Se eu tivesse de escolher dois artigos já clássicos de economia muito úteis para os tempos actuais, escolheria o artigo de Irving Fisher, de 1933, sobre a interacção perversa entre a dívida e a deflação como segredo de todas as depressões, ou no presente caso de todas as estagnações, e o artigo de Michal Kalecki, de 1943, sobre a economia política do pleno emprego. Nos últimos anos temo-los referido várias vezes. O primeiro por causa do espectro da deflação em Portugal e não só. O segundo para explicar as bases sociais da deflacionária política de austeridade.
Ambrose Evans-Prichard mobiliza agora Fisher para analisar a forma como a Europa do Sul foi “traída” por uma política deflacionária contrária aos seus interesses, numa “União” sem instrumentos monetários e
orçamentais adequados às circunstâncias e sem perspectivas de os vir a ter por razões que um marxista como Kalecki compreenderia bem: o euro era uma utopia monetária e só sobrevive como distopia tecnocrática autoritária.
Basicamente na mesma linha, embora num tom menos caustico e, apesar de tudo, mais esperançoso, Wolfgang Munchau leva também a sério a deflação, que se alimenta da crise de procura e que está vinculada ao perigo da “estagnação secular”, e avança com uma sugestão que remete implicitamente para Kalecki: para lá de uma política monetária bem mais activa, os governos europeus deveriam aproveitar os ataques terroristas em França para dar um impulso orçamental por via do investimento em segurança, usando isso como pretexto para atenuar as regras orçamentais em vigor.
No seu artigo sobre a economia política da política económica, Kalecki tinha alertado para o facto de os capitalistas tendencialmente não apreciarem a política económica de estímulo público centrada no combate ao desemprego em contextos democráticos, dada a força que as classes trabalhadoras assim podem conquistar, desafiando a autoridade patronal. Parte daí para explicar a política económica de estímulo no quadro do fascismo, no quadro de uma economia de guerra.
No actual contexto de esvaziamento da democracia na escala onde esta pôde florescer, a ascensão do Estado
penal securitário, que de resto é indissociável do neoliberalismo, estimula sempre uma certa economia, políticamente pouco recomendável.
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2 comentários:
Uma salada de jargões temperada com o catastrofismo que garante e ilustra a culpa alheia.
"No actual contexto de esvaziamento da democracia na escala onde esta pôde florescer, a ascensão do Estado penal securitário, que de resto é indissociável do neoliberalismo, estimula sempre uma certa economia, políticamente pouco recomendável"
Pode-se discordar do que João Rodrigues escreve ou diz.
Mas a coerência com que argumenta, a elegância como o faz, a depuração e sobriedade da sua escrita,a honestidade intrínseca como se expressa,transformam a leitura dos seus textos num exercício estimulante que convoca a inteligência e o bom gosto.
E que ainda por cima dá gozo.
Por tudo isto ( e por mais coisas que a boa educação manda calar) o "comentário" ressabiado do comentador das 01.09 é simplesmente deplorável.
De
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