sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Do absurdo, da bazuca


Um banco central pode controlar, se assim escolher, os termos relevantes, em particular as taxas de juro, da dívida pública denominada na moeda que emite. Por isso, é tão importante que o banco central seja por sua vez controlado pela política democrática, a que está no Estado nacional. 

O Banco Central Europeu é um banco de vários Estados, tendo um estatuto pós-nacional e pós-democrático, mas, mesmo assim, é absurdo jornalistas económicos sérios continuarem a repetir que as condições de financiamento do país estão dependentes dos “mercados”. Não estão nada. Estão exclusivamente dependentes da política do BCE. Sempre estiveram, de resto, por acção e omissão.  

Devido à crise, a dívida atinge níveis recorde em percentagem do PIB, mas as taxas de juro nunca foram tão baixas. É o poder do banco central. 

Entretanto, as regras orçamentais foram enviadas para o caixote do lixo da história onde temos de garantir que permanecerão. Há outras coisas, como a moeda única, que terão de ir para o mesmo sítio. O problema é que as regras são hábitos mentais persistentes de quem controla o Ministério das Finanças.

É absolutamente necessário aumentar o investimento público, dados os óbvios efeitos multiplicadores num contexto de crise e, num critério míope, o seu retorno nestas condições financeiras. 

O governo faz um alarido com a intenção de aumentar o investimento público em mais de 20%, passando de 2,5% (cerca de 4,8 mil milhões de euros), em 2020, para 2,9% do PIB (cerca de 6 mil milhões de euros), em 2021. Se esta modestíssima intenção se concretizar, se, reparem, o investimento aproximar-se-ia, em termos nominais, do valor de 2011, 6,1 mil milhões de euros (3,5% do PIB). Muito longe dos níveis de outros tempos, os de convergência.

As regras austeritárias europeias foram as principais responsáveis por um facto infelizmente pouco notado entre nós: desde 2012, o investimento público, que chegou aos níveis mais baixos da UE (em percentagem do PIB), não é sequer suficiente para compensar a natural deterioração do stock de capital público, o que significa que o investimento público líquido tem sido negativo nestes anos. 

O Governo conta com a peculiar “bazuca” europeia, a que representará, se tudo correr como o previsto, umas poucas décimas do PIB nacional em 2021. A “bazuca” serve sobretudo para alimentar a esperança europeísta, sempre concentrada no horizonte de longo prazo, um luxo ideológico para uma elite compradora sem vontade para chegar aos níveis de investimento e sem instrumentos para o planeamento que a situação impõe.

8 comentários:

Anónimo disse...

Toda a razão, salvo na afirmação, demasiado otimista, de que as regras orçamentais foram enviadas para o caixote do lixo da história. Apenas se encontram suspensas e já se anuncia o seu retorno, eventualmente para 2022, na UE.

É verdade que as taxas de juro nunca foram tão baixas. Isso explica que, de acordo com estimado no projeto de orçamento do Estado, o recorde da dívida pública portuguesa, atingido este ano, se acompanhe de uma redução, nominal e relativa, dos juros pagos sobre a dívida pública, em relação ao ano passado.

Para o ano, 2021, prevê-se pagar abaixo de 5,5 mil milhões de euros. 2,6% do PIB, o menor montante de juros, em percentagem, desde o final dos anos 70, em Portugal. Igualado em 1980, 2004 e 2005, mas nestes anos não havia centenas de milhões de euros de restituição, em dividendos e impostos, dos juros que o Estado paga ao Banco de Portugal, pelo volumoso montante de dívida que este conserva, e que em rigor se devem abater àqueles números. No final de 2021 se constatará que há quarenta anos que o Estado não pagava tão pouco (em % do PIB).

A crise é grave e, com as lições que aprenderam da grande depressão desencadeada em 2008, os bancos centrais não hesitam em recorrer agora, quase ilimitadamente, ao financiamento monetário dos défices e das dívidas públicas. Ainda que de modo indireto no caso do BCE, com o pagamento de autênticas “comissões de intermediação” aos bancos e fundos de investimento, que parasitam o circuito, comprando dívida aos estados para a revender ao BCE.

Lamentável é que sejam precisas crises tão graves para a maior compreensão da importância de uma moeda, de um banco central e de uma política monetária ao serviço da recuperação económica e do desenvolvimento de cada povo e país, em lugar das necessidades de acumulação do grande capital transnacionalizado e dos poderosos estados ao seu serviço.

