sábado, 7 de dezembro de 2019

A estranha queda do ensino privado no PISA 2018

Um dos dados mais surpreendentes do recente relatório PISA consiste na quebra, muito significativa, dos resultados do ensino privado em Portugal entre 2015 e 2018. Em média, os alunos do privado descem de 541 para 493 (-48 pontos), aproximando-se assim do valor registado em 2018 pelo ensino público (492), que por sua vez diminui apenas 2 pontos face a 2015. A queda do ensino privado verifica-se, além disso, em todas as dimensões de competências avaliadas: -42 pontos na leitura; -46 a matemática e -55 em literacia científica (quando no ensino público as variações são, respetivamente, de -3, +4 e -6 pontos). Em suma, os alunos do ensino privado revelam, entre 2015 e 2018, uma descida muito acentuada do nível de competências adquiridas nos domínios considerados.


A estranheza que esta evolução suscita é dupla: não só entre 2000 e 2015 o ensino privado sempre assumiu valores bastante acima dos registados no ensino público (ao contrário do que sucede em 2018), como o nível de competências dos seus alunos chegou a estar acima da média do privado na OCDE (entre 2009 e 2015), para se situar agora bem abaixo do valor obtido a essa escala. Ao contrário, de facto, do que sucede com o ensino público português, que não só tem vindo a melhorar consistentemente no PISA desde 2000, como supera a média da OCDE desde 2015.

A alteração relativa do perfil socioeconómico dos alunos do privado, entre 2015 e 2018, é uma das possíveis hipóteses explicativas desta evolução recente. E, de facto, alguns indicadores sugerem uma mudança nesse sentido, mantendo-se contudo a vantagem comparativa do perfil desses alunos face aos que frequentam a escola pública (que obtém, desse ponto de vista, resultados no PISA comparativamente melhores que os alunos do privado, em 2018).


Uma outra hipótese explicativa consiste em admitir que se tenham intensificado, em muitas escolas privadas, as lógicas de «preparação intensiva para os exames», em linha com a sobrevalorização desta modalidade de avaliação durante o consulado de Nuno Crato. Ou seja, de lógicas que em certa medida favorecem a obtenção de bons resultados nos exames (como os rankings sugerem, apesar das diferenças de perfil socioeconómico), mas que comportam o risco de uma menor preparação dos alunos quando se trata de avaliar competências (que é o que o PISA faz). Contudo, tal como a anterior, também esta hipótese parece ser curta para explicar a dimensão do descalabro. Uma coisa é todavia certa: a tese, há muito em voga, da suposta supremacia do ensino privado face à escola pública parece ter sofrido, com o PISA de 2018, um novo e forte abalo.

11 comentários:

Jose disse...

O mistério é nenhum.

Acabada a subsidiação do ensino privado, os alunos que garantem boa aprendizagem migram para o público; os calinos ficam no privado com acrescido sacrifício das famílias.
Excepção à regra serão os casos dos candidatos a cursos superiores de difícil acesso.

Anónimo disse...

"os calinos ficam no privado"...
Mais uma prova da degenerescência das elites endinheiradas do país, que são as que podem suportar um ensino privado desmamado dos subsídios injustificáveis.

Jose disse...

A esquerdalhada baba-se a imaginar que quem tem dinheiro e prescinde da mama estatal é uma qualquer aberração próxima da degenerescência genética.
Os ridículos tudo fazem para que os calinos da órbita pública se sintam confortáveis com o seu destino de coitadinhos a serem cuidados pelos impostos dos que se querem libertos desse destino.

Anónimo disse...

Fácil, o dinheiro é recursos que estavam a ser usados no ensino privado foram canalizados para o ensino público. Bom trabalho do ministro da educação que tanto ouviu dos amarelhinhos.

Anónimo disse...

É inacreditável como Nuno Serra deixa um fascista como o «Jose» comentar nos seus artigos. Cumplicidade ou amizade?

Nuno Serra disse...

O caro anónimo não tem ideia (nem poderia ter, é certo) dos comentários do leitor José (e de outros leitores) que, por se cingirem ao insulto gratuito e não conterem o menor vestígio de argumento, não são publicados.
É certo que vários comentários, do José, ou de outros leitores nos seus antípodas repito, andam no limiar desse critério e acabam por ser publicados. E todos ganharíamos de facto em esgrimir argumentos de forma mais objetiva e com respeito por quem pensa de modo diferente, sem recurso ao insulto nem à censura.

Jose disse...

