quinta-feira, 13 de junho de 2013

Destroikar e desconversar

Na semana passada, o FMI veio reconhecer um conjunto de erros no programa de ajustamento à Grécia, ao mesmo tempo que sacudiu a água do capote, responsabilizando a UE. As comadres chatearam-se,  confirmaram-se as verdades, mas ficou tudo na mesma. Entretanto, enquanto na Grécia se louvava o mea culpa do FMI, em Portugal, o Primeiro-Ministro queixava-se da instabilidade gerada pela admissão de erros da troika e o Presidente da República, num momento bem coreografado, veio pedir o abandono do FMI da troika. Segundo Cavaco Silva, a UE está muito preocupada com a coesão e o crescimento económico, enquanto ao FMI só interessaria pela correcção dos desequilíbrios macroeconómicos. Isto, para quem não vê alternativa à troika e ao actual programa de ajustamento, não parece fazer muito sentido, pois não? Então quem assume erros não estaria mais disponível para aligeirar a dose do que todos reconhecem que nos está a matar?

As divergências entre o FMI e a Comissão Europeia/BCE não são de agora. Cavaco tem razão quando diz que o FMI tem mais olhos para os desequilíbrios macroeconómicos, mas efabula a posição da UE (esta, na verdade, está mais focada nas questões do défice e da dívida). No entanto, o que está em curso é uma manobra de diversão. Primeiro culpamos o FMI (até já assumiram a sua incompetência!) e, assim, acabamos por absolver uma UE para a qual continuamos a apelar esperançosos e cheio de pensamento mágico: numa parte da economia far-se-ia austeridade e na outra promover-se-ia o crescimento. Depois, como já está previsto, dispensamos os incompetentes e ficamos nos braços europeus. Grande vitória nacional.

O que acontece é que, de facto, quer seja através das operações do BCE de compra de dívida pública, quer seja através da intervenção do recentemente criado Mecanismo de Estabilidade Financeira (substituto do Fundo Europeu de Estabilização Financeira) com capacidade para comprar dívida pública no mercado primário e secundário, estamos nas vésperas de um futuro pós-troika sem FMI. Quer isto dizer o fim da austeridade? Não, o recurso a qualquer destes mecanismos de apoio financeiro, essenciais no sucesso do "regresso aos mercados", implicará novos memorandos (talvez com outro nome), como está formalmente previsto. O actual Governo de "iniciativa presidencial" procura assim ganhar tempo para continuar a aplicar o seu programa ao mesmo tempo que proclamará vitórias contra moinhos de vento. Plus ça change...

1 comentário:

Nuno Costa disse...

Caro Nuno Teles,

Não tenho a certeza de que a minha leitura dos eventos seja exactamente igual à sua.
A mim o que me parece é que o FMI está, antecipadamente, a limpar as mãos da catástrofe que se irá abater sobre a Grécia.
No subtexto, eles parecem estar a dizer: "ok, nós metemo-nos nisto, mas, por nós, teríamos preferido que a Grécia tivesse feito logo à partida um haircut da dívida. Só não exigimos isso (e a propósito: confessamos que distorcemos os dados para não o fazer) para que os bancos franceses e alemães se pudessem safar. Logo, meus queridos amigos, se se vier a concluir que a Grécia é insustentável dentro do euro, lembrem-se de que as coisas se degradaram ao longo de dois anos por causa da Comissão Europeia e do BCE, que estão ao serviço da Alemanha...nós não tivemos nada a ver com isto..." (risos...)

Como velho e submisso manhoso que Cavaco é, parece que intuiu-do alto da sua "manhosidade"-que a única salvação de Portugal, perante tal prenúncio de catástrofe, consistirá em dar ainda mais graxa e criar mais aproximações aos organismos da União Europeia no âmbito deste desentendimento no seio da troika.

Cálculos errados de um velho manhoso.
Os bancos nórdicos já estão safos e, mais cedo ou mais tarde, poderemos ser largados em alto mar....talvez depois das eleições Alemãs.