terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Conhecimento para o planeamento


Houve um tempo em que o Estado tinha centros de apoio técnico à decisão política nos ministérios, com gente experiente e conhecedora, pensando estrategicamente para lá da espuma dos dias. 

Estou a pensar, por exemplo, no Gabinete de Estudos Básicos de Economia Industrial (GEBEI) do Ministério da Indústria. O GEBEI de João Cravinho ou Félix Ribeiro foi destruído pelo cavaquismo. Não foi obviamente o único caso de esvaziamento deliberado da capacidade estatal, mas foi um caso recentemente estudado

Na lógica neoliberal, o Estado não precisava de política industrial digna desse nome e os estudos podiam ser de qualquer forma encomendados a peso de ouro aos Porters e às consultoras dos powerpoints desta dependente e medíocre vida. As leis podiam ser feitas em grandes escritórios de advocacia de negócios e assim sucessivamente. 

Lentamente, e de forma contraditória, há um reconhecimento político dos desastrosos resultados desta irresponsável miopia institucional. O PlanApp é de facto uma boa ideia:

“A ideia de que, em vez de ver o Estado a contratar consultoras privadas, é possível ter nas Administrações Públicas as competências necessárias para avaliar o impacto das políticas, antes e depois de serem adoptadas, é, afirma Paulo Areosa Feio, ‘uma tendência que nos últimos 10 anos, desde a crise financeira, se tem vindo a acentuar em muitos países’.”  

3 comentários:

Anónimo disse...

O progresso implica planeamento e estratégia, não é aceitável que os governos não tenham uma ideia própria para o país, repetir o que é dito em Bruxelas é sinal de incapacidade e incompetência. Há que colocar as pessoas certas nos lugares certos.

Anónimo disse...

Entre as "Medidas a Curto Prazo" do programa do MFA, no ano da revolução de Abril, destacava-se, entre outras, a seguinte: "O Governo Provisório lançará os fundamentos de uma nova política económica, posta ao serviço do Povo Português, em particular das camadas da população até agora mais desfavorecidas (...), o que necessariamente implicará uma estratégia antimonopolista". O Governo Provisório, com Adelino da Palma Carlos como 1º Ministro e com Vasco Vieira de Almeida a dirigir um Ministério da Coordenação Económica com sete secretarias de estado, acabou por ter vida curta, cerca de dois meses apenas, dando lugar ao primeiro de cinco governos provisórios liderados por Vasco Gonçalves.

Durante a curta vida do Governo Palma Carlos, coube às secretarias de estado do ministério da Coordenação Económica - nomeadamente a da Indústria e Energia (a cargo de José Torres Campos) e a do Planeamento Económico (a cargo de Vítor Constâncio) - a responsabilidade de iniciar o lançamento dos "fundamentos de uma nova política económica, posta ao serviço do Povo Português". Graças ao precioso contributo do GEBEI, foi possível, p.ex., concluir rapidamente a versão preliminar - num documento bastante longo e detalhado - de um decreto-lei visando o controlo pelo estado das "indústrias básicas de excepcional interesse nacional", sob a responsabilidade directa das secretarias de estado de Torres Campos e de Constâncio: os autores chamavam-lhe "decreto dos 51%", por razões óbvias.

A versão preliminar do "decreto dos 51%" foi apresentada ao ministro Vieira de Almeida, e a resposta não tardou, sob a forma de uma versão corrigida em que praticamente todo o texto da versão preliminar era preservado: a única correcção consistiu na substituição de 51% por 25%.

É claro que o decreto acabou por ir parar à gaveta, à espera de melhor oportunidade...


A. Correia

Anónimo disse...

No meu comentário anterior há uma correcção óbvia a fazer: onde se lê "cinco governos provisórios liderados por Vasco Gonçalves" deve ler-se "quatro governos provisórios liderados por Vasco Gonçalves".

A propósito dos quatro governos liderados por Vasco Gonçalves, recordo aqui que, entre outros perigosos esquerdistas, Mário Soares fez parte do elenco ministerial nos três primeiros; e um perigoso esquerdista chamado José da Silva Lopes foi ministro nesses quatro governos, exercendo depois o cargo de governador do Banco de Portugal até 1980.

A. Correia