sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Uma crise viajada

 

A crise financeira internacional, iniciada em 2007, tem feito um longo périplo geográfico. Começou pelos EUA, passou por Londres e Frankfurt, destruiu o Sul da Europa e agora parece ter chegado aos chamados “emergentes”: Turquia, Argentina, Índia, Brasil, África do Sul, etc. A desgraça destes países é, aparentemente, causada pela recuperação económica no país onde a crise começou, os EUA. O banco central norte-americano decidiu começar a retirar progressivamente os apoios ao sistema financeiro, sob a forma de injecções de liquidez. Com menos liquidez e maiores taxas de juro nos mercados de obrigações, os agentes reajustaram as suas posições e começaram a retirar capitais de mercados menos robustos. Com o seu típico comportamento de manada, esta retirada de capitais, aliada aos crescentes défices externos de muitos destes países, resultaram na debandada de capital, na queda abrupta de muitas das moedas destes países e em aumentos das taxas de juro, penalizando assim o consumo e investimento.

Mercados liberalizados, fluxos abruptos de capitais, dívidas externas crescentes são características que nos fazem lembrar a crise financeira do final dos anos noventa em países como o Brasil, a Rússia, Argentina e os países do Sudoeste Asiático. Hoje, muitos receiam a repetição desse filme. No entanto, existem diferenças importantes: a generalidade destes países abandonou as políticas cambiais rígidas e semi-rígidas de então; durante os anos 2000, acumularam fabulosas reservas cambiais que lhes permitem intervir nos mercados; os défices externos presentes não são tão grandes como então.

Todavia, o facto de não estarmos perante os mesmos factores não deve ser motivo de desvalorização do que se está agora a passar. A dimensão dos fluxos financeiros internacionais é hoje muito superior à dos anos noventa e, sobretudo, a sua composição e efeitos alteraram-se radicalmente. Os sistemas bancários, liberalizados e com novos instrumentos financeiros ao seu dispor, reforçaram o seu papel de intermediário entre o fluxo de capitais externo e as suas economias. Nos anos noventa, estes fluxos afluíram aos processos de privatização e de internacionalização destas economias. Já a última década foi sobretudo marcada por uma formidável expansão dos balanços bancários destes países. O resultado foi um crescimento desmesurado do endividamento das famílias e das empresas. Conclusão: aumentos de taxas de juro, sobretudo num clima internacional deflacionário, podem colocar o sistema financeiro dos países de rendimento médio em apuros. A financeirização destas economias mostra agora o seu lado negro.

4 comentários:

O Puma disse...

A procissão ainda vai no adro

Jose disse...

Onde haja políticas de Estado despesistas e desreguladores sempre o poder financeiro ganha domínio.

rui cs disse...


Pois, o caso de Porto Rico que é um território dos EUA e que apesar de não ser um Estado americano a possibilidade de ruptura financeira está na ordem do dia (depois de Detroit no ano passado) poderá ou não indicar que a recuperação económica dos EUA não será talvez ilusória, quando ainda por cima há poucos meses Obama esteve na iminência de não ter orçamento aprovado?

Anónimo disse...

"fazem lembrar a crise financeira do final dos anos noventa em países como o Brasil, a Rússia, Argentina e os países do Sudoeste Asiático."


Desejo fazer uma rectificação acerca daquilo que escreve sobre o colapso financeiro na Rússia em Agosto de 1998.

A falência do sistema financeiro na Rússia deveu-se, ao facto (acto criminoso) de na década de 90 terem fechado à volta de 80 000 empresas, como consequência disso a produção caiu mais de 50% (+_ 60%) , inversamente o consumo disparou para níveis incomportáveis, entretanto os países capitalistas na tentativa vã de segurar o sistema, financiaram o governo com milhares de milhões de dólares para a compra de bens ao estrangeiro que o país deixou de produzir, com o objetivo de aplacar o descontentamento) .

A determinado ponto a massa monetária em dólares era já superior ao rublo, os Russos designavam a própria moeda como dinheiro de madeira, as trocas comerciais dentro do país eram maioritariamente efectuadas em dólares.

Estou plenamente a par dessa terrível realidade e as consequências que provocou.

Portanto o colapso financeiro de 1998 na Rússia nada teve de comum com as crises financeiras noutros países.

Foi um crime planeado e dirigido por uma camarilha de ladrões apoiados por o capitalismo Ocidental com o objectivo único de desmantelar o sistema de produção Socialista.

Isso está registado na memória dos povos, mais tarde ou mais cedo vão ter que prestar contas.

Carlos Carapeto