sábado, 25 de abril de 2009

Liberdade para escolher um outro futuro

Hoje celebramos o dia em que gente ousada correu o risco de desobedecer à lei e ao poder instituídos num regime ditatorial para dar ao seu País um outro futuro.

Trinta e cinco anos depois, esse mesmo País encontra-se numa encruzilhada que clama por um novo gesto de ousadia. Crise, no original grego ‘krisis’, significa tempo de grandes decisões, de escolhas que vão marcar a nossa vida colectiva por longos anos.

Os neoliberais também têm consciência de que estamos num tempo de grandes decisões e, por isso, já iniciaram uma campanha focada nesta ideia-chave:
o neoliberalismo, quando bem aplicado, é o caminho para o desenvolvimento, pelo que são necessárias “reformas” dolorosas que só um governo de “bloco central” tem condições para executar. Como dizia Margaret Thatcher, “não há alternativa”.

O editorial do Público de anteontem é um bom exemplo:

“Não tenhamos ilusões e digamo-lo com toda a frontalidade: a) Portugal é uma pequena economia aberta e periférica muito exposta a qualquer crise, pois dependemos das exportações de produtos que nem sequer são muito diferenciados; b) em Portugal o peso do Estado na economia continua a ser asfixiante e incapaz de atrair o investimento estrangeiro ou de permitir que as melhores empresas portuguesas ganhem dimensão; c) não houve milagres e ao país continuam a faltar as elites de qualidade, os hábitos de exigência e as rotinas de trabalho que são tão ou mais importantes do que um título académico; d) estamos endividados, pagamos caro o crédito e habituámo-nos a viver acima das nossas possibilidades.”

No dia em que festejamos a rebeldia de ousar viver em liberdade, também eu acho que não devemos alimentar ilusões e que devemos falar com frontalidade.

Por isso, com todo o respeito pessoal, digo ao director do Público que no seu editorial tentou fazer passar por evidentes, como algo do senso comum, aquilo que são as suas opções neoliberais. Na ausência (diria mesmo, impossibilidade) de um contraditório sério no âmbito do próprio jornal, assumo aqui uma alternativa àquele texto:

a) Portugal tem uma pequena economia integrada numa economia (UE) maior que a dos EUA, num mercado onde vende quase tudo o que produz. A sua indústria, tal como a de toda a UE, está condenada a desaparecer se a UE mantiver a actual abertura comercial concedida à China;

b) A importância do Estado em Portugal deve crescer, em peso económico, em qualidade dos serviços prestados e em escrutínio democrático, para se aproximar dos países mais desenvolvidos do norte da Europa;

c) Portugal não deve confiar em milagres de conversão de um grupo social que alguns designam por “elites”. São regra geral profissionalmente medíocres e, frequentemente, também corruptas. Portugal deve dar poder a um projecto político que tenha ideias claras sobre um novo modelo de desenvolvimento e seja liderado por agentes políticos que, pela forma como vivem, e pela exigência ética que impõem aos seus colaboradores, possam constituir modelos de referência para o conjunto da sociedade;

d) Portugal não é uma família para ser gerido segundo os princípios da boa gestão doméstica. O actual endividamento é uma consequência do modelo neoliberal, de que a Irlanda e o Reino Unido são os exemplos mais conseguidos e, por isso mesmo, mais esclarecedores. A desastrosa ausência de políticas macroeconómicas à escala da UE exige de Portugal uma política diplomática enérgica, mobilizadora de uma coligação de países da Zona Euro que, actuando em bloco, force a adopção de instrumentos orçamentais próprios, de natureza federal, para acorrer aos países em maiores dificuldades antes que ocorram bancarrotas de efeitos imprevisíveis (para aprofundar a questão, ver aqui).

Num ano em que Portugal e a UE estão a caminho do desastre social, num ano em que a liberdade que o 25 de Abril nos deu também se manifesta através de eleições, os Portugueses estão mesmo confrontados com grandes decisões.

8 comentários:

manuel gouveia disse...

Para um país que tem falta de elites, paga muito bem aos seus executivos...

Basta comparar quanto ganha Vítor Vitalício Constâncio para percebermos isso mesmo!

Unknown disse...

É verdade que os portugueses estão mesmmo confrontados com grandes decisões. O problema é que os que podem executar as decisões que tomem tomam as decisões erradas e os que tomam as decisões certas não as podem executar.

A menos que falemos de outras decisões mais drásticas, do tipo das que foram tomadas em 25 de Abril de 1974. Bem precisamos ...

