crise, praticando políticas de direita – e até de extrema-direita e xenófobas, sob o interessante pretexto de travar a influência da extrema-direita. Hollande não foi, portanto, o caso único, embora tenha ido mais longe ao governar em estado de excepção durante grande parte do mandato.

Às práticas thatcheristas de Blair, os politólogos sempre em busca de baptismos para «novas esquerdas» chamaram «terceira via». Para onde? Para o socialismo, pois claro, de acordo com as suas doutas elucubrações em forma de mensagens propagandísticas primárias. Na verdade, mais uma via para o capitalismo puro e duro, à moda de Friedman e dos «Chicago Boys» que criaram «o milagre de Pinochet» – por fim o capitalismo isento de quaisquer inquietações sociais e com as pessoas, livre da mais ínfima das sequelas keynesianas.

Com maior ou menor convicção, os partidos socialistas e social-democratas seguiram Blair incarnando o flautista de Hamelin, institucionalizando-se como o «lado esquerdo» do sistema bipolar que governou a União Europeia como partido único, até estatelar-se estrondosamente, em 2008, nos frutos podres da subserviência ao casino financeiro – a «crise».

Se alguém tiver dúvidas, pode consultar as decisões do Parlamento Europeu tomadas ao longo de anos e anos: em matérias de cultura, questões de consciência e até direitos teóricos, é possível detectar diferenças entre os comportamentos dos membros do Partido Popular e do Grupo Socialista; mas quando se chega aos assuntos económicos, laborais, à imposição da austeridade, às medidas financeiras, de combate à crise ou de estruturação autoritária da União Europeia e da Zona Euro, aí a convergência é praticamente total entre os dois blocos."

Anónimo disse...

"A verdade é que a conjugação da crise com os efeitos sociais, a que se junta o problema dos refugiados resultante de guerras pelas quais a União Europeia também é responsável, desmoronou a arquitectura política de partido único com duas tendências. Na entropia resultante em que vivemos, na qual multidões de cidadãos desorientados, manipuladas pelos aprendizes de feiticeiros peritos em explorar o medo e a insegurança, são cativadas por apelos de populistas mais ou menos envernizados, por mensagens trabalhadas à maneira de anúncios de refrigerantes, ou até por fascistas retintos, as esquerdas que permanecem fiéis ao humanismo, à cidadania e às pessoas quase não conseguem fazer-se ouvir.

No meio das ruínas da arquitectura política em extinção tornou-se evidente que o papel da social-democracia oficial na gestão do neoliberalismo, mesmo temperada pela «terceira via», se tornou descartável, inútil. Cumpriu o papel, mas cabe agora à direita pura e dura, nas suas variantes que chegam até aos extremos do populismo e do fascismo, gerir o sistema neoliberal.

O arrastamento da crise, desmentindo a teoria dos ciclos altos e baixos da economia, tornou o funcionamento do sistema praticamente impossível em democracia. É preciso afastar os cidadãos do direito de decidirem, seja pela força, pelo autoritarismo em liberdade condicionada, pela intoxicação tecnocrática disfarçada de inovação política.

Por isso os Partidos Socialistas caem como pedras de dominó. A maioria dos seus dirigentes instalam-se no novo espaço. Onde já se encontra, há muito, a instituição que conduz este processo de modo cada vez mais indisfarçado: o Partido Democrático dos Estados Unidos. Daí que Hillary Clinton, senhora da guerra com as mãos sujas de sangue de milhões de mortos e feridos e do sofrimento de milhares de refugiados, seja a figura de referência da Internacional Socialista de hoje. Está encontrada mais uma «nova esquerda», agora sim fazendo inequivocamente parte da direita."

Anónimo disse...

"Porém, como sabemos, nem todos os dirigentes socialistas apanharam a boleia de Blair e discípulos: existem casos de resistência a alguns valores essenciais; além disso, os chefes que fogem deixam para trás multidões de cidadãos que não estão dispostos a acompanhá-los como os ratos seguiram o flautista de Hamelin – e assim volto ao velho conto de Grimm.

Por isso, a esquerda – ou as esquerdas, se preferirem – têm agora milhões de seres humanos como destinatários de mensagens que sejam capazes de mobilizar o combate contra um adversário poderosíssimo mas cada vez mais definido e identificável, por muito que use e abuse da intoxicação, do ilusionismo e da mistificação.

Para que as mensagens sejam unificadoras da mobilização e dinamizadoras dos objectivos de luta é necessário que as esquerdas decidam, de vez, deixar de se dividir e engalfinhar em torno de ilusões que a realidade está cansada de desmascarar: a burla do «mercado livre», o mito «europeísta», a ideia absurda de que a União Europeia é «regenerável», a mentira de que é possível compatibilizar a democracia e a soberania com a obediência aos ditadores servindo Bruxelas e a moeda alemã, também chamada única ou euro.

Num dia, que está próximo pela força das circunstâncias, a Internacional Socialista mudará também ela de nome, sem precisar de fazer hara-kiri. Grande parte dos seus membros já o fizeram. Se preferir continuar a chamar-se assim, ficará como um imprestável paquiderme em busca do seu cemitério."

(José Goulão)

Jose disse...

Socialismo só há um: os camaradas dirigentes cuidam dos meios de produção!

Anónimo disse...

Bem tenta o tal Jose. Até como camarada dirigente.

O que se faz para esconder as idiotices sobre as soberanias e os adversários externos...