quarta-feira, 14 de abril de 2010

Melhor que as alternativas, desprendida e necessária (II)



Além de denotar desprendimento, porque implica cedência de poder dos dirigentes para os eleitores, a proposta de PPC é melhor do que o statu quo e as alternativas. Para ser operacional e permitir que os eleitores conheçam os candidatos, esta solução deve ser aplicada em pequenos círculos (5-6 lugares, não mais de 10). Porém, se fosse aplicada em Portugal sem mais, então a proporcionalidade seria comprimida (algo indesejável no caso português: o nível de proporcionalidade já é comparativamente baixo, e os problemas de governabilidade não resultam do sistema eleitoral). Mas, por isso mesmo, no estudo citado propusémos que o voto preferencial fosse aplicado apenas nos círculos de base regional (em média com 6-7 mandatos), num total de cerca de 130 ou 140 lugares; os restantes 89 ou 99 mandatos seriam distribuidos num círculo nacional único e com o sistema de lista fechada e bloqueada, tal como temos hoje. De acordo com os testes que fizémos, este círculo não só permitiria manter a proporcionalidade ao nível actual como permitiria também que as direcções partidárias tivessem uma palavra a dizer na composição das bancadas parlamentares: para garantir determindas valências técnicas e políticas.

Por um lado, face ao sistema misto com círculos uninominais, o voto preferencial tem quatro vantagens. Primeiro, permite preservar o pluralismo nos círculos regionais, logo potencia a proximidade eleitor-eleito e evita a bipolarização que os uninominais poderiam induzir. Segundo, permite julgar e responsabilizar simultaneamente partidos e candidatos, enquanto os uninominais obrigam a optar por uma só hipótese. Terceiro, facilita a “representação descritiva” (das mulheres, das minorias étnicas, etc.). Quarto, evita o redesenho frequente dos círculos para acomodar as variações demográficas. Por outro lado, se é verdade que o voto preferencial pode implicar uma certa redução da disciplina de voto, também é verdade que os estudos mostram que tal não só acontece em níveis aceitáveis, idênticos ao que acontece com as listas fechadas e bloqueadas, como não tem impacto significativo na governabilidade (Lauri Karvonen, “Preferential Voting: Incidence and Effects”, International Political Science Review, Vol. 25, 2, 2004; David Arter, “Preferential List Voting…”, in Democracy in Scandinavia, MUP, 2004). Além disso, obviamente que para que os candidatos/deputados possam ser julgados pelos eleitores, e para que possa haver responsabilização dos primeiros pelos segundos, serão necessárias campanhas mais descentralizadas (para a componente dos círculos regionais) mas tal não implica necessariamente um aumento dos custos das campanhas, antes uma redistribuição dos mesmos.

Por tudo o que foi dito, creio que a proposta de PPC evidencia desprendimento, é melhor do que o statu quo e as alternativas (mas se e só se preservar a proporcionalidade existente) e é necessária (para superar o anacronismo que representa hoje, na Europa, o sistema de listas fechadas e bloqueadas).

Publicado originalmente no Público, 12/4/2010.

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