quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Reformas. Que reformas?

«Eu não acredito em reformas, quando se está em democracia [pausa]. Quando não se está em democracia é outra conversa, eu digo como é que é e faz-se [pausa]. E até não sei se a certa altura não é bom haver seis meses sem democracia, mete-se tudo na ordem e depois então venha a democracia». Manuela Ferreira Leite num reparo bem revelador. Autoritarismo neoliberal. Esta na génese da coisa. Afinal de contas, tudo começou no Chile.

Entretanto, vale a pena ler Vital Moreira para percebermos o sentido que a expressão «reformas» tem hoje para a chamada esquerda moderna: «Que diriam Sá Carneiro e Cavaco Silva, que ficaram para a história justamente pelas suas reformas e que não hesitaram em enfrentar corporações, sem precisarem de ‘suspender a democracia’ para isso». O desgraçado bloco central neoliberal. São as «reformas». Sem mais. Agora chegaram ao núcleo duro das funções do Estado. Trucidar os profissionais é a palavra de ordem.

Para a esquerda socialista a expressão reformas tem obviamente outro sentido: desmercadorização (sobre isto, aconselho vivamente o artigo de Ana Drago que saiu no último número do Le Monde Diplomatique), expansão da esfera pública, criação de um «Estado Estratega» (Manuel Alegre), aumento da participação dos profissionais e dos cidadãos no processo de provisão. Reformas socialistas.

8 comentários:

Pedro Sá disse...

É evidente que qualquer reforma pública que atinja sectores profissionais tenha que vos desagradar, atento que por vossa vontade qual governo qual quê, vocês notoriamente querem é autogestão pelos "movimentos sociais"...

Anónimo disse...

O alargamento do espaço público é compatível com um governo eficaz. Os movimentos sociais são compatíveis com a governabilidade, ao contrário do que pensa o outro comentarista, se ele me permite o comentário ao comentário. As reformas apresentadas são exequíveis e realistas. Precisamos aliás de um outro realismo. O vigente merece outros nomes - conformismo, tacticismo - mais compatíveis com a inteligência instrumental.

Anónimo disse...

Prós incrédulos nas capacidades de participação pública, quando as condiçóes existem para que se faça, recomenda-se o doc "Rock Soup" de Lech Kowalski - indigentes participam na discussão, sobre a utilização colectiva de uma parcela de terreno no centro da grande urbe americana, e ganharam.

AlfmaniaK disse...

Giro, giro seria haver, em concreto, reformas (entenda-se como quiser - a ambiguidade a isto permite). Havendo reformas já se pode promiscuir à vontade alheia, os conceitos, a aplicação ou não, o valor, o que seja... mas haja reformas!
Enfim, politiquices de caca, mas com razão, pois claro!

António Maia disse...

Sá Carneiro fez o quê? em quanto tempo? é que ele foi governo uns seis ou sete meses, só se reformou a partido dele, talvez, visto que uma parte dos fundadores vieram do partido fascista Acção Nacional Popular.
Sá Carneiro é um mito para o ppd/psd, tenho algum lamento pelo avençado Vital Moreira
A Manela disse aquilo que muita gente da área dos governos pensa. O que é realmente o poder da burguesia? A ditadura de uma classe sobre a outra, certo?

Venerando-os

João Dias disse...

A reforma na óptica do incapaz bloco central é a colisão com os seus parceiros. Curiosamente, faça-se um retrato de alguns dos sectores que já vimos sair à rua: precários, professores, enfermeiros, funcionários públicos...são estes os verdadeiros privilegiados?

Esta visão de choque com as classes profissionais representa uma manifesta incapacidade do poder político. Legitimamos democraticamente governos para estes criem as condições sociais e políticas para que a sociedade coopere entre si da forma mais solidária possível. A diplomacia, o diálogo e negociação são os meios que o governo dispõe para legitimar as suas decisões. Se não se consegue mobilizar a massa humana no sentido da nossa visão, então é porque somos maus gestores, quer seja pela incapacidade de mobilizar quer seja pelo simples facto de a visão ser má.

Em retrospectiva, já se percebia que não vinha boa reforma para a educação. Relembro que a Ministra abriu as hostilidades generalizando o mau profissionalismo na classe docente (erro de gestão básico: hostilizar dependentes). O objectivo era simples, criar a guerra social aonde se discutem as migalhas. Semelhante postura foi adoptada para a função pública em geral.

Se os funcionários do sector privado pensam que vão ganhar alguma coisa com a compressão salarial da função pública...então meus amigos, estão redondamente enganados. Para esses o modelo é o da competitividade com a China, ou seja, mais compressão salarial.
Além disso a sociedade não pode ser feita distribuindo o "mal pelas aldeias" tem de ir às "cidades".

António Maia disse...

Veja-se o TODO!
Muito bem João Dias, análise correcta!

Como lamentei a maioria absoluta deste partido, porque previ o que se está a passar, mas com essa oposição... quero lembrar que têm sido os professores a dirigirem os sindicatos nesta luta, mas dizia eu, com esta oposição ainda vamos levar com mais quatro anos de ditadura parlamentar.
Como foi possível ter sido o P"S" a impedir que o Dias Loureiro se justificasse no parlamento, quando ainda por cima esse acusado criminoso é conselheiro do Estado, cá está a classe a defender os seus pares, não é verdade que a Luta de classes existe? mais uma prova, não é? são todos o mesmo!

Venerando-os

Anónimo disse...

João,
com todo o respeito, mas o que tu propôes não é mais do que reformas para sustentar o sistema capitalista. És tal como o vital moreira um reformista (com todo o respeito), caso o bloco tivesse no governo iria ver-te a escrever maravilhas das "reformas" realizadas pelo governo do BE.
Sejamos claros, um socialista, não apresenta reformas. Faz revoluções.
Quem apresenta reformas são os reformistas, sendo estes noeliberais ou keynesianos ou institucionalistas. Não importa o nome, todas estas correntes não questionam o sistema capitalista, nem o pretendem questionar mas apenas reformar. Com isto não digo que as referidas correntes são todas a mesma coisa, não é verdade. Entre as tres há diferenças, mas há um grande consenso também que é em relação ao sistema(capitalista) que defendem.

Abraço