quarta-feira, 26 de outubro de 2022

Perto do abismo


A ideologia neoliberal está a conduzir as nossas sociedades para o abismo. Cada vez mais cheira a anos 20-30 do século passado.

Pressupostos (intocáveis) da política económica neoliberal contemporânea:

- Os capitais improdutivos devem ser livres de circular internacionalmente e criar novos instrumentos que multipliquem rendimento através de apostas especulativas (ver conceito de "banca sombra": bancos de "investimento", companhias de seguros, fundos de pensões, finança de produtos "derivados", etc.);

- O banco central é independente do poder político e a sua preocupação é combater a inflação para proteger os credores; se a inflação vier do lado dos custos das empresas, e não de um excesso de procura, também sobem as taxas de juro porque o afundamento da economia acabará por reduzir um pouco a inflação (desemprego, pobreza e despejos das habitações são um "dano colateral" porque os "de baixo" são sempre a variável de ajustamento);

- O banco central da UE tem o poder de vender ou comprar no mercado secundário a dívida pública de um país; compra quando quer fazer baixar a taxa de juro e vende quando quer fazer subi-la; se não gosta da política de um governo (de esquerda, ou de direita populista), deixa de comprar a dívida, ou mesmo vende-a, tornando insustentável o pagamento dos juros e vergando o país (são os nossos "valores democráticos");

- Uma economia deve ser gerida como a de uma família; recusa-se (sem o dizer explicitamente) o efeito multiplicador da política orçamental, ocultando ao povo que aumentar a despesa em investimento estrategicamente escolhido, e valorizar os salários e pensões, faz aumentar o produto da economia bastante mais do que essa despesa inicial (efeito multiplicador); portanto, o peso da dívida desceria, como até no FMI se escreve, mas é tabu dizê-lo na UE;

- Os rendimentos do trabalhador no activo (salário) e do trabalhador reformado (pensão) são aumentados bem abaixo do nível da inflação, pelo que a espiral salários-custos-preços é retórica para fazer aceitar o empobrecimento; na era neoliberal, os governos trabalham para que a parte do trabalho no produto não aumente; para que permanecesse sequer estável, os salários reais (os nominais corrigidos da inflação) teriam de acompanhar o aumento da produtividade, o que não acontece há muitos anos;

- O neoliberalismo mais acirrado dos nossos dias está a reduzir em larga escala o poder de compra do trabalho e, em vários países (GALP também?), os governos preparam-se para ajudar empresas privadas que fizeram apostas com os preços futuros da energia e, com esta crise energética, agora não têm liquidez para dar como garantia nesses negócios; como na anterior crise, pode ser preciso socializar os custos da especulação para travar um "risco sistémico" dos fundos de pensões e das empresas de energia;

As televisões e jornais, através de analistas que legitimam interesses dominantes, e de jornalistas ignorantes, estão a cumprir bem o seu papel. A população parece estar convencida de que a vida só pode ser assim.

Por tudo o que vejo, creio que estamos a caminho de mais uma grande recessão em resultado das sanções auto-punitivas, possivelmente acompanhada de nova crise financeira (ver este artigo do Financial Times). E, acho que não exagero, o planeta está na iminência de uma guerra nuclear.

O que podemos fazer?

6 comentários:

Anónimo disse...

A social democracia e o socialismo que conhecemos conduziram as nossas sociedades para o abismo, isto não é uma opinião é uma evidência, parece-me essencial e um importante ponto de partida começar por se dizer a verdade.

Francisco disse...

É pá, tenho lido como sempre - sou cliente com lugar cativo - mas não tenho comentado.
A síntese tão objectiva como necessária do anónimo das 07:15, deu-me o empurrão de que carecia e só para dizer que estou inteiramente e sem reservas, de acordo com o que escreveu. Acrescento apenas uma nota: a social democracia e o socialismo que conhecemos, em todas as suas nuances, variantes e disfarces.

Anónimo disse...

Anónimo 27/10, 7:15,

Você deve estar numa bolha digital de alucinação. Essa é a sua evidência. Está a precisar de literatura.

E isto não é uma opinião é uma evidência: essa de juntar socialismo e social-democracia no mesmo saco peca logo pela ignorância de base.

Lamento que não consiga discernir, por ora, que vivemos em sociedades de classes do modo de produção capitalista.

Numa das formas mais simples de o dizer: uma (a esmagadora maioria) trabalha, ao trabalhar produz riqueza, da riqueza produzida pelo seu trabalho recebe um salário (exploração) e não detêm poder político; e a outra (uma minoria) proprietária de meios de produção e de terras, não trabalha e vive ricamente com lucros da riqueza produzida no trabalho e... detêm o poder político para administrar a riqueza com a política que bem lhe aprouver.

Isto não é uma opinião é uma evidência, concreta e empiricamente verdadeira em todos os nossos dias quando vamos trabalhar... ou, caso você não trabalhe, quando vemos notícias (mesmo quando são dominadas por empresas de capital) e nos dizem que houve uma "concertação social" entre - diga lá - pa pa... pa...TRÕES e sindi sindica... perdão, perdão... marionetas (UGT).

TINA's Nemesis disse...

O recurso à guerra, ao ponto de entreterem-se com a possibilidade de guerra nuclear, demonstra bem de como as “elites” e seus servos da comunicação social corrupta estão dispostos a fazer de tudo para manter o poder.
A degeneração das “elites” é tal que já nem se importam em fazer o mínimo dos mínimos para manter o sistema, parece que as “elites” têm na cabeça o fim dos tempos então não fazem nada para manter tolerável a vida de milhões.
Neoliberalismo devia ter morrido em 2007/08, nós, enquanto sociedade, fomos na cantiga de fantoches neoliberais de Wall Street, como Obama, e já pagamos muito caro por isso.

O que nós podemos fazer?
Neoliberalismo tem que ser morto e enterrado de vez e para que isso aconteça é necessário acusar aqueles que o andaram e andam a promover de serem cúmplices da destruição da sociedade.
Também temos que nos organizar, produzir conteúdos que esclareçam aqueles que ainda têm dúvidas sobre o que é Neoliberalismo e como este degradou a economia e nossas vidas.

Neoliberalismo não tornou a economia melhor, não criou mais e melhores trabalhos, fez o oposto e fez o oposto DE PROPÓSITO! Porque digo eu de propósito, reparem como os “argumentos” dos neoliberais são sempre mais precariedade e mais empobrecimento para o trabalhador, menos investimento produtivo, mais rendas para aqueles que funcionam como colossais parasitas, por exemplo, esses ditos bancos de “investimento” como o Goldman Sachs.
Financeirização não é um fenómeno novo, é bastante antigo, e sempre produz crises massivas, muita miséria e sofrimento. Financeirização é a pilhagem da sociedade por parte daqueles que estão na posição para a poder pilhar.

Francisco disse...

Declaração de interesses, motivado pelo comentário do anónimo das 12:28: o socialismo que ali colo à social-democracia, é o que correndo com diversos títulos, se auto-apelida de "democrático". Não fosse isso e, claro, subscreveria tudo o que o prezado escreveu.

Anónimo disse...

És tão burro TINA, que deves ser comunista. Pelo nível, só pode. Vais morrer enganado e vencido. Duvido é que percebas isso, tu e essa tropa fandanga das esquerdas...