Fonte: Associação Portuguesa de Seguradores |
Mas nesse total e a partir de 2016, os prémios dos seguros pagos pelas empresas aos seus trabalhadores ultrapassaram já os prémios pagos individualmente. O número de pessoas cobertas reflecte essa realidade. Em Dezembro de 2014, eram 1,1 milhões de trabalhadores cobertos por seguros e três anos depois, abrangiam já 1,439 milhões de trabalhadores, acima dos seguros individuais que passaram de 851,6 mil pessoas em 2014 para apenas 900 mil em 2017. Qual a razão para esta inversão? Muito provavelmente, o Orçamento de Estado OE).
Até 2014, os prémios de seguros para os seus trabalhadores eram considerados rendimentos de trabalho e sujeitos a IRS. De qualquer forma, o Código do IRS previa também - e ainda prevê - que parte da despesa dos contribuintes individuais em seguros de saúde contava - e conta ainda - para as deduções fiscais à colecta com despesas de saúde, desde que tivessem "sido comprovadamente tributados como rendimento do sujeito passivo".
Mas a partir do primeiro dia de 2015, a lei do OE para 2015 introduziu um aditamento ao Código do IRS.
No seu artigo 2-A, passou a ficar explícito o que "não se consideram rendimentos do trabalho dependente". Várias despesas patronais, a maior parte delas que contam como remunerações indirectas: "As prestações efetuadas pelas entidades patronais para regimes obrigatórios de segurança social, ainda que de natureza privada", "as prestações relacionadas exclusivamente com ações de formação profissional dos trabalhadores, quer estas sejam ministradas pela entidade patronal, quer por organismos de direito público ou entidade reconhecida", "as importâncias suportadas pelas entidades patronais com a aquisição de passes sociais a favor dos seus trabalhadores", "as importâncias suportadas pelas entidades patronais com encargos, indemnizações ou compensações, pagos no ano da deslocação, em dinheiro ou em espécie, devidos pela mudança do local de trabalho", os rendimentos recebidos pelos trabalhadores "após a extinção do contrato de trabalho, sempre que o titular seja colocado numa situação equivalente à de reforma".
E - além dessas e claro está - "as importâncias suportadas pelas entidades patronais com seguros de saúde ou doença em benefício dos seus trabalhadores ou respetivos familiares desde que a atribuição dos mesmos tenha carácter geral". Estranhamente, já que, a partir de 2014, graças ao OE 2014, esses prémios de seguros tinham ficado incluídos precisamente nos rendimentos de trabalho a tributar (ver pag 7056 III).
Qual é, pois, a importância desta regra que ainda está em vigor?
Antes, os prémios eram correctamente considerados como uma forma indirecta de retribuição e eram penalizados em IRS como rendimento dos trabalhadores. Era uma forma indirecta de remuneração, mas que beneficiava já as entidades patronais porque servia para compensar ausência de aumentos salariais mais acentuados. Tinha outra vantagem: era uma remuneração que podia ser reduzida ou mesmo cortada uniletaralmente pela empresa, e sobre a qual não pagavam contribuições para a Segurança Social (apesar de ser considerado rendimento do trabalho).
Depois, as entidades patronais não só gozam dessas mesmas vantagens de ser uma remuneração indirecta cujos valores podem ser reduzidos a qualquer momento, como ainda por cima podem alegar aos seus trabalhadores que desde 2015 nem sequer vão pagar IRS por isso. Trata-se de um subsídio público às empresas privadas, à forma de retribuição indirecta e, em última instância - e neste caso concreto - às companhias seguradoras. E em muito última instância aos trabalhadores.
Mais e mais inviamente:
1) fiscalmente, os prémios de seguros pagos aos seus trabalhadores abatem totalmente aos proveitos das empresas, pelo que quanto maior for a remuneração indirecta de trabalho, menor será o IRC sobre lucros a pagar. E em 2012 foram 546 milhões de euros pagos pelas empresas em prémios de seguros de grupo, mas em 2017 já eram 742 milhões. E quanto maiores as empresas, maior o bolo a descontar aos lucros.
2) A expansão dos seguros de saúde, conectados ao funcionamento do sector privado de saúde, aliciou num primeiro momento os profissionais da saúde que viam os seus rendimentos complementados com uma perninha no sector privado. Estabeleceu-se um negócio entre as companhias de seguros e os médicos em torno do valor do K, ou seja, a unidade de referência para o cálculo de cada acto médico. No princípio, o K era elevado e todos ficaram contentes. Mas o valor do K tem vindo a baixar por decisão das companhias seguradoras e os médicos tornaram-se em autênticos caixeiros viajantes, que andam de terra em terra, de instituição em instituição, de acto em acto, para conseguir a sua remuneração adicional. Ficaram na mão das companhias seguradoras. Pior ainda: antes quando trabalhavam nos consultórios (em complemento com o sector público) recebiam na hora. Agora, as companhias diferem os pagamentos...
Por tudo, os responsáveis pelo Estado têm de ter em atenção aos efeitos perversos das suas decisões. Por que deverá o Estado promover a expansão de seguros de saúde, já que se encontram em clara expansão? Quem e o quê se está a beneficiar com esta protecção pública?
5 comentários:
A subliminar implicação é que toda a vantagem proveniente do trabalho, desde que mensurável, deve ser tributada.
A segunda e mais óbvia implicação é que o SNS deve colher receitas e assegurar serviços que cubram as necessidades de saúde, tornando marginais os serviços privados.
Estado ueber alles é não surpreendentemente a tónica.
Não é de estranhar e se olharmos para o outro lado do problema esta é mais uma decisão que vai no sentido da destruição do SNS que se encontra em curso há já uns anos em que vemos crescer o sector privado (o Nº de hospitais privados já ultrapassa o nº dos hospitais públicos forja mais 10 unidades privadas para os próximos anos). Se olharmos para o orçamento de estado nos últimos anos verificamos quer uma redução no sector da saúde( a suborçamentação dos hospitais tem vindo a ser exposta)quer no aumento da parte do orçamento do estado para financiamento privado de 13% há cerca de 6/7 anos para 27% em 2016 (senão estou em erro).
Eis a defesa dos privados uberalles e a sua engorda manhosa e desonesta à custa do sofrimento e da doença.
Não é surpreendente a tónica do discurso de Jose.
De facto o direito à saúde é um direito constitucional. E Jose chegou a apelar a um golpe de estado contra a própria Constituição
Já agora.
O que se denuncia neste oportuno post não é a a "vantagem proveniente do trabalho" e outras tretas adscritas.
O que se denuncia é um subsídio público às empresas privadas, à forma de retribuição indirecta e, em última instância - e neste caso concreto - às companhias seguradoras. E em muito última instância aos trabalhadores.
O que se denuncia é o estado promover a expansão de seguros de saúde, que se encontram em clara expansão
O que se denuncia é quem e o quê se está a beneficiar com esta protecção pública
Isto que o João Ramos de Almeida faz é Serviço Público. É isto também que faz agitar, inuqietar e estremecer o sujeito das 12 e 09
estes serviços privados "oferecidos" aos trabalhadores são em geral de péssima qualidade com comparticipações irrisórias.
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