«O que podia ser menos claro é contudo, agora, mais nítido, para muitos. Para os trabalhadores, para os próprios empresários, para as pessoas a quem o interesse comum importa. É que a recessão é uma regressão que está a desfazer deliberadamente o nosso sistema produtivo, a possibilidade de a economia nacional ser uma entidade com um mínimo de capacidade de mando sobre si mesma. E liberais que são, desalmados como são, acham que tudo se deve limitar à concorrência desenfreada e que cada um, cada pessoa, cada região, cada país, deve ser apenas uma peça de um jogo sem grandes regras, ao serviço de uma figura sem dó, chamada mercados.
Eles querem uma economia de custos baixos. Querem uma economia periférica dependente. Querem uma economia que trabalhe mas não cuide de direitos, de bem-estar, da dignidade de quem trabalha. Uma economia em que a precariedade, que já atinge um quinto da população activa, seja a norma. Porque é que eles são assim? São apenas paus-mandados, são estúpidos? Não. São gente apostada em descarnar a sociedade que Abril abriu. São gente de um governo que tem que ser posto a andar pela consciência dos cidadãos deste país.
Claro está, uma má história não se fabrica sem falsificações. Inventaram, e era mentira, que as famílias tinham entrado numa loucura consumista. Quando basicamente se tinham limitado a comprar a casa própria numa economia para aí virada, que as tinha convidado a que comprassem. Inventaram, e era mentira, que o Estado se tinha endividado irresponsavelmente, quando acontecia que o tinha feito na mesma escala que outros Estados europeus. E até inventaram, e era de novo mentira, que eram os custos salariais que comprimiam o crescimento, nem se dando ao esforço de verem que foi com esses custos salariais que se criou emprego como nunca se havia criado em Portugal, chegando a mais de cinco milhões de activos, incluindo imigrantes, que nos procuraram. Do que eles não falavam era dos capitais que despudoradamente usavam o Estado em seu favor e protecção, ou de uma união económica e monetária mal construída, que nos colocou na camisa de onze varas da dependência e do servilismo, perante os países ricos, beneficiando os do euro, que iam promovendo a nossa desgraça.»
Da excelente intervenção de José Reis (a ver na íntegra), em nome do Congresso Democrático das Alternativas, no Jantar Comemorativo dos 39 anos do 25 de Abril, realizado na Cantina Velha da Universidade de Lisboa, no passado dia 19 de Abril.
2 comentários:
Verdade!
Este fenómeno, tão bem orquestrado por um sistema chamado "CAPITALISMO", promoveu o conto do vigário. Sem perceber como,fomos caindo,caindo e enrolados em tentações forçadas ficámos reféns dum sistema tão genialmente criado.
O texto está correcto e bem fundamentado. Sou relativamente jovem, tenho formação superior, e não tenho emprego. Tenho andado a ver trabalhos no estrangeiro mas estes são muito difíceis de arranjar e de qualquer forma isso irá separar-me da minha família e do meu lar. Isto enterrou-me numa depressão para a qual não há terapias nem milagres. Todos os dias penso em por um fim á minha vida e acho que já não vou andar cá muito mais tempo. Após vários anos a sofrer e sem soluções, obrigado governo de Portugal por me teres destruído a vida e os sonhos. Não sou apenas eu que vou por um fim á vida. Muitos o fizeram e outros o farão. Não se consegue ser forte eternamente e sofrer assim tanto. Da minha parte já não aguento mais, mas desejo que para todos vós que ficam neste mundo, que esta tragédia em Portugal sirva finalmente para que o futuro dos vosso filhos seja melhor....
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