quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Breve história da liberalização dos mercados financeiros II

O segundo problema dos ultraliberais, como Nuno Garoupa, é fazerem-se de esquecidos em relação aos processos de liberalização financeira que tão entusiasticamente apoiraram nos últimos vinte anos. Quando falamos de desregulamentação, não estamos interessados nos regulamentos técnicos de cada instrumento financeiro ou do enquadramento legal de cada agente, natural consequência do aumento do seu tamanho e complexidade. Estamos interessados em perceber como o Estado contribui para a explosão dos mercados financeiros nos últimos trinta anos, retirando muitos dos limites à acção dos agentes financeiros e esbatendo as fronteiras entre os diferentes mercados. Eric Helleiner fez esse trabalho de averiguação neste livro.

A história recua aos anos sessenta, ainda antes do fim do sistema monetário internacional de Bretton Woods, com a criação do mercado dos Eurodólares em Londres – um mercado que permitia a negociação de activos financeiros em moeda estrangeira (normalmente dólares) em Londres. Este mercado ganhou dimensão ao longo dos anos e os seus fluxos especulativos começaram a colocar sobre pressão o sistema de câmbios fixos que então imperava. Uma situação confortável para os EUA, desejosos por uma desvalorização do dólar face às moedas europeias, promotora das suas exportações. Em 1971, os EUA suspenderam a convertibilidade do dólar (em ouro) e, em 1973, acaba o sistema de câmbios fixos. Nesta altura, os países europeus tentaram avançar com uma proposta de controlos de capitais internacionais cooperativos que substituísse os controlos de capitais unilaterais. Os EUA resistiram e, em 1974, acabaram com os seus controlos domésticos, desencadeando um efeito dómino. O Reino Unido eliminou os seus em 1979 (já com Thatcher. Em 1986, o Acto Único Europeu impunha um calendário dos liberalização de fluxos de capitais a todos os membros da UE. Entretanto, os anos de Reagan e Thatcher, Blair e Clinton foram marcados pela promoção dos mercados financeiros, através da abertura a novos agentes (seguradoras, fundos de pensões), pelo fim de limites à sua acção (por exemplo, com o fim da lei dos anos trinta Glass-Steagel, que impunha divisão entre bancos comerciais e bancos de investimento) e pela privatização de empresas e bancos públicos. O Estado abdicou de intervir directamente, optando por uma regulação distante. Um processo a inverter urgentemente nos tempos que correm.

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