segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Ele não


«Manuel Luís Goucha processou o "Cinco para a meia-noite", um programa da RTP, porque num sketch humorístico o chamaram de "apresentadora". Agora, ao entrevistar um criminoso, sem informar quem era a quem estava a ver, veio dizer que a ideologia do politicamente correto era muito perigosa. Não é o único, há muita gente que gosta do mundo quando o mundo protege da discriminação, mas só quando o protege a si. E acha que gosta do politicamente correto quando é ofendido, mas não é sensível a esse sentimento, do politicamente correto, quando os ofendidos são outros. Já não falo de mim, que fui há uns anos ao lado da minha rua abordado por Mário Machado, ameaçando-me de morte, dizendo que me cortava a cabeça. (...) Eu provavelmente serei, da lista que vou dizer, o menos ofendido de todos.
Acho que a família de Alcino Monteiro, que foi morto no Bairro Alto na situação em que ele esteve envolvido, mas acima de tudo as cinco pessoas que espancou nessa noite, no que diz ter sido "um erro judicial", são capazes de estar um pouco ofendidas. Acho que a vítima que foi sequestrada, agredida ao soco e ao pontapé, amarrada - estou a fazer a descrição como vem no processo - pendurada numa cruz, enfiada numa banheira, queimada com cera de velas acesas, cortada em várias partes do corpo com um serrote (incluindo, se não me engano, no pénis), e torturada durante três horas e meia por Mário Machado e mais alguns, é capaz de ter ficado também um bocadinho ofendida. Como acho que ficou ofendido o outro sequestrado, dos vários que teve, que foi espancado e abandonado, em Monsanto, por Mário Machado. Como é capaz de ter ficado também ofendida aquela senhora que teria ajudado a Justiça a apanhá-lo, quando ele escreveu uma carta que dizia "Vou sair em liberdade em breve e juro pelos meus filhos que és a pessoa que mais odeio e vão-te matar à frente dos teus filhos. Juro, sua informadora de merda, que se não entregares 30 mil euros ao Joãozinho, vais pelo cano". Ou talvez a Procuradora Cândida Vilar, que foi ameaçada dentro da prisão, onde aliás Mário Machado espancou uma pessoa (o homem esteve sempre em reabilitação, sempre a ser reabilitado pela sociedade), quando ele escreveu uma carta pública, aberta (acho que nunca ninguém se tinha atrevido a tanto), a dizer aos nacionalistas para não se esquecerem do nome de Cândida Vilar para agir (e também foi condenado por isso).
Para que as pessoas possam ficar com o quadro completo sobre quem é esta pessoa "com opiniões polémicas" e que "tem direito à sua liberdade de expressão", vou ler o excerto de um texto que lhe é atribuído, a Mário Machado, e que está em vários sites como sendo dele, o que até hoje nunca desmentiu. (...) O texto será de 2006 ou 2007, em que diz: "O ódio é um sentimento tão nobre quanto o amor. Faz parte da nossa natureza e tudo o que vai contra a natureza é que tem que ser combatido. Vejo os nossos políticos e a comunicação social, por exemplo, mais preocupados em combater o ódio que em censurar os paneleiros, os pedófilos e afins. Adoro a confrontação física. Agarrar na escumalha e dar-lhes pontapés na cabeça, socos, sentir a adrenalina a disparar, a emoção ao fugir à polícia. Um dos anos mais felizes que tive foi o ano em que esfaqueei onze pessoas - recorde absoluto - e o sentir da faca a entrar, o inimigo a desfalecer, o seu olhar de pânico. Tudo isto em conjunto dá-me vida, recarrega-me as baterias. Adoro bater em pessoas". Este texto é-lhe atribuído até hoje, desde há bastantes anos, e ele nunca o desmentiu. Não é politicamente correto nem perigoso. O que é perigoso é ignorantes, na televisão, a baterem-se por audiências e a destruir a nossa democracia. Essas pessoas é que são perigosas.
» (Daniel Oliveira, no Eixo do Mal).

