quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Péssimo acordo


O acordo alcançado esta madrugada pelos líderes da zona euro vai de encontro às piores expectativas. Vamos por partes.

1) Foi anunciado o reforço do Fundo Europeu de Estabilização Financeira para um bilião de euros. No entanto, este reforço será feito através da sua alavancagem, ou seja, através do crédito angariado pelo próprio fundo. Os Estados europeus só se comprometem com uma parte do seu capital e as suas responsabilidades estarão limitadas à contribuição inicial. Não existe qualquer garantia mutualizada da dívida, como aconteceria no caso das euro-obrigações. O funcionamento deste fundo ainda não é claro, mas a confiança na sua capacidade em ajudar um dos grandes países (Espanha ou Itália) já está comprometida, pois estará organizado em diferentes "tranches", com riscos diferentes, uma vez que só uma parte está realmente garantida. A necessidade de envolvimento de países exteriores à Zona Euro, caso da China, é bizantina…

2) A anunciada reestruturação da dívida grega, que muitos erroneamente têm interpretado como um perdão de 50% da dívida, é o exemplo acabado do que temos definido neste blogue como uma reestruturação liderada pelos credores, de acordo com os seus interesses. A banca privada, voluntariamente, desconta 50% da dívida que detém, mas consegue um mecanismo de compensação europeu, superior a um terço das perdas assumidas. O problema é que o impacto no todo da dívida grega é pequeno. O relatório secreto da troika apontava para um impacto de cerca de 20% do PIB em dois anos, isto numa dívida de 160% do PIB. Os números anunciados de 120% do PIB em 2020, já de si insustentáveis, partem de pressupostos de crescimento económico (2% a 3%) e superávites primários orçamentais (mais de 4% do PIB), entre 2014 e 2020, completamente irrealistas. Não levam em conta quer o défice externo da economia grega (hoje ainda à volta dos 8%), a que corresponde necessariamente um aumento do endividamento público ou privado (ver os nossos posts sobre balanços sectoriais), quer a composição da dívida grega (como pode um país crescer num contexto em que o Estado arrecada mais receitas do que despesas na ordem dos 4% do PIB, que são mais do que transferidos para o exterior sob a forma de pagamento de juros). Estes objectivos nunca serão alcançados. Esta reestruturação só serve para proteger a banca, adiando o inevitável.

3) Foi anunciada nova ronda de austeridade europeia, seja através do compromisso italiano, seja já o aviso para a necessidade de novas medidas de austeridade em Portugal. Portanto, teremos mercados externos deprimidos e mercado interno ainda mais contraído. Juntar crise à crise.

4) Finalmente, naquilo que é estrutural nesta crise, ou seja, os desequilíbrios externos dentro da zona euro e a necessidade de uma estratégia de crescimento económico articulada, nada é dito ou feito. Esta não é uma crise da dívida pública. Esta é uma crise do euro.

7 comentários:

Tiago Santos disse...

A melhor forma de pôr em causa que se trate de um perdão da dívida é ver as cotações bolsistas dos bancos europeus a subir em flecha...

O Portugal Bipolar disse...

Ontem em conversa com a minha fofa fiz a seguinte afirmação:
-Vais ver…vão aumentar o FEEF em (x) milhões e vão informar os mercados que está tudo bem, vais ouvir falar de 1 BASUCA como falaram em Junho/Julho quando o FEEF passou a dispor de 400 mil milhões!


Na altura como agora, os mercados acalmaram, as acções subiram e durante 2 ou 3 semanas a coisa até melhorou.
E depois?


Bem, depois chegarão novamente as dúvidas e volta tudo ao mesmo.
Do pouco que lí sobre o assunto julgo que o FEEF foi reforçado em mais 600 mil milhões, a juntar aos 400 mil milhões existentes já temos 1 BILIÃO!

Já tinha saudades de falar em BILIÕES! (isto para quem não sabe, sou eu a ser irónico).
E a COISA vai correr bem?

Vai!
Até final de Novembro!

