segunda-feira, 28 de janeiro de 2019
RBI: a armadilha de uma promessa simples
Philippe Van Parijs, professor na Universidade de Lovaina e destacado defensor do rendimento básico incondicional (RBI), esteve na semana passada em Braga num debate onde discutiu esta proposta, acompanhado pelo ministro Vieira da Silva. A ideia não é nova e já foi tema de outros textos neste blog (aqui, aqui ou aqui). No entanto, porque parece continuar a captar a curiosidade e a simpatia de alguns setores da esquerda, talvez valha a pena recuperar os seus principais aspetos e problemas.
O RBI surge no debate público como proposta de resposta às mudanças tecnológicas no mundo do trabalho e à ameaça de substituição de grande parte dos empregos por máquinas. Na entrevista que concedeu ao Público, Van Parijs sugere que "o RBI é um remédio para a armadilha do desemprego criada pelo Estado social." Assim, à inevitável eliminação de grande parte dos postos de trabalho, Van Parijs propõe que devemos responder com a atribuição, por parte do Estado, de uma quantia fixa a cada cidadão, independentemente da sua condição financeira, profissional ou pessoal.
No entanto, a simplicidade da ideia esconde vários problemas associados. Por um lado, a solução afasta a ideia de que o desemprego é um problema social que afeta não apenas o rendimento disponível, mas também a vida familiar e pessoal dos indivíduos, como nos mostram os estudos sobre a relação entre o desemprego e a diminuição das redes de contactos da pessoa desempregada, pela exclusão gradual dos espaços de socialização (o local de trabalho, os cafés, restaurantes, etc.). A solução proposta pelos defensores do RBI implica a eliminação do pleno emprego como objetivo central de uma sociedade democrática, desvalorizando também a importância das políticas públicas neste objetivo (aspeto discutido aqui).
As contas, recordemos, já foram feitas e não enganam: em Portugal, um rendimento mensal de 750€ para todos os cidadãos significa um montante total de 105 mil milhões de euros, mais de 60% do PIB. Esta despesa não constitui um combate eficaz à pobreza pelo duplo motivo de ser direcionada para todos, e não apenas para os pobres, e por não atribuir o rendimento necessário para uma vida digna. Além disso, como exposto por Francisco Louçã, apenas seria concretizável se o Estado abdicasse de todos os outros serviços públicos e duplicasse os impostos.
Não é, por isso, surpreendente que o RBI seja defendido por autores neoliberais como parte de uma estratégia de desmantelamento do Estado social e dos serviços públicos de provisão de saúde, educação, proteção social, segurança, entre outros. Sob a promessa da "defesa da liberdade individual", o que os seus defensores propõe é uma reconfiguração profunda do papel do Estado, que passa a atribuir um cheque às pessoas como contrapartida da mercadorização dos serviços essenciais ao funcionamento da sociedade. Além disso, o RBI contraria princípios constitutivos do Estado social como a universalidade e equidade no acesso a condições dignas de vida (que passam a depender da oferta privada) ou a lógica da reciprocidade organizada e inclusiva (bem visível, por exemplo, no caso do sistema de pensões).
Por outro lado, a inevitabilidade do fim do emprego é uma ameaça que assenta numa ideia errada sobre as tendências de fundo do capitalismo. A história mostra-nos que as sucessivas revoluções industriais e o avanço tecnológico não eliminaram o trabalho necessário. A alterações profundas no modo de produção estão associadas mudanças na organização do trabalhado e nas qualificações necessárias, mas não a inevitabilidade do desemprego permanente. Em vez de insistir numa ideia errada, o que devemos discutir é a distribuição dos ganhos gerados pela tecnologia e o papel das políticas públicas na redistribuição da riqueza através do emprego e dos seus direitos coletivos. Uma sociedade democrática e inclusiva constrói-se com serviços públicos abrangentes, com direitos laborais robustos e com uma organização sustentável da produção (através, por exemplo, da diminuição do tempo de trabalho e da aposta na reconversão ambiental das economias).
O RBI constitui, por isso, uma ideia perigosa que não contribui para enfrentar os desafios que as sociedades enfrentam. E uma ideia perigosa repetida muitas vezes não deixa de o ser. Que seja promovida pelos que pretendem aprofundar a captura de todos os espaços da vida social pelo mercado, não surpreende. Que continue a ser defendida por alguns setores da esquerda é sinal dos tempos estranhos que vivemos.
