quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Pequenos passos

Parece sintomático que os dois temas escolhidos pelo PSD para conversar com o Governo sejam em torno de dinheiro. É um tema fácil para os dois partidos. 

Ele é a descentralização - ou seja, a transferência de responsabilidade e verbas do Estado para as autarquias - e o desenho do próximo quadro de fundos comunitários.  

O PSD colocou a negociar Álvaro Amaro, presidente dos autarcas sociais-democratas, para a descentralização, e Manuel Castro Almeida, agora vice-presidente do PSD e ex-secretário de Estado para o Desenvolvimento Regional, para os fundos europeus. Até Maria Luís Albuquerque, aquela ex-ministra que se caracterizou pela incapacidade até para se mostrar dialogante, aposta nas conversas com o Governo. Disse ela em Bruxelas: "Não queremos ser apenas informados do que está a acontecer, queremos que haja um verdadeiro debate, uma consulta. Havendo essa disponibilidade para falar connosco, em tempo, não há razão nenhuma para não nos entendermos, porque nunca nos desentendemos nestas matérias relacionadas com questões económico-financeiras". 

E nem por coincidência, o secretário de Estado Pedro Marques inicia hoje contactos com a Associação Nacional de Municípios Portugueses para debater o novo enquadramento dos fundos comunitários.

O fecho ou mesmo a aparência de diálogo sobre um tema fácil, como os que estão em causa, tem vantagens para ambos neste jogo de aparências pré-eleitorais. E é uma escola de aprender a dialogar. É também para isso que se criam grupos de trabalho. Quem aceita falar de amor, tende a acabar na cama. E esse é o grande risco e o grande desafio à esquerda do PS.

O PSD, com sondagens nos seus níveis mais baixos de sempre - que nem somado com o CDS consegue chegar à pontuação do PS - teve de mudar de táctica para evitar a sectarização de quem o levou para a direita. O PSD quer governar sozinho, mas sabe que tem de recuperar os eleitores que se afastaram dele e que fazem parte daquela base social que se movimenta entre PS e PSD. Mostrar-se afável é uma boa jogada.

Por seu lado, o PS - e mesmo o próprio Governo - tem no seu seio quem não gosta de um Governo apoiado à esquerda e vê com bons olhos tudo o que crie stress à coligação. É de esperar novos anúncios de necessidade e urgência das ditas reformas estruturais - ou seja, das reformas que a direita quer fazer, mas que não são reformas de fundo, que melhorem a vida no país. Até Marcelo Rebelo de Sousa se sente um pouco esvaziado neste contexto, ele que pressionou para consensos, como na Justiça, que aliás Rio remeteu para o médio prazo e parece querer fazer brilharetes com a sua nova vice-presidente.

António Costa, por sua vez, demarca-se do PSD ao reafirmar sem parar a coligação que o apoia, mas tende a querer esvaziar a ofensiva dialogante de Rio, respondendo com a abertura em temas não de fundo. Esse diálogo aparente dá igualmente um sinal à esquerda para não se radicalizar - e não encostar o PS à parede, nomeadamente no dossier laboral - porque há mais parceiros possíveis. Ter dois parceiros que se mostram apreensivos ou zangados com o PS é o melhor cartão de visita para um PS que quer se manter independente de esquerdas radicais, ao centro (nas águas do apoio social do PSD), ainda que o centro seja a manutenção de um status quo à direita. 

Nada disto debate o que é essencial para Portugal. Tudo parece ter a ver com adiamento e eleições. Mas se assim é, a iniciativa pode estar do lado dos partidos à esquerda do PS, assim saibam eles propor um novo agendamento de reformas de fundo, com propostas viáveis e responsáveis. Algo que os coloque no centro do debate, da iniciativa política, que neste momento virou para a direita.  

13 comentários:

Jose disse...

«Nada disto debate o que é essencial para Portugal.»
As económico-financeiras nunca são o essencial para a esquerda - é o imaterialismo dialéctico!

«a iniciativa pode estar do lado dos partidos à esquerda do PS, assim saibam eles propor um novo agendamento de reformas de fundo, com propostas viáveis e responsáveis.»
Viáveis e responsáveis - é pura impossibilidade!

João Ramos de Almeida disse...

Caro José,

Há concordar que as questões económico-financeiras agora em debate, são muito mais financeiras de certas zona do país (e não do país) e economicamente (os fundos estruturais) muito "inside the box", para não dizer altamente contaminadas por uma visão comunitária das necessidades do país. ninguém espera a resolução dos problemas do país com o debate que agora se abriu... Até o José, acho eu.

Jose disse...

Caro João
'Os problemas do país' são legião e resolvem-se um a um.
Gerir recursos e definir investimentos não são dos menores problemas; se forem tratados a alguma distância da treta partidária será um ganho relevante.

Anónimo disse...

Imaterialismo dialéctico mais a pura impossibilidade.Estamos no reino do jose

Ele é o diabo montado sabe-se lá em quem

Mas é tão delicioso ver esta gente a tentar vender a "alma" ao dito cujo. Trata-se de dinheiro... e do aumento da taxa de lucro

Jaime Santos disse...