Diogo disse...

As eleições vão-nos dar um partido que é subsidiado pelo grande dinheiro, seja rosa, laranja ou azul, ou qualquer combinação das três. É essa a grande vantagem da «democracia»: as pessoas ficam convencidas que estão a escolher em liberdade.

fernando almeida disse...

Só será possivel uum futuro diferente se todos os portugueses sérios e de boa vontade encetarem uma luta sem tréguas contra o poder, corrupto e demagógico instalado. Desmascarando o cinismo dos politicos que trocam a defesa do interesse nacional pelos interesses do seu grupo politico ou partidário.
Temos agorao exemplo do 1º Ministro a falar sobre a escolaridade obrigatória,
que era uma promessa eleitoral para esta legislatura e que não foi cumprida, pois em lugar de assumir e tentar esclarecer o País os motivos verdadeiros pelos quais não cumpriu esta promessa eleitoral vem falar como fosse uma medida que nunca tivesse sido anunciada. Isto é falsa honestidade.

CS disse...

Jorge,

Desculpe. Mal nos conhecemos. Mas eu pedia-lhe que lesse isto. E que depois decidisse se devia divulgar. Eu acho que nenhum blogue de esquerda o deveria calar, se me permite.
http://ovalordasideias.blogspot.com/2009/04/houve-ontem-quem-louvasse-o-regresso-da.html

A Chata disse...

Se pudesse escolher, escolhia talvez este.
Growth fit for the future
By Peter David Pedersen
Apr 23, 2009
A new economy is on the doorstep. It's not the economy we used to know as "the new economy". It's not the information-technology-driven growth of the last few decades, although that makes up part of the new economy. A new economy is rapidly emerging, one that will transform the ways that people live and do business.

The name of the new new economy is the "ecological growth economy". This is neither a bad joke nor an anachronism. It is the emerging new reality. It is also the precondition for the continuation of human progress and the survival of millions of other species on Earth. We have an obvious choice: we can speed up the realization of the ecological growth economy now, or our children and theirs will suffer for centuries.
...
Can we evolve to become homo sociens?
...
I believe that if we are to make the grand shift to a new industrial and economic system, built firmly on ecological pillars, we will need to further evolve culturally, mentally, and even spiritually. I call this the evolution from homo sapiens to homo sociens - human beings who share and collaborate.
...
Peter David Pedersen, born in Denmark, is the chief executive of E-Square Inc., one of Japan's leading sustainability think tanks and consultancies. He works with some 100 Japan corporations annually on integrating sustainability into corporate strategy. He introduced the concept of LOHAS (Lifestyles of Health And Sustainability) to Japan in 2002.

(Published with permission of the Global Policy Innovations program at the Carnegie Council for Ethics in International Affairs.

(Copyright 2009 Global Policy Innovations.)

http://www.atimes.com/atimes/Global_Economy/KD23Dj03.html

Eu gostava de passar a pertencer ao Homo Sociens.

Chameme-me idealista ou ingénua.

Anónimo disse...

O título deste artigo quase parecia o titulo do livro mais conhecido de Milton Friedman.. Leiam-no, mudarão muitos dos vossos dogmas!

Miguel Fabiana disse...

Cravo vermelho ao Peito·


Cravo Vermelho ao peito
A muitos fica bem
Cravo Vermelho ao peito
A muitos fica bem
Sobretudo faz jeito
A certos filhos da Mãe
Sobretudo faz jeito
A certos filhos da Mãe

Não importa quem eles eram
Não importa quem eles são
Nem todo o mal que fizeram
Mas sempre a bem da Nação
Nem todo o mal que fizeram
Mas sempre a bem da Nação


E chegado o dia novo
Chegada a bendita hora
Vestiram uma pele de povo
Ficou-lhes o rabo de fora
Vestiram uma pele de povo
Ficou-lhes o rabo de fora



E aquele adminstrador
Promovido a democrata
Sempre exaltou o suor
Arrecandando ele a prata
Sempre exaltou o suor
Arrecandando ele a prata
Sempre exaltou o suor
Arrecandando ele a prata



Também veio o fura greves
Lacaio dos senhores de então
Pois pode bem ser que às vezes
Se arranje um novo patrão
Pois pode bem ser que às vezes
Se arranje um novo patrão



E os cultores da sapiência
Intelectuais de alto nível
Tranquilizando a consciência
O mais à esquerda possível
Tranquilizando a consciência
O mais à esquerda possível



José Barata Moura