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15 comentários:
O problema central deriva da natureza substantiva do Estado Social, o qual, mais não sendo que uma das cambiantes do Estado capitalista, padece das mesmas contradições e problemas, que se tornam a cada dia mais manifestamente irresolúveis. A economia digital do presente e do futuro, não erradicou nem erradicará as marcas essenciais da exploração do homem pelo homem. É por essa razão que volvidas décadas sobre as lutas heróicas que foram travadas pela conquista de uma jornada de trabalho de 8 horas, voltamos a assistir hoje e em qualquer dessas praças de jorna a que a webb summit dá um certo brilho de lantejoulas circenses, a dias de trabalho de 9, 10 ou 12 horas em muitos casos e sem qualquer compensação digna ou justa, pese embora o carácter cada vez mais digital e cosmopolita dessas empresas e serviços: da distribuição à banca ou às telecomunicações, mas abrangendo também sectores crescentes da indústria mais tradicional..
Por tudo isso e por muito mais, o que está em causa não são os impactos das mudanças tecnológicas no Estado social, mas sim a necessidade de colocar a superação do capitalismo como uma necessidade premente e cada vez mais orientadora das reivindicações populares, sejam elas laborais ou de natureza diversa.
Há mais de 20 anos que a Dinamarca tem um rendimento mínimo para desempregados que após anos de formação/requalificação/experimentação se decidam a sair do mercado de trabalho.
Isso pressupõe cooperação tripartida e erradicação de economia paralela.
Concordo, exceto numa coisa. As diferentes revoluções industriais não destruíram a necessidade do trabalho (e ainda bem, por ele é, como bem nota, um criador não apenas de rendimento mas também de dignidade). O problema é que destruíram uns empregos e criaram outros, mas não para as mesmas pessoas.
A decadência da Esquerda também tem a ver com a decadência do emprego industrial, tornada inevitável pelas transformações tecnológicas.
Em conversa com um Engenheiro de Produção Industrial de uma multinacional que acabara de apresentar umas simulações sobre uma cadeia de produção, com os operadores representados por figuras tipo Lego, perguntei-lhe por que não substituía os humanos por robôs, ao que recebi como resposta que a vantagem de Portugal era que os salários ainda eram suficientemente baixos para isso não ser economicamente viável...
A perda desses postos de trabalho com bons salários e segurança no emprego contribuiu para a decadência do mundo sindical e a criação de uma 'economia do biscate' de que não escapam sequer licenciados ou mesmo doutorados com elevados níveis de competência...
E não vejo como se pode reconstruir uma economia com trabalho digno baseada na produção industrial quando precisamos de cada vez menos de pessoas nessa frente. O mundo não regressa aos anos 70, por mais que Corbyn et al o desejem...
Será pois preciso que os robôs passem a pagar impostos como defendia Benoit Hamon e agora defende António Costa? Mesmo que assim se libertem recursos, a questão é como os gastar para fazer mais do que pagar às pessoas para não trabalharem...
As economias capitalistas têm no consumo não apenas ou não principalmente um modo de satisfação de necessidades humanas, mas antes um modo de reprodução do capital. Neste sentido a robotização da produção confronta a sociedade (e confrontará, no limite, inevitavelmente o próprio sistema capitalista) com uma pergunta incontornável: de que modo se podem articular uma produção capitalista com uma distribuição social(ista)?
O que está em causa é a forma de distribuição da riqueza criada, o trabalho também está sujeito de uma forma directa ou indirecta a uma lógica de mercado. Claro que mercantilizar o estado social não é opção, isso significa pagar mais por menos. A redução do horário de trabalho é fundamental mas não é suficiente, quando alguém afirma que o país não é capaz de gerar uma riqueza suficiente para todos terem uma vida digna e decente está também a dizer que uns devem ser sacrificados em nome de outros. A esquerda qualificada parece estar muito pouco disponivel para a autocrítica.
Toda estes considerandos sobre o bem estar geral pressupõem uns tantos considerandos:
- Qual o total de riqueza produzida e como se deve distribuir entre consumo e investimento
- O volume e a distribuição para consumo vão determinar a composição deste; por exemplo se toda a gente pudesse ter um automóvel só uma política fiscal violenta poderia evitar o pandemónio no trânsito (assim é na ciclística Dinamarca).