Em Dezembro andaremos a falar de corte de cabelo de mais uns quantos países!
Alguém necessita de ir ao barbeiro?


É que os europeus andam a “DAR” cortes de cabelo de BORLA!
Dava vontade de rir, se o problema não fosse tão grave…

joshua disse...

Não admira que os norte-americanos já o tenham censurado, classificando-o como abaixo das expectativas.

Não é por nada, mas os sinais de engonhar estão dados e nunca mais se sai disto.

Unknown disse...

Esse FEEF afinal é um OFNI (Objecto Financeiro Não Identificado).

É uma lástima a falta de criatividade dos políticos.

Unknown disse...

Os principais resultados da cimeira europeia são os seguintes:
- Perdão de 50% da dívida grega detida por privados.
- Recapitalização da banca.
- Aumento do fundo de resgate financeiro para 1 bilião(?) de €uros.

Na minha opinião estamos perante um problema muito sério. No que toca ao perdão da dívida grega não estamos a dar uma grande prenda aos helénicos. Esta medida tem um potencial negativo muito grande porque por si não é solução, coloca a Grécia na lista negra dos mercado e sem capacidade de financiamento e parece-me sinceramente que são os preparativos para a saída da Grécia do euro.

Sobre os outros pontos, num âmbito geral o meu comentário é de que nada disto chega. Não chega não por ser pouco, embora seja, mas não chega sobretudo por ser errado.

Na minha opinião apenas se criou mais um mecanismo para protelar a situação, ao invés de a resolver. Permite, por exemplo, a compra de dívida directamente aos Estados nos mercados primários e secundários. É, na prática, uma nova linha de crédito para países com dificuldades sem no entanto resolver os motivos pelos quais os Estados chegaram a este ponto, o que significa, infelizmente e sem prazer o digo, que os problemas não acabaram e poderão ainda aumentar.

Se calhar estaria na altura de o BCE funcionar como um verdadeiro Banco Central por oposição a ser um mero agente de regulação da inflação na zona euro, sacrificando tudo para a manter abaixo dos 2% e com o fazê-lo de forma talibanesca e sem compensação, afogar a economia.
Sem crescimento económico todos os problemas estruturais desta união monetária são exponenciados e qualquer tentativa de resolução seguindo mais do mesmo está condenado, evidentemente, ao fracasso.

A saída que apontarão como inevitável e inultrapassável para tudo isto será o quarto ponto que faltou na conclusão da cimeira que esta madrugada terminou:
Federalismo, Governo Europeu e uma "espécie" de plano Marshall.

Acontece que, para concluir, pessoalmente não me revejo num projecto europeu que nasça desta forma e sobretudo com este catastrofismo que parece cada vez mais servir os planos de alguém.

Não me posso rever numa Europa que não vise uma Democracia Económica, uma Democracia Social, com integração dos Povos.

Não me posso rever numa Europa que se sustente no aumento da precariedade, à custa de uma trágica redução dos direitos básicos dos cidadãos com o único objectivo de salvaguarda do capital.

Mas também vai daí nunca ninguém me perguntou qual a Europa que quero e nem sequer, se quero fazer parte.

Como alguém disse hoje:
«É a confirmação daquilo que tínhamos vindo a dizer. Todas as preocupações, esforços e medidas [da zona euro] apontam para continuar a injectar o capital financeiro. Dinheiro dos povos, dos trabalhadores, dos contribuintes para continuar a salvar a banca dos seus desmandos. Esta é a linha central que está ali colocada", disse Jerónimo de Sousa»

E disse muito bem, se forem capazes de ultrapassar o estigma.

PP disse...

onde posso ter acesso a esse relatório secreto do fmi?

M1 rules disse...

Simplex-
Data released by the European Central Bank show that real M1 deposits in Portugal have fallen at an annualised rate of 21pc over the past six months, buckling violently in September.


Portugal appears to have entered a Grecian vortex (ainda não mas ainda há quem tente)and monetary trends have deteriorated sharply in Spain, with a decline of 8.4pc