quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

Diz-me quem te premeia...


A revista The Banker (O Banqueiro) considerou Mário Centeno o melhor Ministro das Finanças de 2018 na Europa. Na óptica dos interesses dos banqueiros internacionais, esta distinção faz sentido. Lembrando o que já por aí escrevi:

O Ministro das Finanças aceitou que o sistema bancário português continuasse a ser uma cobaia para testar a União Bancária em construção, permitindo que em Portugal se aplicasse, por exemplo no Banif e no Novo Banco, o princípio europeu do «pagam, mas não mandam», ou seja, os contribuintes nacionais pagam, como sempre acabam por pagar, pelos desmandos dos bancos, mas o capital estrangeiro fica com um maior controlo de um sistema assim mais vulnerável. A Caixa Geral de Depósitos (CGD), por sua vez, mantém-se como banco nominalmente público, mas o quadro regulatório europeu garante que é ainda mais intensamente compelida a comportar-se como se fosse um banco privado. Numa próxima crise, tudo será pior por cá.

O chamado presidente do chamado Eurogrupo pretende completar a perversa União Bancária, que nos condena a ser controlados por bancos e reguladores estrangeiros. O aprofundamento da convergência com o explicitamente idealizado capitalismo dos EUA passa também por reforçar o peso dos mercados financeiros à escala da União Europeia, a golpes de política, como não podia deixar de ser, através da aposta na União dos Mercados de Capitais. A memória das crises financeiras é mesmo curta. Um dos exemplos que Mário Centeno já deu numa intervenção é revelador da ordem que está a ser criada à escala europeia: tal engenharia política facilitaria, entre outros, «a colocação das poupanças de um pensionista irlandês na Alemanha». As pensões são entendidas aqui não como o resultado de um sistema de repartição como o da Segurança Social portuguesa, mas sim como poupanças individuais a serem jogadas num casino de dimensões europeias. Poucos exemplos ilustram melhor a ideologia da financeirização e da sua expressão ideológica, a neoliberalização, indissociáveis da economia política europeia realmente existente.

11 comentários:

Jaime Santos disse...

Mário Centeno está a fazer, João Rodrigues, a coisa mais importante que alguém pode fazer se Portugal quiser no futuro deixar o Euro: pagar a dívida. Não irá haver nenhum perdão da dita que não implique uma grave crise entre nós primeiro e que não seja acompanhado por pesadas medidas de austeridade depois, como bem sabemos da História (Salazar também procedeu a um 'colossal' aumento de impostos no seu tempo).

É perfeitamente respeitável, note-se, defender a soberania monetária do País. O que é absolutamente demagógico é vir dizer que tal pode ser feito por artes mágicas, sem sacrifícios e sem indicar caminhos, no fundo dizer que o trabalho de casa tem que ser feito por outros...

Anónimo disse...

Que demagogia. Podia por exemplo que a revista é do "Financial Times" sempre ficava melhor do que fingir que pertence a um banco. São pessoas como o senhor que vão dar o poder de novo à direita, antes serem todos empertigados do que ceder um milímetro que seja.
Rodrigo Sousa e Castro escrevia hoje no Twitter: O mais competente ministro das finanças da II República. Um homem simples, afável, sério e que cuida dos seu Pais e do seu Povo. Que Deus o proteja.
Tirando a parte sobre Deus, tudo o que ele diz corresponde ao sentimento popular.

A Nossa Travessa disse...

Pobre Mário Centeno

Ele bem se tem esforçado para safar Portugal de sofrer na pele uma nova troika e vem o Excelentíssimo Senhor Doutor João Rodrigues dar-lhe uma coça monumental. Saiba Centeno tem o apoio, a consideração e o agradecimento de um tipo que não percebe patavina de finanças muito menos de economia.
O avô do Vicente Ferreira

Unknown disse...

É ao contrário: contrair e pagar dívida em euros significa querer permanecer no euro. Sacrifícios já existem e serão cada vez maiores, para os do costume; não devem ser desperdiçados no euro.

S.T. disse...

"Errare humanum est, sed perseverare diabolicum."

A frase latina supra assenta como uma luva à tentativa de fazer funcionar uma união monetária que à partida e quiçá intencionalmente se sabia que não poderia funcionar.