- Quanto ao investimento, a questão central é saber quem o promove, como se distribui entre público e privado. É questão de regime político e de gestão de expectativas. Uma coisa é certa: o não consumo (poupança) donde se gera o investimento requer do Estado resistir a satisfazer necessidades de consumo dos cidadãos e requer dos privados adiar consumos para maior satisfação futura ou, e aqui está a força do capitalismo, atingido um nível de consumo satisfatório, o investimento de excedentes apresenta-se como uma inevitabilidade.
Um RBI a nível do 'satisfatório´ é uma impossibilidade a que não se vê fim. Como se vê pela geringonça a distribuição de benesses está de há muito a fazer-se sacrificando não só investimentos como a simples manutenção da operacionalidade dos existentes.
Por muito que a ideologia se retorça, acudir aos necessitados é a ambição possível.
Pressupor a desigualdade e torna-la factor de progresso é a ambição possível, e para isso impõe-se que aos necessitados se exija ambição e esforço e aos satisfeitos se propicie meios e se suscite o dever de contribuírem para o progresso.
Um sistema económico gerido a partir de raivas e pressupostos inaplicáveis é pura e simplesmente estúpido.
Acho que há várias formas de encarar e aplicar o RBI.
Tanto pode ser uma ferramenta do neoliberalismo como da esquerda.
O melhor exemplo é que o Ferreira viu mal o que o Parij disse. Ele não acredita que o trabalho vai acabar nem propõe o RBI como substituição do trabalho, ms como complemento - embora haja outros defensores do RBI que o façam.
Por outro lado, também não é certo que a tese de que o trabalho "dignifica" ou "dá sentido à vida" se aplique a toda a gente.
Para grande parte da população o trabalho é um fardo e por vezes até uma humilhação a que tem de se submeter para sobreviver.
O assunto do RBI merece ser visto de forma mais aprofundada.
Sendo certo que Parijs não acredita na "rarefação absoluta dos empregos", não deixa de reconhecer que a ideia "é uma das causas da popularidade atual" do RBI, sendo que essa ideia corresponde a uma leitura incorreta e pouco profunda das tendências de fundo do capitalismo. Os restantes argumentos mantêm-se - à esquerda, a desistência do pleno-emprego como objetivo indispensável em democracia parece-me perigosa. Se o trabalho é um "fardo" (e não duvido que seja em muitos casos), pensemos no combate pela melhoria das suas condições e dos direitos de quem trabalha.
Parece que o nosso primeiro-ministro anda a ser muito mal aconselhado...
Com gente limitada como o Sr Jaime Santos e os exemplos de um Benoit Hamon que tanto "êxito" tem tido a enterrar o PSF está bem arranjado.
Alguém me explique por que raio é que um país como Portugal, que necessita como pão para a boca melhorar a sua competitividade e implícitamente a produtividade, haveria de taxar o uso de robots?
Não se pode subir na cadeia de valor pondo entraves ao que pode melhorar a posição competitiva do país.
Ainda não perceberam que é a demanda que comanda o investimento e o emprego? E que a empresa cuja linha de produção não é robotizada é uma iniciativa a prazo porque baseada em tecnologia que rápidamente será obsoleta e daqui por uns anos despejará os funcionários no desemprego?
Claro que de um ponto de vista de curto prazo pode fazer sentido. Mas para a melhoria da posição nacional na cadeia de valor uma tal empresa baseada no trabalho barato é um beco sem saída.
Quer dizer, aceitam sem pestanejar uma taxa alfandegária implícita à exportação que é o uso de uma moeda grosseiramente sobreavaliada e depois propõem-se taxar um dos poucos factores de produção que pode tirar as indústrias nacionais do buraco?
Esta gente não regula bem da cabeça.
Ainda não perceberam que o pleno emprego tem outros mecanismos que não passam pelo travar da inovação tecnológica?
S.T.
Ainda voltando à questão de taxar a robotização, é como taxar as lavagens automáticas de automóveis. Se o trabalho fosse feito à mão empregava mais gente, mas a produtividade era um desastre.
O problema de como criar empregos não pode ser resolvido baixando a produtividade. Também não funciona pela fixação arbitrária e administrativa de salários mais altos.
Não faltam actividades onde o investimento seria social e ambientalmente produtivo e gerador de riqueza. O problema da criação de empregos está na alocação dos recursos de capital. E esta alocação é feita em função dos quadros de incentivos vigentes.
