Os debates em público e privado acerca dos acontecimentos no Reino Unido têm sido muito interessantes. Todos estão, julgo eu, genuinamente interessados em entender e interpretar as causas do que se passa (ou passou) - seja para melhor reprimir, para apoiar (na convicção, ingénua a muitos níveis, de que estamos ou estávamos perante a semente de uma primavera árabe em versão europeia) ou para aduzir como prova no contexto de debates políticos mais amplos (neoliberalismo, multiculturalismo, consumismo, racismo institucionalizado e outros, conforme as inclinações). Nestes termos tão gerais, penso que será pacífico dizer que isto se aplica tanto às interpretações extraordinariamente simplistas (e, vão-me desculpar, de conteúdo analítico nulo ou quase) que temos visto, por exemplo, aqui, aqui e aqui, como também às leituras de conteúdo analítico mais elaborado (concordando-se ou não) que têm sido publicadas, mais uma vez por exemplo, aqui, aqui ou, gostaria eu de pensar, aqui.
Neste post, estou sobretudo interessado, não em lançar mais pistas para a discussão acerca das causas dos motins, mas em lançar algumas para uma meta-discussão acerca da interpretação de acontecimentos históricos. A que se deve o facto de, como diz um artigo do The Guardian, cada um “ver aquilo que quer ver” nos motins? Porque não é possível qualquer tipo de acordo em relação à interpretação dos acontecimentos e porque é que as discussões têm sido tão acesas? Na minha opinião, isso deve-se a quatro características principais da interpretação de acontecimentos históricos:
1) a tendência para o maniqueísmo e para a polarização a contrario: existe uma tendência, quase diria ‘natural’, para nos sentirmos desconfortáveis enquanto não definimos a nossa adesão ou rejeição em relação a um determinado acontecimento ou posição (mesmo quando, como veremos a seguir, esses acontecimentos são contraditórios e essas posições são diversas internamente). E essa definição tem normalmente lugar de uma forma maniqueísta e polarizada: sentimo-nos obrigados a decidir quem são para nós os bons e os maus – seja em Londres, na Líbia ou no Afeganistão –, sendo que os bons, à falta de melhor, são o inimigo do inimigo, ou os menos maus. Porém, o mundo fora dos filmes de acção e da banda desenhada não está dividido em bons e maus, mas em indivíduos e grupos com motivações e objectivos diversos e justificações mais ou menos éticas para as suas acções. Podemos concordar mais ou menos com essas causas e essas justificações, mas esquecemo-nos muitas vezes que é possível serem todos 'bons', serem todos 'maus' ou, mais habitualmente, serem todos 'cinzentos' e não sermos obrigados a rejeitar ou aderir incondicionalmente a nenhuma das partes em contenda.
2) o carácter intrinsecamente hipotético das proposições causais e a ausência de contrafactual: a qualquer acontecimento podem ser atribuídas causas (próximas ou últimas), ou seja, factores anteriores julgados suficientes e/ou necessários para provocar os acontecimentos em questão. O problema é que, não sendo possível recorrer ao contrafactual, o estabelecimento desses factores é intrinseca e insuperavelmente hipotético, sejam essas hipóteses convincentes ou risíveis. No caso dos motins, estamos a falar do que motivou cada um dos participantes a protestar, pilhar e/ou destruir – motivações que, a título individual, são obviamente diversas, por mais que possam gravitar em torno de vários eixos comuns. É por isso possível encontrar declarações de participantes nos motins e observadores próximos que os atribuem tanto a motivações rasteiras como a nobres motivações políticas. Quão convincente é o recurso a declarações isoladas para o estabelecimento de relações causais? Na minha opinião, muito pouco, precisamente porque sabemos que as motivações são diversas. Para além disso, qualquer tentativa de análise que procure ser minimamente sofisticada deve procurar ir além da análise textual das declarações individuais e procurar explicar o que está na origem das motivações para a acção, tendo aliás em conta que entre as causas mais profundas e as declarações de cada actor existem dois filtros: o da consciencialização do próprio actor e o da sua disponibilidade para a transmitir de forma fidedigna aos interlocutores (ambos os quais implicam distorção). (continua aqui)
3 comentários:
will notice a continual stream of criticism from MMT (modern monetary theory) types, who insist that deficits are never a problem as long as you have your own currency ...
ou marxistas económicos de vistas curtas
acho ...deixa lá...
vocês sairam dos cursos de 85 ou dos da geração rasca?
é que isto mais parece dos cursos de 73 ou 77
ou mesmo do famoso Instituto de Estudos Económicos Bento de Jesus Caraça
que felizmente durou pouco
infelizmente a Universidade Criada por decreto de Marcello em 73
tomou conta dele em 79 ou 80
para a transmitir de forma fidedigna aos interlocutores (ambos os quais implicam distorção). (continua aqui)
pus aqui
para nãa atrapalhar ali
de quelque modo blogues económicos têm poucos leitores
Preferível qualquer marxista económico
do que um ungido nas tetas da escola económica de Chicago
e ainda por cima com laivos de marcelista(perdão de marcellista,como o pedante gosta)
Enviar um comentário