Primeiro, a denúncia.
"A CCPJ tem conhecimento, na sequência de vários pedidos de informação, da pressão a que muitos jornalistas, com carteira profissional, estão a ser sujeitos para produzir conteúdos patrocinados na forma de notícias, reportagens, entrevistas, e outros géneros jornalísticos. O jornalismo patrocinado, ou seja, trabalho que é executado em troca de um patrocínio comercial ou de qualquer outra forma de pagamento, é expressamente proibido pelo Estatuto do Jornalista".
A CCPJ alerta os jornalistas para a ilegalidade desses actos e para os riscos que correm.
O acto - "ter participado na conceção ou apresentação de conteúdos patrocinados, publicados em órgão de comunicação social ou qualquer outra publicação" - é grave. Caso se prove, o jornalista "incorre numa contraordenação punível com coima de 200 a 5000 euros" e, como sanção acessória, pode ser-lhe determinada a "interdição do exercício da profissão por um período máximo de 12 meses”.
E esta situação abrange os que "trabalham para suplementos comerciais distribuídos conjuntamente com publicações jornalísticas, identificando-se como jornalistas nos contactos que fazem com as empresas que pretendem divulgar. Esta prática configura o crime de usurpação de funções". E mais: "Não podem ser feitos por jornalistas"!
A CCPJ avisa que "não hesitará em denunciar estas situações". Nem mais!
Segundo, a impotência.
A CCPJ, espaldada no Conselho Deontológico do Sindicato, poderia começar pela grelha de programas das televisões e todos os suplementos de jornais e revistas. Todas as rubricas sobre informática, telemóveis, computadores, iPads, carros, viagens, restaurantes, hotéis, passatempos, fugas, até suplementos culturais dependentes da lógica comercial das editoras, dos produtoras cinematográficas, etc., etc., tudo isso deveriam dispensar os jornalistas, pivots, estagiários de jornalistas que os fazem. E em todas as imagens apresentar-se um rodapé a dizer "PUBLICIDADE". E não basta fazer escrever no fim: "Esta viagem foi patrocinada pela marca..."
E os jornalistas nunca, mas nunca, deveriam ficar ou gozar o "produto" que avaliam, muito menos recebê-los de presente...
Lembro-me de um editor de economia de um grande jornal de referência que chegava à redação e tinha em cima da mesa um telemóvel. E dizia: "Nada como chegar ao trabalho e ter um presente".
O problema é que a CCPJ não tem capacidade de inspecção ou auditoria. Apenas tem capacidade para "apreciar, julgar e sancionar a violação (...) dos deveres profissionais enunciados no n.o 2 do artigo 14.o do Estatuto do Jornalista". Como tal, assim o fará se lhe chegarem denúncias. Só que ninguém vai denunciar os seus pares ou as empresas que os empregam. Tudo fica ao critério da auto-regulação que, a julgar pelo comunicado da CCPJ, não tem conseguido debelar o crescente abandalhamento da profissão.
E por isso, a CCPJ apenas
"incentiva os jornalistas a recusarem qualquer forma de pressão no sentido de fazerem este tipo de publicidade encapotada, estando disponível para interceder sempre que seja chamada a fazê-lo"Não é pouco, mas não chega. Não tem chegado. E não vai chegar. Sobretudo quando a relação contratual for frágil, quando os salários forem baixos, quando os jornalistas não se inteirarem de que são mais fortes unidos, sindicalizados. Coesos. Capazes de, em uníssono, ter uma voz que proteja a consciência individual de cada um. E não profissionais sem coluna, que estigmatizam primariamente os sindicatos se fazem parte da maior central sindical - a CGTP (já os independentes é outra coisa...) - e que fazem quase tudo o que lhes mandam, porque há um sempre um tipo disposto a fazê-lo.
2 comentários:
A diferença entre ter opinião e divulgar opinião condiciona toda a apreciação da questão.
Quando a divulgação de opinião deve ser rotulada de publicidade é questão a tratar.
Duas coisas. O jornalismo livre é uma espécie em vias de extinção em todo o mundo. Em Portugal a haver ainda algum espécime deve andar ela por ela com o lince ibérico. A segunda ainda é mais engraçada. Porque é muito frequente ouvir uma certa espécie de direitolas - em Portugal, tipo observador - afirmarem sem sem se rirem que a comunicação social por cá é toda de esquerda.
Enviar um comentário