quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Os ortodoxos chegam sempre tarde

O BCE decidiu finalmente descer as taxas de juro. Se em vez de andar entretido com os fantasmas da inflação, que não é um fenómeno monetário, o BCE tivesse descido as taxas há alguns meses, como defenderam os economistas ligados ao movimento sindical europeu, talvez a situação fosse um pouco menos grave. Em vez disso, o BCE decidiu subi-las. Erro grosseiro. Erro que aqui se denunciou. Agora, o BCE lá deve ter sido arrastado pelos bancos centrais com mandatos mais sensatos. Enfim, mais vale tarde do que nunca.

Entretanto, o governo britânico foi obrigado a nacionalizar parcialmente oito dos principais bancos britânicos. A realidade tem muita força. Acho que é o início de um envolvimento mais directo e permanente do governo no sistema financeiro. A terceira via terminou.

5 comentários:

Filipe Melo Sousa disse...

"decidiu finalmente descer".. estranho..

Lembro-me precisamente de um tal de Sr. Greenspan que manteve as taxas de juro reais negativas, criando uma bolha de crédito que despoletou isto tudo. Pergunto-me como um só homem pode decidir sobre toda a oferta no "mercado" de emissão monetária. Diz que é uma espécie de mercado liberalizado...

Anónimo disse...

No entanto a Euribor mantém-se...
Leigos como eu gostariam de perceber porquê. Talvez um tema para um novo post?

Anónimo disse...

E já agora, porque é que a Euribor se ajusta tão rapidamente quando a taxa de referência do BCE sobe e, pelos vistos, é tão hesitante a ajustar-se quando aquela desce?
São sugestões de temas que gostaria de ver tratados no vosso blogue que, para mim, é de referência. Obrigada.

Bruno Julião disse...

As taxas de juro desceram tarde (o que significa também que têm de descer mais!) e a euribor continua a subir, o que é difícil de aceitar pois, neste momento, as transacções entre bancos são "pouco normais"...

Anónimo disse...

A Euribor não responde(u) à descida da taxa de referência do BCE porque o que se passa nos mercados inter-bancários é uma completa ausência de confiança entre as instituições financeiras que nele participam!

Os bancos têm receio de emprestar uns aos outros, mesmo a curtíssimo prazo. Os problemas que se iniciaram com a quebra da bolha especulativa no mercado imobiliário americano colocaram em dificuldades muitas instituições financeiras, cujos activos (derivados directa ou indirectamente do mercado hipotecário), percebia-se então, estavam ameaçados pela séria probabilidade de incumprimentos em cadeia. A gravidade do problema ficou definitivamente exposta pelas falências (e "quase-falências") do conhecimento público. A dispersão destes activos, a complexidade da avaliação de alguns deles e a ausência de consideração de responsabilidades potenciais deles decorrentes nos balanços destas instituições, criam sérias dificuldades à avaliação da sua credibilidade e do risco de operações de crédito em que elas intervenham. A interdependência entre instituições americanas e europeias (algumas delas também expostas, mais ou menos directamente ao mercado imobiliário norte-americano) fez o resto.

A confiança esvaiu-se. O mercado interbancário perdeu representatividade. A esmagadora maioria dos bancos europeus recorre agora ao BCE, obrigado a ceder liquidez de forma a evitar males maiores. Aquelas instituições com excesso de liquidez, mais avessas agora ao risco, "guardam" o dinheiro, não confiando na capacidade de outras instituições homólogas honrarem os seus compromissos e/ou preferindo prevenir o alastramento dos problemas aos seus negócios. O relativamente pequeno volume de negócios que se produz no mercado interbancário, apara além de menos representativo, faz-se incorporando um prémio de risco mais elevado. Os bancos estão pouco dispostos a emprestar aos seus homólogos e os poucos que o fazem, exigem em troca uma remuneração que os compense de forma "extraordinária" pelo risco.

Parece-me por isso que a descida da taxa de juro de referência do BCE dificilmente terá um impacto significativo sobre a Euribor (nos prazos que comummente servem de referência nos contratos de crédito junto do público). Para que o tenha, é preciso que seja acompanhada de medidas que permitam recriar um clima de confiança no sistema. E como num outro comentário disse, a única entidade em que os mercados parecem confiar neste momento... é o Estado! A presença do Estado pode contribuir para que essa confiança no sistema regresse...

Contudo, é preciso dizer que a Europa está menos bem preparada para intervir do que os EUA. Falta à zona Euro um orçamento que permita atacar os problemas de forma coordenada... porque há instituições/sistemas bancários nacionais "maiores que os próprios Estados" e porque há uma grande interdependência entre instituições (muitas transnacionais). Pode acontecer que estes se vejam impotentes para conter uma crise desta dimensão - como acontece (fora da zona Euro) com a Islândia - uma vergonha para nós, Europeus.

Curiosamente, aos EUA, melhor equipados para fazer face à crise, talvez falte a vontade em intervir da forma necessária. Mas creio que mais tarde ou mais cedo, o Tesouro americano acabará por concluir que só participando de forma directa no processo de recapitalização do sistema, poderá conter a crise financeira.