segunda-feira, 12 de maio de 2014

O primado da economia política

Li já não sei onde um especialista em comunicação norte-americano que aconselhava mais ou menos isto: diz o que tens a dizer uma vez e outra e outra e outra e quando estiveres cansado de o dizer é quando as pessoas começam a prestar atenção pela primeira vez. Bom, aqui vai então uma vez mais, que eu e outros, neste caso Costas Lapavitsas, ainda não nos cansámos de dizer isto: demasiadas esquerdas europeias por essa Europa fora, entretidas com manifestos europeístas, não conseguem dialogar com, e capitalizar, o descontentamento popular cada vez mais eurocéptico, oferecendo assim à extrema-direita uma oportunidade.

Curiosamente, a partir dos anos trinta, a esquerda que resistiu e venceu foi aquela que conseguiu disputar a definição do interesse da comunidade nacional. Isto mesmo é indicado pela história do socialismo no século XX, a história do “primado da política” de Sheri Berman. Foca, entre outros, o caso da Suécia, onde os social-democratas tornaram sua a formulação oriunda da direita nacionalista - Suécia, “a casa do povo” -, dando-lhe um cunho ao serviço da expansão igualitária liberdades e da reforma social criadora de instituições efectivamente partilhadas, num quadro de uma certa autonomia no campo da política económica, claro.

Já que falei da Suécia, aproveito para fazer um ponto indispensável: toda a política social-democrata bem-sucedida assentou na inscrição no capitalismo de mecanismos de coordenação que resolveram vários problemas de acção colectiva gerados pelo atomismo mercantil por via da acção robusta do Estado e da negociação colectiva por este promovida: das falhas de mercado mais tradicionais à compressão das desigualdades, passando pela estabilidade macroeconómica, em especial a que está relacionada com a balança corrente, impedindo a acumulação de défices criadores de dependências externas. Isto pressupôs a disponibilidade de uma panóplia de instrumentos de política pública, económica e de reconfiguração institucional: por exemplo, a negociação salarial centralizada entre sindicatos e patrões, para lá de reduzir as desigualdades, ajuda a garantir que o crescimento dos salários acompanha a produtividade e que a procura interna é compatível com a necessária competitividade externa. Alguém com o mínimo de realismo, acha que é possível replicar isto à escala europeia?

Bom, voltando a Lapavitsas. Ele faz duas propostas para uma alternativa capaz: deixar de escavar os buracos do euro e do federalismo, trocando-os por maior margem de manobra nacional. Tudo em nome de um “eurocepticismo progressista”. É mesmo disto que precisamos para evitar isto:

5 comentários:

jvcosta disse...

Boa. Partilhei no Facebook.

Anónimo disse...

O mais triste desta campanha é ver a Marisa Matias caladinha sobre o euro, como se fosse possível fazer uma campanha destas sem falar nisto a sério. Pior, a defender, por omissão, a permanência no euro. Depois admira-se dos resultados.

Anónimo disse...

Nada disto é discutido na campanha para as Europeias porque os partidos políticos na oposição (hoje PS, BE e PCP, amanhã PSD e CDS) insistem em as menorizar tentando aproveitá-las para o combate interno (governo). Ainda não perceberam que os governos aprenderam a relativizar a interpretação interna dos resultados e não mudarão "uma palha" por causa disso.

Aleixo disse...

Lá está a tal história, dos representantes acharem que são...
"os protagonistas"!

Podem lá dizer o que quiserem mas, se julgam que decidem por mim...

"tirem o cavalinho da chuva"!

Uma pessoa, um voto!

Sejam quais forem as questões em causa,

a Esquerda terá aceitar ( ...e concretizar!)

a vontade da maioria!

Se os protagonistas acham que a maioria está errada...

CONVENÇAM-NA!

Impor??? Era o que faltava!

Nota:

Depois digam, que a direita é populista!

( Também gostava que os ditos "protagonistas", explicassem o que é isso, de populista!

Ás tantas... é a vontade do POVO.

...CONVEMÇAM-NO!!! )

Duarte Gonçalves disse...

Prezo muito não estar sozinho no euro-realismo progressista. Infelizmente, a busca do mito salvífico que vem de fora, típica da cultura nacional, continua a fazer parte das ideias de muitos socialistas democráticos.

O grande óbice para a sua credibilidade é ainda a ausência de um plano de desenvolvimento político, económico e social capaz de fornecer um rumo ao país e suportar a turbulência inicial que determinadas opções encetariam/encetarão. É aí que vale a pena investir agora.