terça-feira, 14 de julho de 2009

Economia ou casino?

«Se a história serve de indicador, depois de crises que surgem a meio de uma grande revolução tecnológica, vem uma época dourada. O boom Victoriano, a Belle Époque e o auge do pós-guerra foram períodos de prosperidade. Mas isto não é mecânico. Exige decisões que modifiquem as condições do mercado, que favoreçam a economia real e não o casino financeiro e distribuam melhor a riqueza, estimulem a procura e a expansão da produção e emprego. O capitalismo já viveu quatro ciclos pendulares como este». Vale a pena ler a entrevista que Carlota Pérez, economista heterodoxa já aqui discutida pelo Ricardo, deu ao i. Um pretexto para conhecer os seus trabalhos. Pérez faz parte de uma minoria de economistas que, incompreensivelmente, continua a ter a mania de conceber a economia como uma ciência social e histórica dedicada a estudar a evolução do capitalismo realmente existente, as relações entre as revoluções tecnológicas e o entorno institucional ou entre o capital industrial e o financeiro. Tudo assuntos menores…

5 comentários:

Diogo disse...

A tecnologia está a acabar com o emprego. Temos de começar a encarar um mundo sem empregos, onde a máquina começa a produzir sozinha tudo aquilo de que temos necessidade. Um mundo sem empregados nem empregadores. Um mundo sem capitalismo.

Não continuem a rezar por Keynes.

Ricardo Castro disse...

É estimulante acreditar que estamos numa fase da história em que qualquer coisa de fundamental, que nos tem "governado" nos tempos mais recentes, terá de ser reformulado. Isto significa que a criatividade e inovação também têm de chegar à política.

Sobre o assunto deste post, pretendo dar relevo à expressão de "capitalismo realmente existente". Compreender profundamente o sentido desta expressão e as consequências que daí advém é um grande desafio para todos aqueles que estão insatisfeitos com este mundo.

Estudar o capitalismo é estudar e discutir os mercados em todas as suas vertentes, não apenas na dimensão económica mas também política, cognitiva, psicológica e social. Será essa abordagem que nos permitirá compreender o mercado na sua totalidade, como um corpo social cheio de espectativa, valores e práticas institucionalizadas.

Mas podemos cair no erro de passar do seu endeusamento para a sua diabolização. Estas são duas formas de pensar semelhantes.

O mercado funciona como qualquer outro corpo social, portanto a sua racionalidade também oscila e a percepção dos seus méritos vai sendo alterada conforme a sua própria envolvência vai sendo alterada. O nosso esforço tem de passar por conceptualizar o mercado na sua versão mais humanizada. Tentar ver aquilo que ele é de facto.

O mercado foi "eudeusado" porque apresentou resultados. A sua putativa racionalidade adquiriu foros de omnisciência. Enquanto tudo funcionou na "perfeição" a racionalidade do mercado serviu de fonte quase exclusiva para a discussão e execução de políticas públicas. Os economistas ganharam um papel relevante porque eram (e ainda são) os grandes interpretadores das reacções, comportamentos e dos estados d`alma do mercado. E assim se alimentava todo este arco de racionalidade: constituido por mercado, economistas e políticos.

Mas hoje as economias de mercado já não competem com outro tipo de economias. Significa isso que a putativa racionalidade dos mercados está a deixar de ser o maior factor de competitividade. Cada vez é mais difícil usar esse factor, por si só, como argumento político. A própria racionalidade do mercado está em causa quando se implementam mecanismos que promovem decisões de curto prazo.

Hoje o desafio é encontrar forma de reposicionar o mercado - continuar a encará-lo como um parceiro político relevante sem o endeusar nem diabolizar.

Se estamos em tempo de refundação das sociedades, a luta para saber qual vai ser a racionalidade que governará as sociedades no futuro já está em curso. Espero que as democracias saibam que tem opositores com os quais competem. Espero que saibam fazer essa transformação sem por em causa os seus fundamentos. E a economia de mercado faz parte do grande projecto das sociedades abertas.

Há muito para alterar nesse domínio, sem dúvida! Inclusivamente no sentido de democratizar mais a sociedade na sua riqueza, saúde, educação, justiça, etc.

Mas também é importante compreender que no futuro aqueles que fizerem esse trajecto da forma mais inteligente serão aqueles que dominarão e disseminarão a sua própria racionalidade.

Rui Fonseca disse...

"Tudo assuntos menores…"

Percebo a ironia mas não entendo a razão dela.

A querela que se levanta entre os economistas parece-me absurda.

Qualquer ciência, social ou da natureza, não pode dispensar todos e quaiquer contributos que contribuam para a compreensão da realidade.

Sob pena de se trair enquanto ciência.

Li a entrevista e não descortinei nela afirmações susceptíveis de grandes polémicas. A ciência, se o for, não é polémica.

"Se não receio o erro é porque estou sempre disposto a corrigi-lo"
Não há outra forma, salvo erro, de ciência.

Pedro Fontela disse...

Os neo-luditas atacam de novo...

Luís disse...

E de tudo isto a montanha pariu um rato. A Carlota, essa "heterodoxa"; essa schumpeteriana (resta saber se conservadora) de gema também teve direito a dizer umas boutades para consumo interno. É certo que o Min. Punho nunca a deve ter lido, também não é preciso; ele percebeu logo que era verbo de encher e a essas mais vale dar-lhes logo uma cornada.

Que o capitalismo tem ciclos, que tem ciclo longos, que se apoia num paradigma tecnológico renovado para as grandes períodos de acumulação não é grande novidade. Mas depois, uma PhD de Cambridge ou Oxford, não me llembro, reduz tudo às infantilidades de "tá tudo nas mãos dos mundo financeiro", "o Estado tem que voltar a tomar o pulso às coisas"; "o capital tem que voltar a ser canalizado para actividade produtiva" (!!!); tá bem, a gente espera pelo próximo artigo da douta onde esperamos que discorra sobre o papel do microchip na ascenção económica dos países asiáticos e coisas mais.

Hoje, ou ontem, ouvi um ex presidente do Sporting, q afinal tb é presidente de uma associação qualquer das construtoras e que pelos vistos tb assinou o manifesto a favor das obras públicas que se perspectivam; resumindo: "está visto que Portugal não é um país agrícola; também nunca teve uma grande política industrial, logo não é um país industrial; restam-nos os serviços obviamente. E então a questão chave é o investimento infraestrututal, a chave que abre todas as portas chamam-se "plataformas logísticas", porque que seremos a porta de entrada dos bens e mercadorias de consumo dos 50 milhões da Península; bem me parecia que a política destes gajos se resumia a isto. Tudo espremidinho... só temos de continuar a ser porta de entrada e transportar todos estes objectos de orgias ibéricas: para isso é que foram: os portos,os TIR e o TGV: Madame, esmolinha ao ceguinho? A Grã-Espanha só tem de continuar com o défice da balança comercial (a nossa, enfim, nem vale a pena falar); nós cobramos-lhe os fretes e tá tudo resolvido. O dim dim não vai parar de entrar. Estivadores, motoristas, maquinistas, assistentes de bordo, eis as especializações na calha.

Bravo. E este foi o homem que reestruturou a dívidia da SAD; deve saber do que fala.