Exatamente, mas com objetivos realistas e medidas quantificadas. Lembre-se, João Ramos de Almeida, que o PS nunca ganhou eleições sem o Centro e que a Esquerda não será poder sem ele. Por isso, cautela com o que exigem de Costa. Mais vale um pássaro na mão...

Vitor disse...

A meu ver há uma possibilidade interessante que se levanta com a nova liderança do PSD que é a possibilidade de PSD em conjunto unicamente com o PCP ou o BE conseguirem aprovar legislação por via parlamentar. Esta é uma possibilidade que seria totalmente inviável com Passos Coelho mas que poderá não ser totalmente descabida nas condições atuais.
Do meu ponto de vista foi muito positivo ver a quebra com a "tradição" e ver um governo formado com base num acordo de maioria parlamentar. Do meu ponto de vista também seria interessante quebrar com a tradição de praticamente ter o Parlamento subjugado às decisões do Governo e ter o regime parlamentar multi partidário a funcionar efetivamente em Portugal, com o governo "subjugado" às decisões parlamentares. Do meu ponto de vista, ter o parlamento em vez do primeiro ministro como o "orgão" ue efetivamente toma a maioria das decisões políticas em Portugal poderia fazer muito pelo avanço da nossa cultura política.

Anónimo disse...

Com Rui Rio a falar tão doce, é bom lembrar o que disse o seu vice no Congresso:

"Eatamos a caminho de um novo PREC. Uma Coreia do Norte"
Morais sarmento

https://otempodascerejas2.blogspot.pt/2018/02/papas-e-bolos.html#links

António Pedro Pereira disse...

Já falamos de dinheiro, aí vão os grandes números da massaroca, da grana, como dizem os brasileiros.

Dívida pública acerta no alvo do Governo.
Caiu para 126,2% do PIB em 2017.
Desde 2012 que não atingiu este número.
Entre 2012 e 2017 o rácio da dívida pública caiu apenas por duas vezes:
Em 2015, para 128,8% (uma redução de 1,8 pontos percentuais em relação a 2014).
Em 2017, para 126,2%.
A meta para 2018 é de que o rácio caia para 123,5%.
Rafaela Burd Relvas, in ECO- Economia online
https://eco.pt/2018/02/22/divida-publica-acerta-no-alvo-do-governo-cai-para-1262-do-pib/

Isto se o Diabo continuar perdido e à procura do caminho para Portugal.
Se encontrar o caminho estamos tramados.
Mas nesse caso teremos o Salvador da Pátria, folgado, livre e fresquinho que nem um pero, que virá acabar o trabalhinho que deixou a meio, como provam os brilhantes resultados da não menos brilhante privatização dos CTT, assim como os brilhantes resultados da não menos brilhante privatização da ANA, etc., etc., etc.

Anónimo disse...

"o PS nunca ganhou eleições sem o Centro "?

Será este o carimbo justificador para o desvio à direita que o PS está a ensaiar?

Mas o PS foi governo,graças à viabilização do seu governo pelo PC, BE e Verdes. E não precisou do centro para nada,bem pelo contrário.




Anónimo disse...

"A nova liderança do PSD pode aprovar com o PC ou com o Bloco", patati-patata.

Que miséria franciscana. Como se não conhecêssemos a tralha neoliberal, mais pesporrenta ou mais fininha.
Os interesses que os partidos representam são distintos. Acordos políticos pontuais são possíveis. Mas as questões de fundo permanecem fracturantes.

Há quem defenda os interesses privados da banca e das seguradoras.E há quem defenda o oposto. Há quem ataque a escola pública e torça pelos colégios privados e se engasgue com os seus próprios gritos a favor dos rankings. E há quem pugne pela escola pública. Há quem ataque o SNS em favor do lucro feito à custa da doença e da miséria e há quem lute pelo direito à saúde das populações. Há quem queira mais despedimentos e não consiga ocultar o seu ódio a quem trabalha e há quem queira nova legislação laboral, que ponha fim aos desmandos patronais.

Há uma esquerda plural que quer um mundo livre da exploração e dos desmandos do Capital. E há uma direita que tira proveito da miséria alheia, que a aumenta e que promove o saque.

Jose disse...

«Mas o PS foi governo,graças à viabilização do seu governo pelo PC, BE e Verdes. E não precisou do centro para nada,bem pelo contrário.»

Por isso mesmo é que é uma geringonça.

Lowlander disse...

Jose, toma um anti-acido que isso passa.

Anónimo disse...

Quem é que usou pela primeira vez o termo "geringonça"?

Deve ter sido alguém das relações do jose. Esta mania de não desgrudar das palavras de ordem dos seus maiores,faz no entanto lembrar duas coisas:

- uma azia tenaz e e persistente. Daí a mais-valia de um anti-ácido.
- uma tendência de papagaio papagueante. Daí a mais-valia de jose