quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

A crise e os erros da Europa II

Se a estes pilares juntarmos a fragmentação nacional dos regimes fiscais, da legislação laboral ou da política social, cujo grau de harmonização continuará a ser diminuto ou mesmo inexistente, facilmente se entende como a integração europeia tem criado incentivos que orientam perversamente as políticas públicas nacionais no sentido da erosão dos direitos sociais ou laborais, bem como da fragilização da justiça dos sistemas fiscais. Dos actuais projectos de desregulamentação das legislações laborais nacionais, apoiados pela Comissão, até aos sucessivos cortes nos impostos que oneram os grupos sociais mais privilegiados, aos estados, sobretudo aos mais pequenos como Portugal, parece restar pouco mais do que procurar «seduzir» os capitais, cuja mobilidade o processo de integração tem feito tudo para promover, ou então procurar sair da crise através da promoção das exportações por via da compressão dos custos relativos do trabalho. Como todos os outros países tendem a fazer o mesmo, num processo descoordenado, o resultado é perverso: um mercado interno europeu desnecessariamente contraído por uma orientação de política que supostamente o deveria estimular.

Os padrões de desigualdade social e regional «anglo-saxónicos» são um dos resultados deste processo. Os problemas de desemprego são outro. Estes últimos têm a sua origem não na suposta «rigidez do mercado de trabalho» europeu, mas sim na rigidez de uma ortodoxia económica anti-keynesiana que nega à Europa aquilo que poderia ser um dos seus grandes trunfos: constituir um espaço ideal, porque relativamente autónomo em relação às forças da globalização, para a coordenação de políticas económicas anti-cíclicas de relançamento económico e de geração de emprego, como parte de um processo mais vasto de acumulação de forças para proteger os serviços públicos da lógica do mercado e para contrariar deliberadamente os mecanismos mercantis de polarização.

Foi por isso que mais de trezentos economistas europeus apresentaram recentemente um detalhado documento onde criticam o novo Tratado por continuar a ter marca neoliberal que corrói o modelo social europeu e onde propõem uma política económica alternativa com soluções concretas para os problemas da Europa. Porque não são os idealismos jurídicos, que se agarram a uma carta de direitos vazia e a umas vagas referências à «economia social de mercado» e aos serviços de interesse geral, que podem contrariar as tendências fortes que nos estão a levar a um modelo de capitalismo falhado.

Nota: estas duas postas foram publicadas em artigo no Público (24/12/2007).

1 comentário:

Anónimo disse...

xiiiii...sou muito bom!!