sexta-feira, 3 de abril de 2015

Crise do euro, crise do social-liberalismo


António Costa renunciou à presidência da Câmara Municipal de Lisboa para ocupar a tempo inteiro as funções de secretário-geral do PS. Não falta quem diga que a afirmação do partido nas sondagens foi prejudicada pelo atraso nesta decisão. Porém, há algo de mais profundo que escapa ao folclore dos noticiários, algo que liga episódios tão diversos como a pesada derrota do PS na Madeira, o descalabro do PS francês, o declínio do PSOE em Espanha e a crise do Partido Democrático italiano, para não falar do desaparecimento do PASOK na Grécia. Salta à vista que a crise da zona euro é também a crise da social-democracia europeia, na sua versão social-liberal, após Mitterrand ter substituído o socialismo democrático pelo europeísmo ordoliberal.

Antes de mais, o confronto entre o governo grego e a troika (agora “Grupo de Bruxelas”) clarificou os limites da tolerância dos nossos credores relativamente à política orçamental e não deixou dúvidas quanto ao que se deve entender por “reformas estruturais” a promover nos países da zona euro, sobretudo na periferia endividada. É relativamente às reformas no sistema de pensões e à legislação laboral que se trava um braço-de-ferro nas negociações com o governo grego, ao mesmo tempo que este é sufocado financeiramente pelo BCE. Qualquer que seja a escolha do governo liderado por Alexis Tsipras, ruptura ou capitulação, uma coisa é certa: a social-democracia europeia participou neste processo de chantagem sobre um governo com programa social-democrata que foi legitimado pelo voto para suspender as medidas de austeridade. Como há muito viu Dani Rodrik (“Greek Elections, Democracy, Political Trilemma, and all that”), a integração económico-financeira supranacional é incompatível com o exercício da democracia. António Costa sabe que não pode prometer aos portugueses outra política económica, ou sequer um modelo de desenvolvimento com alguma fundamentação realista. Os portugueses vão percebendo que afinal não há luz ao fundo do túnel, e isso vê-se nas sondagens.

Depois, mesmo que o impacto da saída da Grécia seja contido pela intervenção enérgica do BCE nos mercados financeiros, a sobrevivência da zona euro está longe de garantida. Com a proibição da política orçamental, mesmo com o desemprego ao nível da Grande Depressão, não há instrumentos de política económica que permitam enfrentar a gravíssima crise de procura produzida pelo fim do endividamento externo fácil da periferia. Antes de a crise de 2008 atingir a Europa, na ausência do risco de desvalorização com a adopção do euro, os spreads das taxas de juro quase desapareceram, pelo que o crédito dos países ricos se tornou muito acessível aos bancos dos países menos desenvolvidos.

Por conseguinte, a financeirização das periferias foi obra conjunta de credores e devedores e, embora os bancos credores tenham até agora sido poupados aos prejuízos decorrentes dos elevados riscos que assumiram, isso não significa que os seus países consigam escapar aos efeitos da bancarrota que ajudaram a criar. António Costa e a sua equipa de economistas deviam meditar nestas palavras de Michael Pettis:
“Depois de muitos anos a negar a insolvência, e muitos anos de promessas de que as reformas seriam implementadas e conduziriam a um crescimento suficiente para resolver o endividamento, os decisores políticos de países como Espanha serão forçados a mudar de posição ou serão demitidos pelo voto – simplesmente porque as condições económicas se terão deteriorado tão drasticamente que uma reestruturação não poderá ser adiada por mais tempo.” (“When do we decide that Europe must restructure much of its debt?”)

Assim, os partidos do social-liberalismo da periferia estão confrontados com um dilema vital: renegar a moeda única para recuperar a política económica da esquerda, ou desaparecer como corrente política relevante. Do meu ponto de vista, a ideologia social-liberal, e os interesses que envolvem estes partidos, impedem o reconhecimento do dilema tornando-os irreformáveis. Este é o drama da social-democracia europeísta. 

(O meu artigo no jornal i)

5 comentários:

meirelesportuense disse...

Para mim, meus amigos, o grande -o maior de todos- problema, é conseguir fazer aceitar à maioria da população, uma real alternativa de esquerda.
Ninguém olha com bons olhos um corte com o Euro.
A maioria deseja realmente mudar -porque tem uma qualquer noção, ainda que rudimentar, do perigo actual- mas sem alterar muita coisa, existe um conformismo paralisante.
Sair do Euro, é para a maioria, um verdadeiro salto no escuro e ninguém quer correr esse risco, sem ter uma projecção clara do que pode acontecer.
Mesmo os mais prejudicados com a actual situação, negam cair nessa hipótese de mudar radicalmente.
Medo, é a palavra mais acertada e corrente.

