segunda-feira, 31 de março de 2014

Do excedente externo (I)


Portugal conseguiu um excedente externo de 2% do PIB no ano passado. Não só não nos endividamos, como já financiamos o resto do mundo. No entanto, uma leitura do boletim do INE mostra uma realidade pouco risonha.

Em primeiro lugar, assistimos a um crescimento da poupança das famílias, mas o seu rendimento disponível diminuiu. Ou seja, com a actual instabilidade em relação ao futuro, o consumo das famílias caiu mais do que o rendimento.

Mais importante é o que passa ao nível das empresas. Aqui as necessidades de financiamento mantiveram-se ao nível de 2012. Contudo, o investimento teve uma enorme quebra (-7,3%). Mesmo poupando drasticamente no investimento, as empresas portuguesa têm resultados de tal forma maus que continuam a ter as mesmas necessidades de endividamento.

Em suma, conseguimos gerar um excedente externo através de dois mecanismos: o empobrecimento e medo das famílias, por um lado, e a hipoteca do futuro da economia que se traduz na redução do investimento, por outro.

Dir-me-ão: esta leitura esquece o fantástico progresso das exportações (5,4%) face às importações (0,9%). Certo. Mas vejamos, se o consumo das famílias caiu e o investimento também, qual é a origem deste aumento das importações? Não tenho dado certos, mas tenho uma hipótese: talvez o aumento das exportações se deva, em boa medida, a um sector dependente das importações dos seus consumos intermédios, como o dos produtos petrolíferos que beneficiou da nova refinaria em Sines...

12 comentários:

Jose disse...

O papel de Sines não é uma hipótese, há-de ser factor significativo e seguramente mensurável.
O empobrecimento das famílias é outra certeza, e se aumenta a poupança significa que temos gente prudente e avisada.
Tudo considerado, se o excedente externo é um 'ter que ser' para serviço da díivida e garantia de financiamento, temos um bom desempenho!
Seria preferível que aí isto se chegasse com consyumo e investimento crescente?
Sim se houvesse financiamento e competitividade bastante.
O caminho faz-se caminhando...
Quem me fala de competitividade, e do nível de utilização da capacidade de produção instalada? Vai a esquerda inventar um novo salto tecnológico ou fundar o crescimento sobre os meios disponíveis?
Tabus para quem vê na luta pelo poder a prioridade máxima.

Anónimo disse...

Bom, bom, era não termos excedentes externos. Assim nem era preciso dar-se a este trabalho.

Dias disse...

O empobrecimento das famílias é um facto indesmentível, subtraídos os rendimentos, ao mesmo tempo que subiram os impostos e taxas, assim como os preços das despesas essenciais (energia, transportes, etc.).
O dinheiro mudou de mãos, para gáudio dos abutres da troika e dos catrogas de toda a espécie. A desforra de Abril cumpre-se…
Temos que dar uma volta a isto, virar tudo ao contrário, é a nossa sobrevivência que está em risco!

Luís Lavoura disse...

A causa do aumento das exportações será, em boa parte, a diminuição do consumo interno. Havendo menos consumo interno, as empresas vêem-se pressionadas a procurar com maior afinco a colocação dos seus produtos no exterior.
Foi o que se passou, em boa parte, com a GALP: a diminuição brutal do consumo de combustíveis em Portugal fez com que a GALP tivesse mais excedentes para exportar (mesmo sem a modernização da refinaria de Sines).

Luís Lavoura disse...

O processo da GALP é trivial: Portugal é um país deveras pobre em energia, alimentos e matérias-primas, pelo que tem que importar para depois poder exportar com valor acrescentado.
É o mesmo que o Japão faz e, que se saiba, dá-se muito bem com esse sistema. O Japão importa praticamente toda a sua energia e todas as suas matérias-primas, procesa-as nas suas fábricas e depois volta a exportar, com grande valor acrescentado.
Nada há de perverso em tal sistema. Não percebo por que razão o autor do post se revolta com o aumento das importações por parte da GALP.

Nunes disse...

