terça-feira, 22 de março de 2016

Os nossos problemas estruturais não se resolvem com "reformas estruturais"

Há quase uma década que o governo português é obrigado a apresentar anualmente a Bruxelas o seu Plano Nacional de Reformas (PNR, dantes chamava-se PNACE), mas nunca ninguém lhe ligou muito. Parece que este ano é tema de discussão.

O PNR faz parte do chamado "semestre europeu". Espera-se que o PNR apresente as "reformas estruturais" que cada país se propõe levar a cabo para tornar as suas economias mais competitivas. O pressuposto é de que se cada um fizer o seu trabalho de casa, a zona euro pode funcionar sem problemas. Logo, se a economia portuguesa tem problemas é porque não se fizeram as reformas necessárias, certo? Se calhar não.

Os gráficos abaixo mostram a posição de Portugal no relatório "Doing Business 2016" do Banco Mundial, um documento que analisa a facilidade de fazer negócios em cada país. Como se vê, Portugal sai-se bastante bem quando comparado com países comparáveis (neste caso, os do sul da UE). O progresso tem sido notável na última década em vários domínios. E aqueles onde ainda há lacunas graves (lei da empresa e serviços financeiros) não são os habitualmente referidos (e.g., burocracia, corrupção, mercado de trabalho).



O nosso problema não é a falta de "reformas estruturais". É antes uma estrutura produtiva incapaz de conviver com as regras do euro, associada a um endividamento (privado e público) insustentáveis. Quanto a isso, não há muito que o PNR possa fazer.

14 comentários:

Anónimo disse...

"reformas estruturais"

palavreado tecnico que pode ser traduzido assim:

"nós, os oligarcas queremos que vós, a ralé nos sirvam tal como já serviram os monarcas, daqui adiante nós, os banqueiros e eurocratas seremos os vossos reis e rainhas!"

Luís Lavoura disse...

uma estrutura produtiva incapaz de conviver com as regras do euro

O que é que isso quer, com precisão, dizer?

Anónimo disse...

Lavoura

parece-me a mim que quer dizer que ficámos sem política monetária e que somos um país ainda por desenvolver obrigado a ter défices que degeneram em políticas contracionistas ou, mais recentemente, pró-cíclicas

vmsda disse...

O livro "O Que Fazer Com Este País" (primeira parte) tem uma análise bastante completa e acessível à sua pergunta.

Anónimo disse...



“Uma estrutura produtiva incapaz de conviver com as regras do euro”.
Em minha opinião, isto tem tudo a ver com
a forma como fomos empurrados portas adentro da CEE. Marcou profundamente (para sempre) os portugueses.
Meia dúzia de “Magos” da política entenderam não ouvir as pretensões do povo sobre esta matéria tao delicada que e´ a nossa soberania, a nossa Independência.
As forças vivas da nação não tiveram o direito ao “Contraditório” grosso modo, trabalhadores e patrões. Como irão aceitar regras (e que raio de regras são essas? Já agora,,,).
Ao estilo da ´greve de zelo´ vão indicando sua indignação. Não há´ pachorra para atender a acções de tais senhores…De Adelino Silva

Jose disse...

Pensamento do dia: se tudo fosse diferente, como seria diferente!

Anónimo disse...

Pensamento do dia: a impotência ( também argumentativa) tem destas coisas. Por vezes disfarça-se de "pensamento" para ver se passa.

Pedro Santos disse...

Então a reforma estrutural que é precisa não seria a adequação da economia à zona euro? Se queremos importar bens e serviços, não deveria ser desígnio nacional trabalhar para a economia passe a ser exportadora? Equilibrando não só a balança de pagamentos, mas desenvolvendo excedentes orçamentais todos os anos em que de forma igualitária se pagava o que contraímos de crédito e se redistribuia rendimentos aos mais desfavorecidos, mas principalmente aos que não podem se sustentar a si próprios devido a problemas físicos/psíquicos?

Sugestão para o Plano Nacional de Reformas:
1. Deixar de fazer mais dívida (Défice a 0%)
2. Índice Nacional de Competitividade por sector (estímulo a aplicação de boas práticas nas empresas)
3. Deixar de subsidiar directamente do orçamento do estado empresas e outras corporações que deveriam funcionar em mercado livre.
4. Persuadir bancos, empreendedores e universidades, através do discurso político, a empreender em sectores em que Portugal se possa especializar no médio prazo.
5. Juntar as entidades reguladoras das empresas para que o licenciamento seja efectivamente mais rápido sem ser necessário 20 e tal entidades diferentes se pronunciarem sobre cada pormenor.

Gostava de saber a opinião do Prof. Ricardo sobre esta matéria!

Anónimo disse...

Caro Pedro Santos:

Acho sinceramente que as suas questões são de uma puerilidade a toda a prova. A que se junta uma estreiteza ideológica adequada a um neoliberalismo axiomático completamente desfasado da realidade.

Não.Não vale a pena falar agora das trivialidades económicas do anterior governo sobre o el dourado das exportações e sobre a redistribuição aos mais desfavorecidos (?) (sob a forma duma qualquer obra piedosa da Dona Jonet?)
Falo sim nos "desajustamentos" concretos de quem defende um défice zero(?), o endeusamento dos manuais de boas práticas e da persuasão aos bancos e empreendedores ( esta só mesmo como piada macabra) e na velhíssima história da carochinha sobre o "mercado livre".

Tudo coisas tão velhas que até dói voltar aqui a ler tais velhas coisas. E velhas porque basta ler alguns dos muitos textos aqui postados neste mesmo blog para se perceber que só uma enorme distracção pode permitir voltar a temas tão debatidos,esmiuçados e rebatidos por aqui.

Bastava estar um pouco mais atento ao que se tem escrito aqui no LdB.

