quarta-feira, 26 de junho de 2019

Portugal e os vinte anos do euro em gráficos


Em linha com o artigo anterior, que explica boa parte dos problemas associados à entrada de Portugal no euro, importa olhar para alguns gráficos ilustrativos da evolução do país nos últimos 20 anos (todos os dados utilizados são do INE e do Pordata).

Por um lado, o endividamento externo do país cresceu significativamente neste período, mas ao contrário da tese da indisciplina orçamental dos sucessivos governos, o setor que mais se endividou foi o privado (e, dentro deste, o financeiro), aproveitando a descida das taxas de juro e a redução dos custos de financiamento após a adesão à moeda única. O aumento da dívida externa até à crise de 2007-08 é notório, sendo que esta cresce bastante mais rápido que a dívida pública; a partir deste momento, os efeitos recessivos da crise e do programa de ajustamento da troika (menos atividade económica e emprego, menos receitas fiscais e mais despesas com transferências sociais), bem como a absorção de parte das perdas privadas (através de resgate ou capitalização dos bancos, por exemplo) fizeram disparar a dívida pública para níveis historicamente elevados.


Por outro lado, o desemprego, que antes da entrada no euro era tipicamente baixo no país, começou a aumentar desde a viragem do século, tendo disparado com a crise antes de regressar a valores menos expressivos já na atual legislatura. Os números do desemprego escondem, ainda assim, o emprego parcial e as formas de emprego atípicas, pelo que o indicador da subutilização do trabalho nos permite ter uma perspetiva mais estruturada sobre o mundo do trabalho. Este indicador mostra como a precariedade se tem tornado o novo normal num país em que os salários estão estagnados.


Esta tendência tem ainda sido acompanhada pela queda dos salários e ordenados em percentagem do PIB.


O cenário é manifestamente desolador - os vinte anos do país no euro foram marcados pelo enorme endividamento (primeiro maioritariamente privado, depois público), pelo aumento dos níveis de desemprego, pela precariedade e pela estagnação dos salários. Além disso, atravessámos ainda um processo de financeirização no qual os bancos, que começaram por ter lucros elevados e promover atividades especulativas ou pouco produtivas, chegaram a 2008 com grande acumulação de crédito concedido que se tornou "malparado", acentuando a fragilidade da economia do país. A capitalização de um setor financeiro altamente endividado agravou os efeitos da crise. 

Da análise das duas décadas do euro podemos retirar uma conclusão - sem uma alteração profunda dos mecanismos de redistribuição de rendimento na zona euro, ou uma eventual rutura com a moeda única, será muito difícil evitar que os próximos vinte anos arrastem este doloroso caminho que se apelida de "integração".

8 comentários:

Anónimo disse...

Ora aí está. Pedaço profético.

henriquedoria disse...

Que fazer? Reestruturar o euro e a UE ou acabar com ela?

Alf disse...

Uma imgem que é, mais do que nunca, necessário mostrar às pessoas, para que deixem de continuar amarradas à propaganda do regime...

estevesayres disse...

Nem vou comentar, o artigo, e como diria o meu querido avô materno, um Republicano convicto; esta tudo dito"!

Jaime Santos disse...

O problema, Vicente Ferreira, é que não se vislumbra nem uma alteração das regras (da responsabilidade dos Governos da zona Euro), nem qualquer programa de rotura viável. Parece que há alguns Economistas da Lega que querem introduzir uma moeda alternativa à socapa, sob a forma de títulos de dívida, só que isso não é evidentemente sério...

A Esquerda não pode continuar a reclamar contra a UEM sem explicitar preto no branco o que deseja fazer, correndo claro o risco de que as pessoas rejeitem os sacrifícios na hora de depositar o voto em urna. A lengalenga do PCP de que é preciso estudar a saída do Euro não é mais do que isso, vinda ainda por cima de um Partido cansado e sem quadros económicos de relevo.

A TINA é mesmo por falta de comparência...

Jose disse...

Um gráfico da produtividade também ajudava.

Anónimo disse...

Será que este Euro, tal como vigora (com germânica insolência) há cerca de duas decadas é evidentemente sério?.

Anónimo disse...

Acrescentando que o Euro jà fez perder 40 mil euros a cada português até hoje

https://www.facebook.com/Curto.media/videos/317173125652754/