Por exemplo, não é segredo nenhum a forma despudorada como a indústria automóvel alemã fez lobbying pelo diesel e foi até ao ponto de falsificar os testes de poluição.
Mais investimento pela parte do estado alemão em pesquisa da tecnologia de baterias ou da geração de hidrogénio ou de combustíveis sintéticos com recurso a catalizadores em colectores solares ou por energias alternativas descontínuas já teria trazido avanços científicos e ganhos ambientais. Mas as palavras mágicas são "investimento estatal", incompatíveis com parvoeiras económicas como o "schwarze null".
Se temos um quadro de incentivos que favorece a concentração do capital no centro da EU e em actividades especulativas como querem que haja procura de produtos inovadores, ambientalmente sustentáveis e geradores de emprego?
S.T.
Já agora, partilho a tese de que o RBI é uma ideia perigosa e que pretende mascarar a destruição do estado social e a financeirização de todos os aspectos da nossa vida em sociedade.
O pretexto da perda de empregos devido à robotização é apenas mais um dos pretextos para fazer avançar a agenda neoliberal. Como argumentei em comentários acima, taxar a robotização é uma ideia asinina. A taxação deve ser feita sobre os lucros de empresas e titulares de rendimentos. É, aliás o cúmulo da infâmia que uma pretensa "união" permita no seu seio que alguns estados se comportem como paraísos fiscais praticando dumping fiscal em larga escala. É um exemplo de incentivos errados que exacerba as desigualdades tanto entre países como entre grupos sociais.
Como curiosidade, em Itália é o partido populista mais à esquerda (M5S) que defende o RBI e não a Lega, teóricamente mais à direita.
Mas sobretudo quero felicitar o Vicente Ferreira pela exposição correcta e bem fundamentada de um assunto que se pode prestar a grandes equívocos. Parabéns! Carry on!
S.T.
Embora fugindo ao tema do post, gostaria de chamar a vossa atenção para um artigo no Marketwatch pelo já nosso conhecido economista Ashoka Mody.
Trata-se de um artigo em que se reforça um tema já por mim referido noutros comentários, a saber, a fragilidade de economias pesadamente dependentes das exportações. Curiosamente também aborda a dependência da economia alemã da indústria automóvel e especialmente da tecnologia dos motores diesel que se encontra num beco sem saída.
Também como referi acima teria sido de bom senso o investimento maciço nas tecnologias da mobilidade não poluente, isto é as baterias e o hidrogénio e (ou) combustíveis sintéticos derivados de energias renováveis. Mas pelos vistos tarde pias porque a recessão já aí está a bater à porta da suposta "locomotiva" da EU. E precisamente pelas razões que já tantas vezes apontámos: Falta de investimento e obsessão por um modelo caduco e por teorias económicas tão faralhadas que já nem lembram ao careca.
Para cúmulo, a obsessão suicidária germânica irá arrastar na sua queda as outras economias da zona euro.
https://www.marketwatch.com/story/germany-is-a-diminished-giant-and-that-spells-trouble-for-europe-2019-01-28
Como bónus pensem lá se a EU, e sobretudo a Alemanha, se podem dar ao luxo de deixar o UK fazer um Brexit sem acordo, sabendo que é um mercado importador importante para uma indústria automóvel germânica já em maus lençóis. Auguro importantes cedências da parte da EU.
Boa leitura!
S.T.
S.T., agradeço as sugestões de leitura, sempre interessantes e úteis.
