segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Quiz e política industrial

A resposta certa do quiz é a Suíça e o vencedor foi o Rui Tavares. Foi com bastante surpresa que descobri este facto, habituado que estou a ver a Suíça como um país cuja riqueza estaria baseada no secretismo e facilidades fiscais do seu sofisticado sistema financeiro (sector terciário). Cheguei a este dado através do mais recente livro do, amiúde aqui citado, economista coreano Ha-Joon Chang intitulado “23 Things They Don’t Tell You About Capitalism” (“23 Coisas que não são ditas sobre o capitalismo”).

Uma dessas “coisas” (a nona) é que “não vivemos numa era pós-industrial”. Chang explica que, embora a maior parte de nós trabalhe no sector terciário, o sector industrial não perdeu importância nas economias modernas. Se o seu peso relativo no PIB tem vindo a diminuir nas economias mais desenvolvidas, tal não é tanto o efeito das deslocalizações para países como a China (Portugal é um caso diferente, mas já lá irei), mas sobretudo o resultado da ilusão óptica do aumento da subcontratação por parte das empresas - quando uma empresa industrial passa a contratar a terceiros os serviços de limpeza ou de design que antes assumia, existe uma aparente transferência de valor do sector secundário para o terciário – e dos maiores aumentos da produtividade no sector industrial face aos serviços. Esta última razão é deveras interessante: não consumimos hoje menos bens manufacturados, mas o seu valor relativo face aos serviços diminuiu. Por exemplo, hoje o preço dos computadores é um terço do que era nos anos noventa. Isso não quer dizer que consuma menos computadores. Pelo contrário, eu agora até tenho dois. No entanto, face aos serviços, cujo preço não desceu, como um corte de cabelo, o preço dos computadores desceu vertiginosamente e tal dá-me(nos) a sensação de que os bens industriais são menos importantes na economia. Não são. Não só pelo dinamismo da produtividade da economia como todo que o sector industrial proporciona, mas também porque os bens industriais continuam a ser bem mais transaccionáveis (e por isso exportáveis) face aos serviços, permitindo assim um equilíbrio, ou excedente (como no caso da Alemanha) da factura externa das diferentes economias. Aliás, boa parte dos sectores mais dinâmicos dos serviços são aqueles que estão serviço da indústria. Por isso, são raríssimos os casos de países cuja riqueza possa prescindir de um dinâmico sector industrial. A Suíça não é excepção.

A importância da desconstrução de um futuro radioso pós-industrial é maior no nosso país por quatro razões: 1- precisando de crescer urgentemente, a indústria é claramente a melhor forma de o fazer; 2- a desindustrialização devido à liberalização do comércio internacional foi aqui um facto, em sectores tão importantes como têxtil, o que só vinca a necessidade de construir alternativas; 3- Portugal sofre, por muitos motivos diga-se, de um crescente défice externo o que nos obriga a exportar mais e melhor quanto antes; 4- vivemos sob um governo fascinado com as novas tecnologias e sem um programa real de reconversão industrial.Em suma, Portugal precisa de uma política industrial robusta que alie protecção e promoção de determinados sectores industriais. Escreverei mais umas coisas sobre o assunto para que não fiquem a pensar que ando com sonhos produtivistas de uma margem Sul do Tejo cheia de chaminés a fumegar.

Entretanto, deixo um vídeo de apresentação do livro, seguido de debate com o editor de economia do the Guardian, Larry Elliot, infelizmente sem legendas.

5 comentários:

JP Santos disse...

"não consumimos hoje menos bens manufacturados, mas o seu valor relativo face aos serviços diminuiu. Por exemplo, hoje o preço dos computadores é um terço do que era nos anos noventa. Isso não quer dizer que consuma menos computadores. Pelo contrário, eu agora até tenho dois."

O mesmo se pode dizer relativamente à agricultura. Hoje consumimos inegavelmente mais bens alimentares do que há 100 anos. Um dos benefícios do progresso técnico agrícola e industrial é libertar recursos (nomeadamente trabalho) que pode ser aplicado noutras actividades. Por exemplo quando a produtividade no sector automóvel aumenta 50% provavelmente o consumo de carros não vai aumentar 50% e o que teremos é que iremos, por exemplo, produzir mais 20% de carros com 80% dos trabalhadores que antes utilizavam e que 20% dos trabalhadores da industria automóvel irão ser afectos a outras actividades.

Que é impossível a um país viver sem transaccionáveis é também uma evidência. Mas estes não terão necessariamente que ser industriais, podem ser agrícolas ou de serviços - por exemplo, turismo.

A dificuldade é como se passa dali para aqui: "Portugal precisa de uma política industrial robusta que alie protecção e promoção de determinados sectores industriais" e sobretudo que políticas em concreto é que poderão / deverão ser prosseguidas.

Eduardo disse...

Salazar deve estar fascinado com esta prosa.

E Barata disse...

Estou muito interessado nesta discussão, e pretendia adquirir o livro em causa. Para este efeito, alguém tem alguma sugestão que me possa ajudar?
Desde já, o meu reconhecido agradecimento.
E Barata

ANTÓNIO DA CEREJEIRA SALAZAR disse...

hoje o preço dos computadores é um terço do que era nos anos noventa....

não em 1994 um computador custava 120 a 150 contos
pressupondo o dobrar do indice de preços em 16 anos de base 100 para 200
corresponderia a 240 a 300 contos
1200 a 1500 euros
ora só será o triplo se se considerar os laptop's

um computador pessoal com os elementos de um dos anos 90
não custa hoje menos de 700 euros
logo custariam o dobro
Hoje consumimos inegavelmente mais bens alimentares do que há 30 anos.

mas produzimos muito menos

ANTÓNIO DA CEREJEIRA SALAZAR disse...

2- a desindustrialização devido à liberalização do comércio internacional foi aqui um facto, em sectores tão importantes como têxtil

e a indústria química ?

e a indústria farmacêutica?
resta a Bial e quantas mais

e os adubos? Sapec Quimigal são vestigiais

que análise tão mazinha
toda a indústria de fitosanitários
retrocedeu 100 anos