Unknown disse...

É incrível que os partidos tradicionais ditos de esquerda, não saibam oferecer uma alternativa real de Governo ao país.
E passam por isso a vidinha a criticarem as alternativas oferecidas pelo PS ... como se isso fosse alguma alternativa real de governo!
Qual é a alternativa oferecida pelo PCP?
Qual é a alternativa oferecida pelo BE?
Qual é a alternativsa oferecida pela CGTP /UGT aos trabalhadores?
O PS pelo menos diz que quer governar e propõe um Primeiro Ministro. Será assim tão difícil á esquerda tradicional fazer o mesmo?
Enquanto assim não acontecer, o PCP e o BE não passarão de meras muletas da "direita" para esta continuar a governar o país, a favor dos "donos do negócio" e contra os interesses de quem trabalha!

Anónimo disse...

Caro Manuel Salgado Alves:

O PSucialista não é alternativa nenhuma à 'politica' dos ,também corruptos ,PSD/CDS como sabe pelas noticias das malas de dinheiro para o mário soares(Rui Mateus) e,o outro gajo do PS q era do CA do BES-sim,o q entrava calado e, saia mudo!Noticia do diarioeconomico de set 2014!-além dum denunciante q pertenceu à CIA e bufou q a 'agencia' compra políticos de excelência europeus com malas de dinheiro...)

Pôr a CGTP ao nível duma ugt em q este secretário geral PEDIU, ao 'Doutor' Ricardo Espirito Santo a bênção para assumir os 'contróis' da ugt, nada abona para as 'alternativas' do PSucialista.Aliás,penso q o PS , juntamente com clones mais achegados à Plutocracia deveriam,pura e simplesmente,desaparecerem duma vez por todas.O seu PS, juntamente com os partidos do arco da corrupção,ooops!,(des)governação, deveriam desaparecer para NUNCA MAIS!
SÃO TÃO CORRUPTOS Q O sr.ainda tem a supina lata de defender gajos como o sócas,o rodas baixas de macau,o vitorino -um mafioso do caral**, e uma miríade de Filhos da Puta.Tenha VERGONHA NESSA CARA!!!!!!

Anónimo disse...

Um excitado Salgado Alves pergunta qual é a alternativa oferecida pelos "partidos tradicionais ditos de esquerda". No fundo está preocupado por estes não se oferecerem em mesuras ao PS, partido de esquerda nominal.

Para não variar do discurso fascista de uma certa clique, lá vem com a treta do PCP e BE "aliados" da direita, recusando a estes partidos e seus eleitores o direito de discutirem linhas programáticas diferentes das que o PS gosta de levar nos seus assaltos ao poder. Para esta gente, BE e PCO só deviam existir na medida em que servissem para manter o PS no Governo - e mesmo que este o mais das vezes vote com PSD e CDS-PP, deixe passar ou piore em questões do ADN esquerdista como o Código do Trabalho, a privatização de serviços públicos, a feitura de PPP, a afronta à Função Pública.


Como tem Salgado Alves tem dificuldade em descobrir alternativas, junto o que obtive numa rápida pesquisa na net, nesse sentido. É verdade que não achei alternativas da UGT, mas isso era o Manuel Salgado Alves a brincar connosco. Carlos Silva, que foi da direcção do PS, não informou Ricardo Salgado que ia concorrer a sg da central?


http://www.dn.pt/politica/interior.aspx?content_id=4427595

http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=764991&tm=9&layout=121&visual=49

hhttp://www.publico.pt/economia/noticia/nacionalizacao-da-banca-comercial-e-imperativo-nacional-diz-pcp-1661245


http://www.esquerda.net/artigo/bloco-prop%C3%B5e-ronda-de-negocia%C3%A7%C3%A3o-para-governo-de-esquerda/28686

http://www.tsf.pt/PaginaInicial/Portugal/Interior.aspx?content_id=4480176

http://www.jornaldenegocios.pt/economia/detalhe/bloco_propoe_discussao_de_programa_de_governo_de_esquerda_com_ps_e_pcp.html


http://www.dn.pt/politica/interior.aspx?content_id=2879612

meirelesportuense disse...

Outro problema e também sério, é o PS ter-se colocado em termos conceptuais na mesma franja em que está a franja política do pacto Governamental, o português comum não consegue entender isso e vai castigá-lo, votando ainda que contra vontade, na actual maioria...Ou abstendo-se.
A única solução ao alcance do PS é abrir-se definitivamente à esquerda e aliar-se quer ao PCP quer ao Bloco, ou apenas a um deles. Se fizer isso, essa coligação ganhará rápidamente uma dinâmica que não poderá ser contrariada por ninguém.