quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Richard Koo sabe do que fala


Claro que o Congresso comprometeu-se recentemente a cortar o nosso défice em $2.5 biliões como parte do acordo para evitar o incumprimento.

É bom que o Congresso tenha conseguido evitar o incumprimento. Mas eles deviam ter presente que o défice do Japão de facto aumentou quando o governo tentou cortar na despesa enquanto o sector privado estava a pagar as suas dívidas. O corte causou uma segunda recessão.

Pense na Grande Depressão; foi a despesa com a guerra que finalmente fez emergir a economia.
O governo japonês não gastou o suficiente no início dos anos 90 e arrastou o problema por mais dez anos. Se os EUA evitarem esse erro, talvez em dois anos saiam desta confusão.

(Toda a entrevista aqui)

7 comentários:

NanBanJin disse...

Caro Jorge Bateira:

Para quem conheça minimamente bem o Japão e acompanhe a respectiva realidade diariamente, a sensação com que se fica ao ler esta entrevista é a de que o Senhor Koo na realidade — e malgrado o seu percurso e origens — conhece muito mal o Japão de hoje, os problemas que o afectam e o que de historicamente mais relevante se passou neste país nos últimos 25 anos.

O Japão, como é sabido vive hoje a braços, com a maior dívida pública do pública do planeta — cerca de 200% do respectivo P.I.B. (umas 17 "Grécias", números redondos e verificáveis) e não por efeito de um monumental cataclismo como de 11.03 em Tohoku, mas sim por pura incúria de sucessivas administrações que nunca aprenderam a viver 'com menos'.
O Japão era um país com um notório excesso de activos até meados da década de 80 do século passado — por volta de 1986 chegou a atingir o patamar de maior economia mundial — efeito, de entre outras fontes de riqueza seguras, do quase-monopólio de produção de semi-condutores aplicados à indústria de componentes electrónicas e de cujo 'revenue' beneficiou até ao final dessa década, quando o domínio desse particular e preciosíssimo sector de mercado se perdeu para outras potências, precipitando o 'estoiro' da chamada 'economia-bolha'.

Ora os sucessivos governos do Partido Liberal-Democrático, força política dominante neste país até 2009, nunca souberam adaptar-se e adaptar o país — que malgrado a penosa recessão em que se arrasta de há vinte anos a esta parte ainda possui sectores produtivos de 1ª linha, nomeadamente as suas 12 indústrias automóveis próprias, que mantêm os invejáveis níveis de riqueza do país —, às necessidades de contenção orçamental e da despesa pública, nunca aprenderam a 'gastar menos': o único sector tradicionalmente 'deficitário' nas contas públicas nipónicas, e por efeito de um complexo problema constitucional, é o da Defesa Nacional — todos os outros continuam a viver como se o país ainda estivesse a nadar em dinheiro.
Qualquer pessoa que visite o Japão por mais de um mês apercebe-se rapidamente do enorme, para não dizer excessivo, peso do sector das obras públicas, por exemplo — do qual monumentais estruturas erigidas entre as décadas de 90 e a última, como a gigantesca Ponte Akashi-Kaikyo, que liga Kobe a Awaji, ou o Aeroporto Internacional de Kansai (erigido numa ilha artificial ao largo da Baía de Osaka, com um custo superior a 20 biliões de dólares, e hoje afectado por gravíssimos problemas de manutenção e sustentabilidade), são apenas símbolos do pior em matéria de gastos excessivos ao longo das últimas três décadas.

Muito pior ainda é a situação do Fundo Nacional de Pensões, base do generoso estado social nipónico, em falência técnica há seguramente mais de dez anos.

Sintetizando: o Japão nunca aprendeu a viver com menos do que em tempos teve, e em larga medida o povo Japonês continua a viver como uma 'criança mimada' a quem todos os caprichos são satisfeitos em nome de peculiares estratégias eleitorais que só podem ser compreendidas à luz da cultura local.
A manutenção do seu 'status', uma preocupação particularmente premente para as suas elites, mantém-se apenas graças à sua excepcional capacidade produtiva sustentada por uma mão cheia de actividades económicas de elevado rendimento e prestígio. Fora isso, há muito que já se fala de um risco sério de falência pura e dura daquela que é ainda a 3ª maior economia mundial.

http://newsonjapan.com/html/newsdesk/article/80826.php

Meus melhores e mais amigáveis cumprimentos,
Luís Filipe Afonso, em Fukuoka, Japão (desde 2008)

Anónimo disse...

A despesa com uma guerra é compensada pela perda de riqueza consequente à guerra.

Paulo Correia

Luís Lavoura disse...

O problema é que os EUA (e os outros) não podem aumentar a despesa porque já hoje estão crivados de dívida.
Repare: se Portugal deixou de aplicar o keynesianismo não foi porque não o quisesse aplicar, mas sim porque os mercados financeiros já não nos emprestam mais dinheiro.
Não é uma questão de não querer, é uma questão de não poder.

Jorge Bateira disse...

Caro NanBanJin

Richard Koo interpreta a realidade japonesa do ponto de vista de um macroeconomista e, nessa matéria, é certamente dos economistas que mais estudou a política económica do Japão. Mas tem uma grelha conceptual de interpretação da realidade que é difereente da sua.
É um dos economistas convidados por George Soros para trabalhar no New Economics Institute: http://www.youtube.com/watch?v=6k0_a1JS5hU

João Carlos Graça disse...

Caro Jorge
Caros todos
Precisões importantes:
1) Não é impossível continuar-se a aplicar políticas económicas keynesianas. Claro que é possível, mas isso implica controlo dos movimentos de capitais. Com liberdade destes, isso sim, é impossível ser-se keynesiano.
2) Se não fossem as obras e os gastos públicos, o Japão estaria ainda muito mais "na fossa". O caso japonês é, entre outras coisas, uma boa ilustração de como o modelo "inflação zero e juro zero" não é modelo que preste. Recusar isso por causa de palas doutrinárias e insistir uma e outra vez na cassete neoliberal do "emagrecimento do estado" e do "viver acima das possiblidades" é... bom, nem vale a pena continuar...
3) Há um aspecto importante neste história e que não é aqui referido. O Japão, quando foi excedentário em termos comerciais, usou essas reservas para emprestar dinheiro aos States (o que a China agora também faz), mas depois a política económica ianque, a respectiva utilização das taxas de juro e de câmbio (associada à posição privilegiada do dólar, como "moeda mundial"), fez os japoneses sofrerem aquela que é talvez a maior "banhada" da história económica mundial dos últimos séculos. Naturalmente, a economia japonesa ressentiu-se disso, mas esse facto ajudou aos "roaring nineties" dos states no período Clinton. Dessa forma, os ianques mostraram aos Japs que, mesmo sem McCarthur como vice-rei, eles ainda são "the boss"...
Ignorar de forma sistemática aspectos "geostratégicos" como este impede evidentemente a economics de se tornar (como devia) "economia política"...
Um abraço.

João Carlos Graça disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
PP disse...

Tanta gente a falar da grande falta de crescimento no Japão. 'A decada perdida'. Olhem para a taxa de crescimento per capita e a diferença com os US não foi assim tanta. Se olharem para o GDP/capita então o Japão contínua à frente dos US. Não percebo como é que se continua a não se ter em conta a idade da população. Não percebo.