Vicente
The real power of capitalist modernity is not its money or its weapons; its real power lies in its ability to suffocate all utopias—including the socialist utopia which is the last and the most powerful of all—with its liberalism. Unless this power of liberalism is analyzed thoroughly, no ideology will escape being the humble servant of capitalism.” (Abdullah Oçalan)
«The assumption that what currently exists must necessarily exist is the acid that corrodes all visionary thinking» (Murray Bookchin)
De que RBI falamos quando falamos de RBI? E de que defensores? Pela minha parte, o RBI não pode ser um instrumento para desmantelar o Estado Social. Os que propõem tal coisa apenas travestiram a ideia. Muito pelo contrário, o RBI representa um aprofundamento radical dos princípios do Estado Social. O que revelam as críticas à “ideia perigosa” é uma incompreensão profunda do seu significado, como fica patente na rejeição da ideia de que é «direcionado para todos, e não apenas para os pobres». Com este argumento, o SNS deverá ser também uma ideia perigosa, pois a ele acedem em pé de igualdade o rico e o pobre, e o mesmo se aplicaria à escola pública. A falácia do “horror económico” (Forrester) e das suas limitações ideológicas revelam-se assim incapazes de uma ruptura com “a nossa obsoleta mentalidade mercantil”(Polanyi) e, portanto, continuarão a ver ‘despesa’ onde é possível ver um investimento com um imenso potencial transformador, muito para além de toda a mesquinhez contabalística. Se uma prestação de 750€ mensais «não constitui um combate eficaz à pobreza (…) por não atribuir o rendimento necessário para uma vida digna», então, depreende-se que o ideal sisífico do “pleno emprego”, com o actual salário mínimo, poderá ser descrito como uma luta pelo direito de todos a serem igualmente explorados. Deve a esquerda ter como ideal o combate por uma algoritmicamente optimizada exploração do “capital humano”? Do meu ponto de vista, não. Continuar a fazê-lo, persistindo na esclerosada utopia do pleno emprego, só contribuirá para a continuidade do esvaziamento do socialismo na Europa e, indirectamente, para a emergência da extrema direita, que sabe sempre aproveitar o descontentamento e a frustração gerada por ideais falhados, incapazes de transformação, apostados em resolver os problemas do século XXI com as ferramentas da Economia Política do séc XIX. O que o RBI traz de inovador é, entre outras coisas, o que está inscrito na sua própria designação: o princípio da incondicionalidade e a ética que lhe está subjacente. É óbvio que os ricos pagarão muito mais do que recebem, pois não há transformação possível sem uma reforma profunda do sistema fiscal e sem uma reconfiguração do papel do Estado – mas não para entregar ao mercado o que hoje é público e insuficiente. Antes para socializar e democratizar realmente, em vez de lutar por simulacros ditados pelas corridas eleitorais de um sistema que serve bem os ricos e poderosos e trata os fracos, os indefesos, os pobres, em função de exigências alienantes e enganadoras. A incompreensão do princípio da incondicionalidade e das suas implicações (aprofundamento do Estado Social, não o seu desmantelamento) resulta em argumentos inconsistentes e manchados pela mesma cegueira moral (Baumann) daquela mesma direita que crucificou o ladrão de bicicletas e ministro Pedro Nuno Santos quando citou a Crítica do Programa de Gotha. O RBI não poderia, aliás, ter melhor formulação: de todos consoante as suas possibilidades, a todos consoante as suas necessidades.
Abraço
Francisco Oneto
Nada contra o comentário acima do Sr Francisco Oneto.
Mas há um obstáculo que até agora não houve quem conseguisse superar: O financiamento!
O próprio texto o reconhece com a necessidade de rever a fiscalidade, que se encontra na frase: "É óbvio que os ricos pagarão muito mais do que recebem, pois não há transformação possível sem uma reforma profunda do sistema fiscal...".
Mas, e aqui é que a porca torce o rabo, como pretende reformar a fiscalidade estando inserido numa "União Europeia", institucionalmente baseada na concorrência fiscal entre estados-membros e onde nem sequer as injustiças fiscais inter-estados mais gritantes são resolvidas?
Ainda não há muito tempo tivemos um exemplo da má-vontade contra reformas fiscais que tributem mais eficazmente as muito grandes (mesmo muito grandes) empresas. Macron afogou pura e simplesmente o projecto de tributação dos FAANG (Facebook, Amazon, Apple, Netflix e Google) na EU. E não vejo nenhum movimento para acabar com os paraísos fiscais do Luxemburgo, da Holanda e da Irlanda.
Portanto, OK, bamos nessa, Banessa! Mas primeiro como dizem os camones, "show me the money!"
E sobretudo provem-me a sustentabilidade do projecto numa economia que nem capaz é de restaurar o pleno emprego, que aparentemente, segundo algumas ideias peregrinas está fora de moda. Expliquem-me como vão conseguir convencer as grandes corporações a pagar impostos quando estas nem pagar salários decentes querem. Numa economia de mercado o trabalho pode não ser uma mercadoria como as outras mas continua sujeito à lei da oferta e da procura.
Quem quiser substituir essa descoberta de preço por outro sistema que me explique bem que outro sistema pretende usar. Não é que à partida esteja contra, mas o ónus da prova de que é melhor que a gestão monetária e fiscal keynesiana por bancos centrais e governos deve pertencer a quem quer implementar a novidade.
S.T.
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