Não é difícil pensar como imaginam Portugal, daqui a dez anos, Gaspar e Santos Pereira: um país cuja competitividade assenta nos baixos salários e na completa desregulamentação laboral, sustidos pela pressão de um desemprego a dois dígitos e pela pulverização do Estado Social. Ou seja, um país que apenas consegue atrair investidores oportunistas e empreendedores medíocres, que só sabem competir através do esmagamento do factor trabalho; um país que desvaloriza a qualificação dos recursos humanos, a partir de uma estratégia que está, por natureza, condenada ao fracasso: quem «compete por baixo» fica sempre em situação de vulnerabilidade.
É nesta linha (para além do trágico sugadouro de recursos que constitui o eterno ajustamento orçamental) que se compreende o inequívoco desinvestimento na ciência e no ensino superior, dois dos domínios em que a tese das «gorduras» não convence absolutamente ninguém. Na proposta do OE para 2013, a dotação das universidades sofre um corte de 57 milhões face a 2012 (cerca de 10%), que acresce aos 200 milhões perdidos desde 2005. Nos politécnicos, a redução das transferências orçamentais ronda os 24 milhões de euros. Como sempre, prevê-se que as perdas sejam compensadas à custa do aumento de receitas próprias (em que se incluem as propinas) e - avisam as instituições já exauridas - à custa da não renovação de contratos a docentes, da supressão de «cadeiras» ou da redução, ainda mais pronunciada do que até aqui, de gastos correntes.
Na semana passada, chegou às mãos do ministro Nuno Crato a carta aberta «sem ciência não há futuro», que reuniu desde Julho mais de três mil assinaturas. Nela se reafirma a degradação das condições de investigação em Portugal, nomeadamente os consecutivos atrasos nos vencimentos, no reembolso do pagamento do Seguro Social Voluntário, a permanente precariedade contratual e os cortes nos apoios à investigação. Entretanto, a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, face aos «atrasos sistemáticos da FCT» no pagamento de bolsas de investigação, decidiu suspender o adiantamento de encargos relativos a projectos, colocando muitos investigadores em situação dramática.
A visão de futuro que nos reserva a governação da maioria de direita prepara-se no presente e traduzir-se-à, se não for detida a tempo, num claro regresso ao passado.
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