Paulo Marques disse...

Ouvi hoje de um consultor de investimento (parafraseado):

"Os bancos centrais vão manter baixas as taxas de juro."
"As baixas taxas de juro vão manter a inflação baixa."

O mundo muda, se o dissesse há 10 anos, duvido que mantivesse o emprego, tal o a contrariedade face aos livros de economia que estão nas prateleiras com edições novinhas.

Carlos disse...

De bazuca em bazuca, até à fisga final!...

Anónimo disse...

Para evitar o colapso da moeda única, o BCE tem estado, nos últimos 10 anos, a "imprimir" euros (os computadores evitam a rotativa, mas o efeito é o mesmo) e a alimentar os déficits dos estados da zona euro, com aquilo que se designa por quantitative easing (QE), usando os bancos como intermediários e assim distorcer as regras dos tratados, que proíbem o financiamento direto desses mesmos déficits pelo banco central.
Uma monumental mentira, portanto.
O que acaba também por ser engraçado, pois o país mais beneficiado pelo QE, a Alemanha (as compras são feitas em função da contribuição de cada país para o BCE sendo, portanto, a Alemanha o maior contribuinte, o que faz dela o maior beneficiário) está a produzir excedentes há muitos anos.
Pergunta-se: então o que é que os hunos estão a financiar com a dívida que emitem?
Então, se nem nas infraestruturas que se degradam todos os dias (rust never sleeps) eles investem o suficiente.
Outra mentira.
Como a controle da inflação é a principal função de um banco central neoliberal, a taxa de juro tem de ser baixa, pois o aumento do custo do crédito terá reflexos nos preços finais dos bens e serviços, levando ao aumento da inflação.
O que tem estado a acontecer, pois a inflação não tem tendência a subir, mas a baixar (estando já muito aquém do suposto valor ideal de cerca de 2%).
O que leva a desconfiar se a deflação é assim tão má para toda a gente, ou se há quem aproveite com ela.
Pois, lá está: os agiotas...
Mais uma mentirazinha para a coleção...
A bazuka é apenas mais uma mentira.
Nada daquilo é para levar a sério.
Se algum dinheiro chegar, vai chegar tarde e a más horas.
O plano estratégico é demasiado generalista, cheio de boas intenções e sem meios para se impor.
Aquilo exige projetos concretos e os projetos exigem muito trabalho, de gente que sabe, com meios técnicos e humanos capazes de os executar.
Se fosse para fornecer umas máscaras, qualquer vendedor de pipocas estaria em condições de fornecer os bens e serviços que o estado estivesse disposto a comprar.
Mas parece que todas as propostas serão filtradas e sujeitas a escrutínio rigoroso.
Nada de mentiras, agora, meus caros.

Jose disse...

«um facto infelizmente pouco notado entre nós: ... o investimento público, ...»
Infelizmente estava tudo muito entusiasmado com a política de rendimentos e reversões, e com a explosão de tascos e tasquinhas, lojas e lojinhas!

Quanto a lixo, fica por dizer o que se passa quando a moeda do banco central é lixo.

Vitor Correia disse...

Hahaha!...

JE disse...

João pimentel ferreira ri-se, da forma boçal aí em cima expressa. Travestido de vitor correia, o seu riso não deve enganar ninguém. O nosso travesti holandês faz o que faz, mesmo que por vezes use o "carlos" como fisga a ver se passa

Debrucemo-nos antes sobre o texto de JR e de alguns comentários aí em cima expressos.Valem a pena e devem levar a pensar.

E a tirar conclusões

JE disse...

Jose regressa à sua modinha

Ainda sem ocultar aquele ressabiamento histórico pelo facto do lixo infecto, de marca passos coelho/ portas, ter sido corrido e democraticamente corrido.

E jose aparece assim, ainda com as carnes agitadas pelas "reversões" resultantes de um acordo à esquerda, que, se bem que limitadas, deixou a tralha que sonhava com a revanche neste estado


Mas jose persiste noutra questão:" entusiasmado ...com a explosão de tascos e tasquinhas, lojas e lojinhas!"

O toque histriónico ao sabor do ponto de exclamação da ordem, não esconde estes atavismos tão deliciosamente freudianos de jose

E fala jose em lixo...outro lapsus linguae notável