Elisa Ferreira concluiu que, para alcançar crescimento de longo prazo, os países precisam de “acelerar a adoção e implementação dos programas da política de coesão para 2021-2027”. No entanto, por muito que o papel dos fundos comunitários não seja negligenciável, há bons motivos para pensar que não são estes que vão tirar Portugal da armadilha do crescimento lento.
1. Os fundos não evitam o declínio do investimento público
À direita, houve quem se apressasse a garantir que Portugal “anda de mão estendida” para a Europa. Mas não é isso que estes números nos mostram, já que os fundos de coesão são destinados sobretudo aos países menos desenvolvidos, que recebem proporcionalmente mais do que os restantes. A situação portuguesa reflete, acima de tudo, a enorme quebra do investimento público nos últimos anos. A estratégia de contenção orçamental levada a cabo em nome do cumprimento e superação das metas europeias teve como principal vítima o investimento do Estado, que nos últimos anos esteve em mínimos históricos. A fixação com o défice zero é um entrave a uma verdadeira estratégia de desenvolvimento para o país.
Não é possível encontrar soluções para a estagnação sem um diagnóstico sério sobre os fatores estruturais que prendem a economia portuguesa e, de um modo geral, a periferia do sul da Europa (como o que tem sido feito por outros autores deste blog, aqui, aqui ou aqui). A adesão ao Euro trouxe uma moeda sobrevalorizada, que favoreceu as importações e encareceu as exportações para o resto do mundo. Outros fenómenos, como a entrada China na OMC e dos países de Leste na União Europeia, contribuíram para o declínio da indústria portuguesa face à concorrência internacional. Com a liberalização financeira e a equalização das taxas de juro à escala europeia, houve um enorme aumento do endividamento das empresas e das famílias. Ao mesmo tempo, a pertença ao mercado único retirou (ou restringiu fortemente) os principais instrumentos de política industrial, como a definição de tarifas aduaneiras, o controlo público de empresas estratégicas ou as compras públicas, além de restringir a política orçamental através da definição de limites para o défice e para a dívida.
O desenvolvimento da estrutura produtiva foi deixado nas mãos do mercado. Isso levou a que o investimento privado se tenha canalizado para setores como a construção, o imobiliário e, mais recentemente, o turismo e a restauração. O que estes setores têm em comum é o facto de serem considerados não-transacionáveis, isto é, produzirem bens e serviços que não se compram e vendem nos mercados internacionais. O mercado favoreceu estes setores por estarem menos expostos à concorrência internacional e, por isso, permitirem maiores lucros no curto prazo. Mas há outros aspetos que estes setores têm em comum: baixo potencial produtivo, baixa incorporação de conhecimento e tecnologia, baixos salários e precariedade laboral.
Enquanto o papel do Estado continuar restringido pelas regras da concorrência e pelas metas orçamentais da UE, dificilmente conseguiremos sair da armadilha do crescimento lento em que nos encontramos. Nesse contexto, os próximos fundos comunitários têm tudo para desiludir os seus entusiastas.
2 comentários:
Exacto. E qual a solução ?
Dado que o investimento público, nos países bálticos - que a direita aponta como exemplo - o investimento público tem também um elevado peso dos fundos de coesão, é expectável que também estes países venham a conhecer a armadilha do crescimento? Porquê?
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