Na linha da análise no Eixo do Mal (que vale a pena ver na íntegra), é também de reter o editorial de Manuel Carvalho no Público de ontem (com o sugestivo título «Liberdade de expressão com chancela criminal»), onde se refere que «o problema principal da entrevista de Mário Machado à TVI é o próprio Mário Machado e o que Mário Machado pensa, o que acredita ou o que propõe é apenas um arrazoado de ideias daninhas que cabem nos limites da estupidez humana. É por isso que o que merece ser discutido em primeiro lugar nessa entrevista é o facto de alguém se ter lembrado de um homem com aquele passado criminal para dizer o que quer que seja às pessoas deste país. Se a liberdade de expressão existe para podermos ouvir o que nos incomoda ou ofende, como muito bem lembrou José Pacheco Pereira na edição de ontem, a liberdade de escolha de uma televisão existe para separar opiniões qualificadas de bestialidades, para destrinçar as virtudes republicanas dos comportamentos criminosos, para distinguir pessoas de bem de arruaceiros. (...) Ao ceder os seus ecrãs a Mário Machado, a TVI ultrapassou o risco vermelho que nos mostra o limite da tolerância em relação ao pluralismo e à liberdade de opiniões. Mário Machado tem direito à saudade do salazarismo e, desde que se abstenha de fazer a apologia da violência ou da violação da lei, pode defender a sua sinistra opinião. Mas uma televisão que professa a responsabilidade de informar e os princípios que dão forma a uma sociedade aberta e democrática não lhe deve dar palco a pretexto da liberdade de expressão para que possa amplificar o seu reles exemplo. E muito menos sem ter o cuidado de expor com toda a crueza o género de pessoa que é, o tipo de crimes que o levou à cadeia e o género de ideário extremista que propõe.»

6 comentários:

A Nossa Travessa disse...

Caro Nuno Serra

Não o conheço pessoalmente mas venho aqui dizer apenas isto: Nunca as mãos lhe doam!

Um abraço do

Antunes Ferreira - o avô do Vicente Ferreira

Unknown disse...

Li atentamente o seu comentário, e subscrevo em 95% em tudo o que diz sobre esse energume que se chama Mário Machado. Mas fiquei preocupado com a sua leitura de democracia, em relação à liberdade de expressão, que normalmente é incómoda para mentes totalitárias. Mas depois li por baixo deste rectângulo..."todos os comentários têm de ser aprovados pelo autor do blogue"...fiquei a perceber e entender todo o seu comentário, opinião e posição sobre este assunto e outros...

estevesayres disse...

Eu podia, e até devia comentar e dar a minha opinião politica , mas com os anos aprendi que tinha que ter perto de mim, uma experiente advogada, para me dar apoio jurídico. E como neste momento a não se encontra por perto, reservo-me para uma próxima oportunidade.
E sendo assim, limito-me a dizer simplesmente isto:
Se existem (e todos sabemos que existem só que metemos a cabeça na areia como avestruz), neonazis, extrema-direita, direita reaccionária, direita populista, fascistas e social-fascistas, é por culpa das políticas levadas acabo pelos sucessivos governos. Incluído o actual governo, com o apoio das suas muletas e do presidente dos afectos/populista.
E fico por aqui!
Nem fascismo nem social-fascismo!
Por uma Imprensa livre e Democrata!

Anónimo disse...

Protejam as frágeis mentes dos mentecaptos portugueses, de tais argumentos falaciosos! Eles bem precisam de ser pastoreados! O povo não é O Soberano, é apenas um bando de idiotas, que tem que ser guardado e orientado pelas luminárias, que são elas os nossos salvadores, da nossa pseudo-democracia! Bravo Nuno Serra, os seus posts são sempre previsíveis e coerentes!

Anónimo disse...

Caro Anónimo 08/01/2019 às 22:10
Não. Não são os "mentecaptos portugueses, mas toda a Humanidade que precisa de ser protegida de *FDPs* como você é o (se não é mesmo o próprio) Mário Machado.

Jose disse...

De um Estado Novo já decadente herdamos este jeito de anunciar a maior destruição a não se cumprir o corretês em vigor no tempo.
Agora é uma entrevista a um qualquer extremista que vai destruir a democracia.
Só uma democracia decadente ou montada em falsos padrões sofre tais comoções.