« comentários do leitor José (e de outros leitores) que, por se cingirem ao insulto gratuito»

Para começar não insulto ninguém.
E se de longe a longe, saturado que lhe suportem dirigir-me calunias e insultos, me limito a qualificar o Cuco pelo que vale, sempre cuidam de não me publicar.

Quanto aos apelos à censura, noto com agrado que eles se vem multiplicando: isso significa que o LdB, sendo de esquerda, não aceita tornar-se um coral de prosélitos.

Anónimo disse...

As mentiras do «Jose»

Não insulta ninguém? O que dirá a Lúcia, no blog do «Manifesto 74»?
O que dirão outros, a quem o inefável «Jose» ataca, denigre e escreve contra, em todos os seus comentários, seja no «Ladrões de Bicicletas» ou no «Manifesto 74».

Geringonço disse...

Não ficaria admirado se o comentador Anónimo, 8 de dezembro de 2019 às 16:04 fosse o multinick Pimentel...

Lowlander disse...

Caro Nuno Serra,
Folgo muito em saber que afinal sempre ha regulacao dos comentarios. Lamentavelmente a metodologia existente parece-me pouco sofisticada e infelizmente ficamos a bracos so com os insucessos para a julgar.

Uma sugestao de gestao dos trolls que vejo em funcionamento com assinalavel sucesso em alguns blogs (estrangeiros principalmente) e a criacao de uma categoria na barra lateral ou um link para onde todos os comentarios que nao contribuem com argumentos relevantes na discussao e cujo teor apenas pretenda causar dispersao da atencao para la do tema dos textos publicados seriam depositados - algo discreto mas visivel.
Tem a vantagem de negar atencao aos trolls, sem recorrer ao acto extremo da censura que obriga vos obriga a ter de exercer um custoso (em termos de tempo pelo menos julgamento daquilo que nao e publicavel). E uma medida menos extrema, e portanto sem necessidade de perder demasiado tempo a fazer julgamentos de valor sobre se comentario A ou B e muito ou pouco insultuoso - o criterio fica mais simples e provavelmente mais objectivo, o comentario ou e acerca do tema do texto e nao e perturbador de uma discussao seria e cordial ou entao e "arrumado" na categoria especial de comentarios.

Veja o exemplo do RealClimate:

http://www.realclimate.org/

Na barra direita tem duas sub-seccoes, o "Bore hole" e o "Crank shaft", os titulos sao trocadilhos a volta da terminologia tecnica em uso na climatologia. Neste blogue assisti a introducao destas medidas de gestao desde o inicio, foram muito eficazes a acabar com a praga dos trolls.

Se a plataforma Blogger nao permite este tipo de coisa podem sempre mudar o Ladroes para uma plataforma que suporte esta solucao, tenho a certeza que com um link nesta morada http todos os vossos leitores leais vos seguiriam noutro sitio. Eu pelo menos seguiria. Fica a sugestao.

Nuno Serra disse...

Caro Vítor Teodoro,

Estive a verificar os dados e continuo a encontrar os valores a partir dos quais foram construídos os gráficos (confirmando as quedas do ensino privado):
- Leitura: https://pisadataexplorer.oecd.org/ide/idepisa/report.aspx?p=1-RMS-1-20183,20153,20123,20093,20063,20033,20003-PVREAD-SC002501-IN3,PRT-MN_MN-Y_J-0-0-37&Lang=1033
- Matemática: https://pisadataexplorer.oecd.org/ide/idepisa/report.aspx?p=1-RMS-1-20183,20153,20123,20093,20063,20033,20003-PVMATH-SC002501-IN3,PRT-MN_MN-Y_J-0-0-37&Lang=1033
- Ciências: https://pisadataexplorer.oecd.org/ide/idepisa/report.aspx?p=1-RMS-1-20183,20153,20123,20093,20063,20033,20003-PVSCIE-SC002501-IN3,PRT-MN_MN-Y_J-0-0-37&Lang=1033

O caminho seguido para chegar aqui, em termos de variável (tipo de escola) foi:
- School composition, SES and organization;
- School type and community;
- Public or private

Não consegui identificar, nas variáveis, o caminho que o Vítor seguiu para obter as tabelas que referencia (no caminho que eu segui só encontro a distinção entre público e privado, com os mesmos valores que encontrei na primeira pesquisa). Noto apenas que as margens de erro - para Portugal - tendem a ser maiores nas tabelas que o Vítor encontrou. Mas não consegui de facto perceber o que leva a resultados distintos.

Cumprimentos,
Nuno Serra