terça-feira, 10 de junho de 2014

Uma economia para um país

“O contributo da procura externa líquida para o crescimento homólogo da economia caiu, pela primeira vez desde a chegada da troika, para terreno negativo nos primeiros três meses deste ano. É o regresso a um padrão de crescimento considerado pouco sustentável.” Sérgio Aníbal resume bem a conjuntura e a estrutura que lhe subjaz.

Estavam à espera de transformações estruturais progressivas promovidas pela generosidade de uma intervenção externa? Pois sim, mas só se esquecerem a história das experiências de desenvolvimento, das que sempre requereram a mobilização nacional de instrumentos de política económica adequados às circunstâncias de cada país, a criação política de espaço para o desenvolvimento, quer por substituição de importações, quer por promoção de exportações.

Em Portugal, a grande obra das elites, que hoje discursam sobre nada e coisa nenhuma, foi precisamente a abdicação de espaço para o desenvolvimento, tudo servido por um pensamento económico infantil, na melhor das hipóteses, segundo o qual a integração irrestrita era uma escada para a prosperidade.

Numa estrutura criada pelo centro e pelos seus representantes na periferia as escolhas são sempre trágicas: a austeridade elimina o défice de balança corrente, graças à quebra do investimento e do consumo, destruindo a nossa capacidade económica; a atenuação da austeridade, graças à soberania residual, ajuda a recuperar a procura interna e o crescimento, mas contribui, graças à dependência que se perpetua, para que regresse o espectro do défice externo, sendo que a procura externa liquida deixa de funcionar como motor do que quer que seja, graças ao desaparecimento de exportações e à promoção de importações.

O desenvolvimento nunca passará por aqui, nem pelos termos de um debate absolutamente viciado e condicionado entre as elites do poder e de demasiadas oposições. O desenvolvimento exige que isto volte a ser um país.

5 comentários:

Anónimo disse...

Muito bom!

Jose disse...

«...a abdicação de espaço para o desenvolvimento»; presumindo que não se refira à perda do Império e que não entenda que a livre circulação no espaço CEE seja insuficiente espaço, resta a muito acertada asserção de que as 'elites' tornaram o espaço nacional impróprio para o investimento e a criação e desenvolvimento de actividade económica bastante.
Não podia estar mais de acordo!

António Geraldo Dias disse...

"O subdesenvolvimento não é, como muitos pensam equivocadamente, insuficiência ou ausência de desenvolvimento. O subdesenvolvimento é um produto ou um subproduto do desenvolvimento, uma derivação inevitável da exploração econômica colonial ou neocolonial, que continua se exercendo sobre diversas regiões do planeta".[JCastro].As economias centrais impulsionadas pelo dinamismo da reprodução do capital,ampliaram em escala mundial o seu espaço vital modelando assim a natureza extrovertida da economia periférica.
Aquilo que estamos a assistir na economia portuguesa é ao desenvolvimento do subdesenvolvimento de um capitalismo periférico em que capital, acumulação do capital e "crescimento" não têm na sua lógica o investimento e a criação alargada da actividade económica.
“After long observation and much reflection I am persuaded that the great failings of development cannot be resolved within the prevailing system. We must change
[R. Prebisch

O Puma disse...

Camões

merecia melhor

Jose disse...

A 'ciência' económica tem um atractivo muito especial : quanto mais genérico o pensamento mais irrefutável é.
A aparência do saber é tão mais fácil!