Sr Lavoura, se é assim como diz, uma retoma da economia vai então reduzir as exportações, pois ficam menos excedentes disponíveis para exportação. Deve ser para isso que querem a austeridade permanente...

Anónimo disse...

O facto é o que país não tem capacidade de pagar a dívida.

Aliás, este excedente externo é conseguido através da redução brutal do investimento.

Ora, sem investimento a economia ficará menos produvita logo a capacidade de pagar a dívida diminui por si só.

Anónimo disse...

O maior tabu é o de quem não quer ver o óbvio:
Que a dívida a que nos querem amarrar não tem solução.É uma pedra gigante atracada ao pescoço de um condenado em vias de ser despejado no alto mar.

Por isso não adiantam as palarvas piedosas e manipuladoras sobre "tabus" ou sobre "lutas pelo poder" ou sobre "competividade" com que jose disfarça a evidência.
Mais uma vez que jose leia o já escrito e redito , aqui também neste blog.

De

Anónimo disse...

Sobre os dados do comércio externo no primeiro semestre de 2013 escrevia José Alberto Lourenço em Agosto do ano passado:
"as exportações e importações de mercadorias são fortemente influenciadas pela exportação de petróleo refinado e pela importação do crude. A evolução destas actividades tem sido de tal forma influenciada pela abertura de uma nova refinaria da Petrogal em Sines que as exportações de combustíveis refinados representavam em 2008 5,6% das nossas exportações de mercadorias e nos 1ºs seis meses do corrente ano ela representa já 10,6%, isto é quase duplicou a sua importância nas nossas exportações. Em seis meses a exportação de refinados de petróleo cresceu em termos homólogos 30,3% corrigidos dos dias úteis, isto é, exportaram-se neste período mais 553 milhões de euros do que em igual período de 2012. A influência desta evolução nas nossas exportações é tal que expurgando o seu impacto nas exportações, as nossas exportações teriam crescido apenas 0,7% no 1º semestre do ano, o que significa na prática que as nossas exportações sem a refinação de petróleo teriam estagnado neste período. Enquanto isto acontece do lado das exportações, do lado das importações, a importação de crude baixou no 1º semestre do ano 8% porque o consumo de combustíveis caíu devido à quebra do Consumo das Famílias e à queda da actividade económica das empresas. É claro que logo que se verifique uma efectiva retoma da actividade económica, a importação de crude crescerá e a nossa balança comercial energética será mais deficitária. Esta é do meu ponto de vista a nota mais importante a retirar da evolução verificada no Comércio Externo de Mercadorias no 1º semestre do ano, a nossa balança de mercadorias está fortemente dependente da actividade de refinação de petróleo e qualquer agravamento no preço do barril de petróleo, quer ele resulte da desvalorização do euro em relação ao dólar ou de qualquer outro factor que conduza à subida do preço do barril de petróleo, imediatamente as importações da matéria-prima crude encarecem e a actividade de refinação se torna menos rentável para o nosso país."

De

Anónimo disse...

O elogio do "empobrecimento das famílias arrumada ao lado da "gente prudente a avisada"
Com o devido respeito mas voltámos ao tempo do salazarismo dos pobrezinhos mas contentes, enquanto os "donos de Portugal" se refastelavam em todo o seu esplendor à custa da exploração de quem trabalhava?

De

Anónimo disse...

"serviço da dívida".
Uma pequena frase que explicita bem a submissão atroz a que nos querem arrastar.
A escravidão anunciada pelos defensores a outrance do "serviço da dívida.Sem qualquer rebuço, crítica ou dúvida do caminho a trilhar.
O fardo a pagar pelos desmandos dos que afinal de contas lucram com o tal "serviço"
A dívida como surgida da providência "esquecendo-se" que "a dívida pública portuguesa foi alimentada cuidadosamente para atingir o actual patamar e justificar as actuais políticas de extorsão organizada."

De

R.B. NorTør disse...

Sobre as importações energéticas do Japão, para que servem então os quase 50 reactores nucleares (e sem fim à vista para o programa)?