Os pobres não trabalham porque têm demasiados rendimentos; os ricos não trabalham porque não têm rendimentos suficientes. Expande-se e revitaliza-se a economia dando menos aos pobres e mais aos ricos.
Há trinta anos atrás, o economista político John Kenneth Galbraith resumia, com insuperáveis ironia e poder de síntese, muitas páginas de pensamento neoliberal focado na “oferta” e numa suposta “libertação da economia”. Esta estaria hoje associada a reformas ditas estruturais. São expressões ainda na moda entre os que confundem os interesses dos credores externos com os interesses da maioria dos que aqui vivem. Na realidade, esta “libertação”, como Galbraith nos ensinou, serve sempre para ocultar ideologicamente o que mais não é do que transferência, ajudada pelo Estado que nunca se dispensa em capitalismo, de poder para quem já controla recursos a mais à custa da liberdade de quem tem recursos a menos e vulnerabilidade a mais.
A última aplicação do pensamento redistributivo neoliberal – do trabalho para certas fracções do capital, geralmente as mais predadoras – à economia portuguesa pode ser quantificada e resumida antes das novidades de ontem no quadro abaixo, graças ao economista Eugénio Rosa, mas também pode ser captada através de notícias que correm o risco de passar desapercebidas e que nos informam de recuos expressivos do PSD-CDS perante quem tem poder, neste caso a banca.
O que já não passa desapercebido é o falhanço clamoroso da política económica –“desemprego mais elevado, rendimentos disponíveis mais baixos”, diz a troika no seu comunicado, ao mesmo tempo que garante que está tudo bem. Tem a palavra Medeiros Ferreira sobre o horizonte do défice: ”O Sol continua a rodar à volta da Terra. Postos perante a prova dos factos governo e troika empurram com as barrigas grávidas de enganos as datas sacrossantas que celebraram até ontem. O défice orçamental fica ordenado com o mesmo rigor tecnocrático e o fétiche da exactidão profética de sempre”. Galbraith não escrevia melhor. O défice orçamental é mesmo uma variável endógena e nas mãos desta gente uma fonte de pressão permanente para dar liberdade a alguns à custa da liberdade da maioria.
Entretanto, o jornalista de Luís Rego, a partir de Bruxelas, identifica bem a lógica da actual europeização: “São Bento aprendeu bem a lição europeia de medir a credibilidade pelo sofrimento infligido à população (…) De fora ninguém nos irá socorrer. Bruxelas entrou decididamente no modo de filme ‘gore' - quanto mais sangue, melhor.” A “fraude inocente”, ou nem por isso, que Galbraith denunciou tão bem, está viva em Bruxelas e inscrita neste euro.
quinta-feira, 13 de setembro de 2012
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2 comentários:
Olá João,
a zona euro tem como alicerce o (neo)liberalismo económico.
Talvez por ingenuidade penso que há (na zona euro)uma mediana consciência do termo económico no seu sentido substantivo porque existe nalguns países membros a noção de que o problema de Portugal é sobretudo político(e naturalmente dos grupos económicos que a controlam).
Nesta fase de minha vida não aceito que o livre mercado seja auto regulável "canone" neo-liberal, entretanto não vejo perspectiva futura para Portugal fora da zona Euro enquanto ela existir como bloco.
Em síntese, no contexto em que vivemos ---um processo em progresso, acho importante que as forças contrárias num Estado que visa o Bem Comum, sejam convenientemente identificadas e senão banidas pelo menos controlados os seus efeitos.
Isto é um problema mais político que económico no sentido formal.
Saudações
“São Bento aprendeu bem a lição europeia de medir a credibilidade pelo sofrimento infligido à população (…) De fora ninguém nos irá socorrer. Bruxelas entrou decididamente no modo de filme ‘gore' - quanto mais sangue, melhor.”
Não é Bruxelas. É o oligopólio financeiro mundial. É tão palerma acusar instituições políticas que nada mais são que instrumentos do Grande Dinheiro...
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