Porque das duas uma: Ou o governo alemão aceita rever radicalmente as suas duvidosas políticas económicas ou os esforços de Mário Centeno terão apenas o efeito de prolongar a pilhagem dos países periféricos pelos países do centro da zona euro.
Nesse contexto Mário Centeno, por mais simpático que seja, ou consegue mudanças significativas da parte do governo alemão ou estará objectiva e cínicamente a actuar contra os interesses do seu país de origem.

É isso mesmo que ressalta da leitura de um artigo, mais um, da London School of Economics, onde se identificam quatro lições a tirar da crise da zona euro:

http://blogs.lse.ac.uk/europpblog/2016/10/07/four-lessons-from-the-eurozone-crisis/

"Lesson 1: The economics and politics of the Euro Crisis have been largely predictable"

"Lição 1: A economia e a política da crise do euro têm sido amplamente previsíveis"

"The Euro crisis is, in large part, a variant of the balance-of-payments crises that many countries have experienced over the past two centuries."

"A crise do euro é, em grande parte, uma variante da crise de balança de pagamentos que muitos países experimentaram nos últimos dois séculos."

E eu acrescentaria que com a agravante de a estrutura da EMU impedir explicitamente o uso dos instrumentos que lhe permitiriam a sua resolução.

S.T.

Emigrante 2013 disse...

Pobre Mario Centeno? NÃO!! Pobre Povo Português!!!

Caro Avô do Vicente Ferreira! Ao lêr o seu comentario comecei por discordar do Senhor, mas acabei por "concordar" totalmente consigo quando , não sei se por falsa modéstia, afirmou não perceber *patavina de finanças e muito menos de economia* !

Tem no entanto, se quiser reverter essa sua suposta ignorancia sobre finanças e economia, tomando umas lições de economia gratis com um *excelente Professor, o seu Neto* !

Geringonço disse...

Neoliberalismo é tão pérfido ao ponto de pôr gente vítima do próprio a elogiá-lo.

Elogiar Mário Centeno é elogiar Neoliberalismo e aceitar o "não há alternativa"!
"Não há alternativa", uma famigerada criação neoliberal!

Certos comentários aqui deixados demonstram bem o legado miserável do Neoliberalismo, a ignorância que andou a ser promovida durante décadas não desaparece de um dia para o outro...

S.T. disse...

"Errare humanum est, sed perseverare diabolicum."

Do nesmo artigo da LSE:

"Lesson 2: Monetary union has amplified the political stakes"

"Lição 2: A união monetária ampliou as apostas políticas"

"Despite the broad similarities between the Euro crisis and past financial crises elsewhere in the world, it is also clear that the political stakes have been amplified because the crisis has occurred within the broader context of monetary union and European integration."

"Apesar das grandes semelhanças entre a crise do euro e crises financeiras passadas em outras partes do mundo, também está claro que as apostas políticas foram ampliadas porque a crise ocorreu dentro do contexto mais amplo da união monetária e da integração européia."

Isto é, ao contrário das promessas iniciais a EMU e o euro ao invés de proteger os seus estados membros agravou as pressões e a especulação contra as finanças dos países periféricos.

"...it has also become clear that European institutions – most notably, the European Central Bank and European Council – have entrenched and amplified the power and influence of creditor countries such as Germany even more than is the case in the IMF and other institutions of global financial governance."

"... também ficou claro que as instituições europeias - principalmente o Banco Central Europeu e o Conselho Europeu - entrincheiraram e ampliaram o poder e a influência dos países credores, como a Alemanha, ainda mais do que no FMI e noutras instituições de governança financeira global."

É claro? Perante as instituições europeias os estados deixaram de ser iguais para se dividirem em estados credores e estados devedores, condicionando aos últimos os seus direitos institucionais nos órgãos da "união".

S.T.

Jose disse...

Lembremo-nos do tempo em que os Bancos estavam 'ao serviço do nosso povo'- que épica bandalheira!!!

S.T. disse...

Ó José! Para bandalheiras épicas não é preciso recuar tanto no tempo.

Basta recuar até ao tempo do BPN...
S.T.

Jose disse...

No BPN não é épica, é pura bandalheira abrilesca