Pedro Santos disse...

Caro Anónimo,

Dou-lhe os parabéns por, apesar de ter sido a minha primeira intervenção neste blog, já saber tudo sobre a minha puerilidade a toda a prova e sobre a minha estreiteza ideológica e sobre o meu neoliberalismo, que pelo simples uso da palavra indica que não sabe do que está a falar, mas foi o suficiente para tentar adjectivar-me e aos meus pensamentos sem refutar nada do que disse. Obrigado pelo seu contributo, tão importante e eloquente.

Tenho uma estreiteza tão grande que até vim a este blog tentar aprender sobre o o pensamento do Prof. Ricardo e tentar perceber se percebo onde é que discordamos e porquê. Só mesmo de uma pessoa com estreiteza de vistas que apenas procura reforçar os próprios pontos de vista.

De qualquer forma, se por gentileza, de forma educada e objectiva me tentarem esclarecer, eu agradeço. Caso não seja possível fazerem-no, fico esclarecido, não sobre estes temas, mas sobre a disponibilidade, aparentemente, que aqui existe para pessoas que pensam de forma diferente.

Anónimo disse...

Não tem nada de dar os parabéns porque o que interessa são mesmo os factos e não conversa um pouco da treta. Tal como o simples uso da palavra indicar não bastas vezes que se sabe muito bem do que se está a falar. Tanto que conduzem a estes equívocos um pouco supérfluos.

A refutação dum pensamento neoliberal é uma tarefa que neste momento não me apraz executar. Não interessa porque assente em axiomas que a realidade desmente a cada passo. Pelo que os seus sentimentos sinceros sobre o sentir-se ofendido por não lhe darem a resposta que acha merecer tem uma resposta frontal e sincera. Saia da sua zona de conforto e procure aqui mesmo neste blog as respostas para as suas dúvidas ou afirmações pueris e ideologicamente sinalizadas

O perceber onde se discorda é uma tarefa um pouco escolástica. Mas o perceber porque se discorda é uma tarefa vasta que remete para outras disciplinas e para as quais como já percebeu não se resumem aos resumos que pretende

Por isso por favor não amue nem invoque a disponibilidade dos demais, quando essa disponibilidade é posta todos os dias à prova por aqui. Não se podem "esclarecer" todos os dias os neófitos que fazem afirmações espantosas sobre um defice zero. E percebo que se possa sentir melindrado pelo facto de se achar piada macabra esta história do "persuadir bancos e empreendedores". Mas o que quer? Esta afirmação é de tal puerilidade que só mesmo assim é que se pode ar resposta. Não vê o que se passa à sua volta? Não vê o comportamento da banca e os prejuízos que a sua privatização a destempo têm conduzido? Acha que a "persuasão" funciona numa sociedade em que o regulador é uma figura de retórica e o lucro a única condição para singrar?

Anónimo disse...

Uma nota final:
Não extrapole para os autores deste blog as posições individuais dos que aqui comentam, como anónimos ou não.
A minha resposta não vincula mais ninguém senão a mim próprio. Se tiver pachorra e tempo ainda voltaremos a alguns dos temas.

Mas reforço mais uma vez o anteriormente dito.Em vez de se lastimar, faça como o que Passos Coelho pregava aos demais, daquela forma arrogante a trauliteira. Saia da sua zona de conforto e procure esclarecer-se por sua própria iniciativa.Aqui,neste mesmo blog.É fácil e barato, mas não lhe dá milhões.
E sobretudo não se vitimize dessa forma tão tosca, encarnando-se a si próprio como "pensador de forma diferente". Todos o somos e ainda bem.

Anónimo disse...

Disse que pouco a pouco e de acordo com a disponibilidade se abordariam aqui alguns dos "temas".

Comecemos então por uma primeira abordagem:
"O free-trade, o mito da concorrência “livre e não falseada” (com monopólios!) obriga os países à exportação. Aos países tecnologicamente menos avançados resta a competição em nichos de mercado praticamente saturados, na base de baixos salários e trabalho sem direitos. O significado deste processo é exemplarmente definido na “Teorias da Mais Valia”: “O comércio externo determina a forma social das nações atrasadas”.

O “exportar mais” não passa de uma comodidade de raciocínio, um simplismo para semear ilusões. No estado de (não) desenvolvimento económico que Portugal atingiu, não se obtém “crescimento e emprego“, isto é, aumento do mercado interno, com base nas exportações, mas é a partir do desenvolvimento do mercado interno que se desenvolvem as exportações."

A continuar

Pedro Santos disse...

Caro anónimo,

Agradeço os seus conselhos tão sabiamente executados e tão pouco adjectivados.
Não vou discutir a sua lógica de que embora tenha agora começado a ler o blogue não poderia dar já a minha opinião até o ter lido quase todo e tentar perceber o pensamento aqui exposto.

Agradeço, sinceramente, o começo do esclarecimento. Mas tenho uma dúvida sobre uma das hipóteses em que parece assentar. A ideia, acho eu, é que através do desenvolvimento do mercado interno permitiria o desenvolvimento do país e então, depois, poderíamos exportar para os menos desenvolvidos?
E assim sendo, o mercado interno teria de ser desenvolvido em áreas estratégicas que permitissem através desse mesmo desenvolvimento exportar, correcto?
É que quando falei em "persuasão" a ideia seria exactamente para que as empresas não vivessem de rendas do estado, que pelo que percebi, correcta ou erradamente, tem sido o caso desde o início do século xx (talvez antes?) formando e ajudando a manter os monopólios. E se a lógica foi a que percebi, como iria o estado desenvolver o mercado interno nessas áreas estratégicas, sem ser pela "persuasão"?

Desde já grato por termos começado realmente a conversar.