As sondagens da UE têm
registado um crescente cepticismo dos cidadãos relativamente ao que se
convencionou chamar o "projecto europeu". As políticas adoptadas
desde 2010 apenas estenderam à periferia o descontentamento que em 2005 já
tinha levado à rejeição do Tratado Constitucional no centro da zona euro. A
verdade é que o modelo de crescimento pelas exportações no centro, com salários
estagnados, dependeu em boa parte do financiamento que concedeu à periferia,
onde alimentou um crescimento pelo crédito que estava condenado a terminar mal.
Hoje, os dirigentes políticos do centro culpam a periferia pela sua sorte como
se não tivessem responsabilidades nesta crise. Mais, através do "apoio
financeiro" da troika, resgataram a dívida da periferia aos seus bancos e,
invocando o seu estatuto de credores, preparam-se para impor às periferias um
modelo de sociedade neoliberal sem qualquer legitimidade democrática. Afinal, o
"projecto europeu" conduziu à divergência económica, ao contrário do
que prometia.
É também preciso dizer
que o "projecto europeu" não promoveu a fraternidade europeia. Hoje,
o ressentimento entre europeus cresce porque o desastre social imposto à
periferia, como punição pelo seu "despesismo", foi concebido nos
corredores do poder do centro da zona euro. Nesta, o desemprego é o mais
elevado de sempre, tem um nível de Grande Depressão nas periferias, e empurra
boa parte das economias para a deflação. É caso para dizer que o "projecto
europeu" se virou contra os europeus, lançou-os uns contra os outros e
estimulou a xenofobia. Dado que uma parte importante das classes baixas deixou
de se identificar com as esquerdas, a grave crise que vivemos também é uma
crise política. É uma crise das democracias europeias.
Por outro lado, é preciso
lembrar que a paz na Europa se ficou a dever muito mais ao poder de dissuasão
nuclear que a Grã-Bretanha e a França adquiriram, ao lado dos EUA, contra a
URSS, do que aos méritos da CEE, depois UE, como força de paz. Aliás, como bem
recorda Jacques Sapir ("Sortir de l'Euro"), "a UE foi causadora
de conflito quando precipitou a desintegração da ex-Jugoslávia e a guerra civil
daí decorrente. [...] A oferta de um plano de estabilização [à Eslovénia e à
Croácia], cujos efeitos seriam desigualmente distribuídos pelas Repúblicas da
Jugoslávia, atiçou a oposição entre a Croácia e a Sérvia. E foi a perspectiva
de uma rápida adesão à UE que convenceu os dirigentes eslovenos e croatas a
provocarem a secessão. O mesmo fenómeno está hoje em curso na Ucrânia."
Finalmente, se ainda há
quem fale da UE, e do euro em particular, como protecção contra as crises
financeiras é porque tem memória muito curta. A globalização financeira, de que
a UE se tornou um bastião, permitiu o rápido contagio da crise de 2007-8
iniciada nos EUA e, dada a aberração institucional da zona euro, gerou uma
crise de dívida pública que mascarou uma gravíssima crise de dívida privada, já
existente. Ambas estão longe de terem sido resolvidas.
Com um Banco Central sem
tutela política, e com um governo económico que invoca uma legitimidade
tecnocrática para ocultar o domínio dos países do centro, o projecto
ordoliberal consolidou-se: submeteu as escolhas dos eleitorados à ideologia
ordoliberal dos Tratados e das directivas que o Tribunal de Justiça fará
cumprir. Ignorar o erro da criação da moeda única e a natureza antidemocrática
do actual "governo económico", fingindo que estamos a eleger o
presidente da Comissão Europeia, só prolonga uma farsa insustentável.
Como alternativa, propor
um Estado europeu, pós-Estados democráticos, quando evidentemente não há um
povo europeu, revela uma trágica preferência pela engenharia social e,
sobretudo, deixa à vista uma grande insensibilidade à urgência em pôr fim ao
desastre que estamos a viver. Os democratas não podem ignorar que os Estados do
centro rejeitam uma União de transferências e que os da periferia querem
continuar a fazer escolhas genuínas. Também por isso, no dia 25 de Maio é
preciso votar contra a utopia federalista das elites europeias.
