terça-feira, 30 de setembro de 2008

Visão da crise financeira II

Comecemos por onde a actual crise começou. Pelo crédito hipotecário "subprime" e pelo sobreendividamento de muitos trabalhadores vulneráveis nos EUA. Um dado ilustra a conjugação de medíocre crescimento dos rendimentos e de injustiça social, indissociáveis da configuração de capitalismo sob hegemonia da finança de mercado que emergiu nos EUA, a golpes de política, a partir dos anos setenta: entre 1947 e 1973, época de consenso keynesiano, de contra-poderes sindicais fortes e de mercados muito mais limitados e politicamente enquadrados, o rendimento das famílias mais pobres (20% da população) cresceu, em termos reais, aproximadamente 116,1% e o rendimento das famílias mais ricas (20% da população) cresceu 84,8%; entre 1974 e 2004, na chamada "Era de Milton Friedman", esse crescimento foi, respectivamente, de 2,8% e de 63,6%. O resto da minha «visão de esquerda» pode ser lido no Jornal de Negócios. Paulo Pinto Mascarenhas oferece uma «visão de direita». O debate não pode parar.

8 comentários:

Anónimo disse...

"por que é que as taxas de juro baixas nas décadas do consenso keynesiano do pós-guerra não produziram crises financeiras"

Porque o sistema ainda estava a aprender a usar as reservas parciais, cuja taxa de reservas foi sendo sucessivamente diminuida.

Depois nos anos 60, a massa monetária começou a ser aumentada acabando na estagflação dos anos 70, que enterrou (ou devia) para sempre o keynesianismo.

Depois, sempre existiram ciclos e bolhas, mesmo no séc 19, mas a razão foi sempre a mesma: expansão de crédito por criação monetária.

A diferença é que como as pessoas tinham o direito a levantar o ouro subjacente ao contrato (nota ou depósito), levavam a entidade bancária à falência.

João Dias disse...

"Porque o sistema ainda estava a aprender a usar as reservas parciais, cuja taxa de reservas foi sendo sucessivamente diminuida."

O facto das reservas parciais terem diminuído ao longo do tempo, não belisca em nada o facto de ser uma política de regulação anti-cíclica que evita as crises. A taxa de reservas até pode diminuir, se as aplicações financeiras forem feitas com responsabilidade até é desejável que a taxa de reserva seja diminuta, paradoxalmente ao que se possa dizer, se os investimentos forem especulativos e de alto risco, aí sim é que interessa ter elevadas taxas de de reservas. Mas isso, qualquer especulador sabe, que quanto maior é o risco, mais prudente é o investimento. Não será por acaso que são as classes altas que vingam, precisamente porque podem ter uma "taxa de reserva" que os outros não têm.
Num programa da RTPN, o "insuspeito" CEO da Efacec Luís Filipe Pereira mostrou que em momentos de crise, em que o risco era maior, os activos da bolsa representavam uma fatia menor do bolo dos seus investimentos e que a Efacec, dada a crise do momento, iria adiar o seu lançamento na bolsa.


"A diferença é que como as pessoas tinham o direito a levantar o ouro subjacente ao contrato (nota ou depósito), levavam a entidade bancária à falência."

Devia saber, que as reservas de ouro, seja em tempos de crise ou não, nunca cobriram na totalidade o dinheiro dos depositantes.

João Dias disse...

Pessoalmente gostei do artigo de João Rodrigues para o Jornal de Negócios.
É bom ver que existe pluralidade.

Acho que João Rodrigues aproveita o melhor de Keynes, enquanto que para muitos Keynes é um sustento provisório do Capitalismo, para a esquerda pode ser o inicio de uma transformação progressiva. E parece-me fundamental definir a seguinte prioridade, para o Estado controlar o mercado não tem de ter o exclusivo, basta que tenha o seu sector em cada zona estratégica para assim exercer um influência positiva. Se o Estado estiver presente no sector da habitação, na saúde, no ensino, no sector energético, na segurança...o mercado deixa de ditar as regras.

João Dias disse...

Agora conjugue-se a necessidade de estar presente em sectores estratégicos com a venda de 7% das acções do Estado na Galp.

Filipe Melo Sousa disse...

Comecemos por onde a crise começou: na regulação do FED

1) O modelo multiplicador dos bancos, assim como a moeda fiduciária não são credíveis. Os bancos centrais emitem moeda sem ter reservas para tal. Os próprios bancos servem de multiplicador ao emprestar dinheiro que não têm. A verdade é que se todos formos levantar o nosso dinheiro, não estão lá 3% sequer. E se fossemos com esses 3% aos bancos centrais buscar o equivalente em ouro, nem 3% desses 3% (1/ 90.000 do real valor) lá está. Devido a falta de liquidez, o mundo acordou. As injecções de dinheiro servem para prolongar a mentira.

2) Os bancos centrais são muito reguladores e intervencionistas. Gostam de subir e descer o preço do dinheiro, brincando com a vida das pessoas. Os juros nos EUA estavam em 1%, e foram subidos para 5,25% em menos de um ano. É óbvio que esta opção política ia gerar incumprimento por parte das pessoas individadas. Numa primeira fase convida ao endividamento, e de seguida abate-se impiedosamente sobre as pessoas. E a meu ver foi a única razão para a crise do subprime.

3) Existe todo um conjunto de leis que obrigam os bancos a emprestar a quem não tenha garantia. Trata-se das leis Carter, cujo plafond foi agravado pela administração Clinton. A ideia era promover o direito universal ao credito a qualquer pessoa que não oferecesse garantias. Ou seja, esses bancos foram obrigados a conceder emprestimos sem garantias. De seguida a politica de taxas de juro do FED espatifou as contas desses bancos.

4) Para piorar a interferencia na vida privada dos bancos, o governo americano quer nacionalizar os bancos que ajudou a falir com o dinheiro dos contribuintes, e chama a si mais poderes reguladores para poder reparar os disparates que faz.

O debate não pode parar!

L. Rodrigues disse...

"E a meu ver foi a única razão para a crise do subprime".

Ainda bem que temos o Filipe para nos explicar as coisas.

Wyrm disse...

"Comecemos por onde a crise começou: na regulação do FED"


E é toda gente sabe que o FED é uma entidade estatal americana, não é?

Haja pachorra...

Anónimo disse...

"1) O modelo multiplicador dos bancos, assim como a moeda fiduciária não são credíveis."

Alguma proposta alternativa?

"Gostam de subir e descer o preço do dinheiro, brincando com a vida das pessoas."

Brincam assim como nós brincamos ao yo-yo em criança, não é?

"Numa primeira fase convida ao endividamento, e de seguida abate-se impiedosamente sobre as pessoas. E a meu ver foi a única razão para a crise do subprime."

E foi o Estado que com uma arma apontada à cabeça dos bancos que os obrigou a criar os MBS, e já agora com a outra arma apontada às empresas de rating, correcto?

"Ou seja, esses bancos foram obrigados a conceder emprestimos sem garantias"

Com tantas obrigações parece-me que estes bancos não eram privados, que grande embuste!!!

"O debate não pode parar!"

vamos continuar então...