segunda-feira, 25 de novembro de 2024

Descarada aldrabice

Na passada quinta-feira, através do Expresso, o ministro da Educação Fernando Alexandre assegurou que o governo tinha alcançado, graças às suas medidas, o principal objetivo fixado no «Plano +Aulas +Sucesso». Isto é, a redução em 90% dos alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina desde o início do ano letivo, com apenas 2.338 alunos a permanecer, à presente data, nessa circunstância (antecipando até em um mês, nesses termos, a meta fixada).

Leitão Amaro, ministro da Presidência, exultou com a boa nova, afirmando tratar-se de «um dia histórico», alcançado por «um governo que enfrentou um problema [e] o resolve», qualificando a alegada queda como «um dos melhores resultados, uma das melhores novidades que os portugueses tiveram». Dando sinais de estar mais ciente do embuste, Luís Montenegro apressou-se a desvalorizar a «discussão sobre números», acrescentando que o governo os utiliza «apenas para poder aferir se as decisões estão a ter bom ou mau resultado».


Sucede, porém, que a suposta redução em 90% do número de alunos sem aulas desde o início do ano letivo, face ao ano letivo anterior, suscita várias questões, que comprometem, de forma séria e factual, a alegada «façanha»:

a) Ao tomar como referência, para aferir o cumprimento do objetivo, o total de alunos sem aulas no final do 1º período em 2023 (20.887 alunos) - e não, apenas, os alunos sem aulas desde o início do ano letivo (cerca de 2.000) - o governo compara o que não é comparável. Os alunos sem aulas a uma disciplina desde o início do ano letivo, em dezembro de 2023, representam apenas 10% de todos os alunos que, nesse momento, não tinham aulas a uma disciplina.

b) Ao focar-se apenas nos alunos sem aulas desde o início do ano letivo, o governo descurou o universo de alunos que, por diversas razões (baixas médicas, licenças de paternidade dos docentes, etc.) estiveram sem aulas a pelo menos uma disciplina, por períodos de tempo muito variáveis. Como mostra o gráfico aqui em cima, este universo foi assumindo um peso cada vez maior, passando de cerca de 38% do total de alunos sem aulas a 10 de outubro (26 mil alunos), para 94% do total (39 mil alunos), a 20 de novembro.

c) Regista-se, além disso, a partir de 6 de novembro, uma inversão na tendência de redução do valor global de alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina. Se nessa data o total de alunos (incluindo, portanto, os que estavam sem aulas desde o início do ano letivo e os restantes) era de 37 mil, atinge-se a 20 de novembro um valor já próximo dos 42 mil (agravamento de 12,5%). O que, de acordo com a estimativa da Fenprof, traduz um aumento de cerca de 10 mil alunos face ao período homólogo de 2023 (27 de novembro).

d) Os cerca de 41 mil alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina significam, ainda, que o governo tem cerca de um mês para se aproximar do valor registado no final do 1º período do ano letivo anterior. Isto é, os quase 21 mil alunos registados em dezembro de 2023 e que o governo tomou, indevidamente, como referência para a alegada redução de 90%. Ou seja, o governo tem cerca de um mês para reduzir para metade (em cerca de 20 mil), o número de alunos que estão neste momento sem aulas a pelo menos uma disciplina.

Resulta daqui, portanto, neste momento, um agravar da situação face ao ano anterior, ao contrário do feito histórico que Leitão Amaro propagandeia. E tem razão o Primeiro-ministro: se os números não devem servir para alimentar «querelas», mas antes para aferir «se as decisões estão a ter bom ou mau resultado», fica hoje claro que as medidas do governo, face ao objetivo traçado, fracassaram. Afinal, não bastava mudar de governo para que os problemas se resolvessem, ao contrário do que Luís Montenegro assegurava há cerca de um ano.

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