(O meu artigo no jornal
i)
8 comentários:
Também voto contra o projeto federalista das elites económicas europeias. E das suas coberturas, chamemos-lhes ingénuas, à esquerda. Não contribuo para o peditório da manutenção de Portugal no euro.
É lamentável andar envergonhadamente a dizer que "entre a manutenção do euro ou a defesa do Estado social escolheríamos o Estado social", para depois escolher, de facto, o euro.
Ou será que mais de uma década não chegou para tirar conclusões? Será preciso levar a destruição do Estado social até ao fim para concluir depois que, afinal, devíamos ter saído do euro? Depois é tarde.
Está mesmo muito certo: ou se defende o Estado social ou se defende o euro. Só que a escolha é hoje, agora, não quando já só sobrar o segundo.
Quem defende a manutenção do euro é cúmplice do projeto antidemocrático das elites económicas europeias. Uns por natureza, outros por interesse, outros por convicção, outros por ingenuidade, outros por desatenção, outros por burrice.
Que os partidos da troika assim procedam nada tem de surpreendente, é da sua natureza, do seu interesse ou da sua convicção.
E o Bloco? É por ingenuidade, por desatenção ou por burrice?
Pois é, amigos. O dilema está muito bem formulado: ou Estado social ou euro. Só que a escolha é hoje, já. É hoje que se trava o combate. É hoje que é preciso estar do lado certo.
Sair do euro para obter a manutenção do estado social(como hoje os conhecemos)é um dos mais exóticos delírios, numa época em que delirar é o exercício mais vulgar!
Fazendo da política a arte da fantasia - não, como lhe compete a arte do possível - traz para a democracia um sentido que ultrapassa a demagogia para se tornar lixo mediático de que o cidadão razoávelmente se alheia.
O Bloco, está enredado nos seus nós. E é pena, porque também tem por lá gente boa e que quer uma outra sociedade (a par dos "Coxinhas" - para usar esta expressão transatlântica - e das Barbie, que não há só aquela que foi à Convenção, naturalmente). O problema é que não se poder ao mesmo tempo Deus e o Diabo. Na verdad,e bem vistas as coisas, talvez essa malta boa do Bloco - repito e insisto: que os há por lá, de facto, venha a encontrar outros espaços de projecto e luta social e política, que não são casas assombradas nem têm papões escondidos atrás das portas.
A crise económica presente, limita-se a ser produto da globalização implementada pelo capital.
A captura dos centros de decisão política,
através de "capachos narcisistas e convencidos de pertença a casta superior",
visando legitimar:
a circulação de capitais e o regabofe da engenharia financeira,
os derivados e afins imaginativos,
as propaladas virtuosas economias de mercado,
...etc...etc...
subvertendo a Democracia...
implementam o protecionismo dos mais fortes!
"Com um Banco Central sem tutela política..." ????
Admira-me que aceite e contribua para esta ilusão. O facto de os seus administradores serem plenipotenciários não retira o caracter eminentemente politico ao BCE.
Em verdade, grande parte dos problemas da economia portuguesa neste século, derivam precisamente da política desenvolvida pelo BCE.
Não existe nenhuma "aberração institucional do euro". Aberração é julgarmos que a política monetária (e cambial) definida no âmbito duma instância como o BCE alguma vez deixaria de ponderar a força dos países que o integram.
A persistência, atabalhoada e não fundamentada, do euro como caminho único, é um dos mais exóticos delírios, numa época em que delirar não é de todo o exercício mais vulgar
Há neste pulsar algo mais profundo e mais "substancial"
Fazendo da política a arte da manipulação e da fraude totalitáira - traz para a democracia um sentido que ultrapassa a demagogia para se tornar não só lixo mediático como também um atentado à cidadania e à inteligência dos cidadãos
O que se pretende também é que o vulgar mortal se alheie ( razoável ou não razoavelmente) e para isso os discursos a roçar a idiotia, a má-fé e profundamente ideológicos de passos,portas, luís e cavaco são o complemento óbvio do cerco mediático infernal que nos rodeia.
De
O nosso karma é levar com os disparates do José. ! temos de ter paciência. Afinal, se até Deus lhe perdoa por ele não saber o que diz.
Mas ler tanto disparate, convenhamos que farta um bocadito.'
Anónimo, se não gosta tem bom remédio: não leia. Vai ver que o seu dia melhora logo.
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