quinta-feira, 18 de outubro de 2012

A estocada final no «modelo social europeu»

O alerta chega pelo Henrique Sousa. A Comissão Europeia prepara-se - através de uma «Proposta de Directiva» - para desferir o derradeiro golpe no modelo social europeu, propondo mecanismos, na esfera dos contratos públicos, tendentes à liberalização e privatização dos serviços estatais de educação, saúde e segurança social.

Mais concretamente, no seu Anexo XVI (o diabo está, como diz o Henrique, nos detalhes), a proposta aponta as suas baterias para os «serviços de saúde e serviços sociais; serviços administrativos nas áreas da educação, da saúde e da cultura; serviços relacionados com a segurança social obrigatória e serviços relacionados com as prestações sociais». Trata-se de lançar a derradeira ofensiva ao pote, de modo particularmente incisivo no que concerne aos fundos da segurança social, aprofundando a regressão civilizacional que o desmantelamento do Estado Social comporta e convertendo «a União Europeia num espaço económico e político inteiramente comandado pelos mercados financeiros e por um ultraliberalismo suicidário».

Sabemo-lo cada vez melhor. A conversa das «dívidas soberanas», dos «ajustamentos», do «viver acima das possibilidades», das «reformas estruturais», do «Estado ineficiente» - de tudo o que, afinal, dá corpo à vaga austeritária que fracassa em toda a parte - é apenas o Cavalo de Troia que esconde as verdadeiras ambições da direita neoliberal europeia: entregar aos mercados e ao capital financeiro (os verdadeiros responsáveis pela crise) os apetitosos recursos dos sistemas nacionais de política social e, de caminho, cumprir o velho sonho de despedaçar o modelo social europeu, conseguindo na secretaria as vitórias negadas pela democracia.

Esta proposta é, aliás, bem ilustrativa das disfunções democráticas que corroem a União Europeia. Quantos dos partidos da direita candidatos ao parlamento europeu, que elegeram indirectamente a Comissão, terão inscrito de forma explícita nos seus programas eleitorais esta intenção de privatizar e liberalizar serviços públicos, particularmente no que concerne aos sistemas e recursos da Segurança Social?

6 comentários:

Anónimo disse...

não esquecer que há pessoal do PS como Vital Moreira que advoga essa privatização dos serviços do Modelo Social Europeu, penso eu de que...

Daniel Ferreira disse...

Permita-me perguntar: qual o problema de privatizar o Modelo Social? este continua a existir, é obrigação do(s) Estado(s) mas passa a ser prestado por privados.

"serviços de saúde e serviços sociais; serviços administrativos nas áreas da educação, da saúde e da cultura; serviços relacionados com a segurança social obrigatória e serviços relacionados com as prestações sociais" nenhuma destas funções tem que ser obrigatoriamente realizada por entidades publicas, se existem entidades privadas que o façam, geralmente mais barato e/ou melhor qualidade.

Anónimo disse...

mas alguém ignorava que era isso que psd e cds-pp queriam?

balelas.

José Guinote disse...

Na Europa existiu, nalguns países, um verdadeiro Estado Social com base no chamado “Modelo Social Europeu”. Em países como Portugal esse Estado Social foi sempre muito incompleto com políticas públicas incompetentes ou com a pura e simples omissão do Estado na sua definição e promoção. Salvou-se a Saúde e a Educação e pouco mais. A Comissão Barroso tem desenvolvido um “competente” trabalho de implosão do Estado Social que começou muito antes desta directiva centrando as suas atenções nos países nórdicos e nas políticas públicas de habitação. Claro que só se fossem estúpidos é que perderiam tempo com países como Portugal. Cá, como em Espanha e noutros países, os Governos - todos desde o PS ao PSD/PP, não ignorando as responsabilidades ao nível local que alargam um pouco mais o leque político - desenvolveram, nesta área uma política das mais liberais no contexto europeu que deve ter sossegado a CE.
A Comissão Europeia tem feito uma enorme pressão sobre as políticas públicas de habitação nos países em que elas foram mais bem sucedidas. Curiosamente quando o modelo se revelou financeiramente viável e gerou recursos próprios sem constituir encargo para o Estado, antes pelo contrário, a CE interviu.
O Le Monde de 24.02.2007 num trabalho cujo título era Logement Social: Les trois modèles européens afirmava a dado passo que “ Les HLM néerlandais trop bom marche pour Bruxelles.
“Mais la vision néerlandaise du logement social n’est pas celle de la technocratie européenne. En juillet 2005, les Pays-Bas avaient été rappelés à l’ordre par la Commission de Bruxelles après un examen des règles de financement des 600 coopératives néerlandaises du logement. Pour Bruxelles, leur mission est trop vaste et aboutit à fausser les règles de la concurrence, au détriment du privé. Ces coopératives, dont la valeur comptable globale se chiffrait, en 2005, à quelque 78 milliards d’euros, détiennent 75 % des logements locatifs du pays.

O que tem estado debaixo da mira da Comissão Barroso na Holanda são organismos locais de direito público titulares do parque habitacional social e com competências para atribuir fogos habitacionais, aos quais os particulares se candidatam. É através destas entidades, que também beneficiam de um fundo para a habitação constituído pelo Estado, que é prosseguida a política habitacional. Essas instituições detinham em 2008 mais de 2 milhões de fogos, e possuíam uma capitalização de mais de 32 mil milhões de euros, tendo assim um rating da dívida triple A. Esta solidez financeira não impediu a agressão da CE que visa apenas conferir, com o alibi da concorrência, ao sistema financeiro os lucros de um sistema desregulado e gerido pelo mercado que é fundamental para o negócio da banca, como nós muito bem sabemos.

João Carlos Graça disse...

Correcção necessária:
o ultraliberalismo não é suicidário. De modo nennhum.
Suicidário é aqueles que dizem ser de esquerda (e admitindo que são sinceros) não quererem sair de um espaço que se compreendeu perfeitissimamente ser ultraliberal por definição mesmo.
Isso sim, é perfeitamente suicidário...

Maquiavel disse...

E o pessoal ainda näo compreendeu que as eleiçöes para o Parlamento Europeus säo mais importantes que as so Parlamento local, pois a legislaçäo emanada pelo PE está acima da da AR, logo de nada vale por exemplo ter uma Assembleia da República totalmente do PCP a querer implementar Programas Sociais quando o Parlamento Europeu é dominado pelos ultraliberais que fazem leis que o impeçam!

Enfim...