quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Quanto tempo falta?

Excelente trabalho do Negócios de ontem, em especial de Nuno Aguiar, dando também espaço ao comentário do Nuno Teles: “com ou sem cautelar, recuperação da soberania não tem hora marcada”. Se este título é certeiro, aconteça o que acontecer – resgate, programa cautelar ou saída à irlandesa –, dadas as estruturas de constrangimento associadas ao euro, dado o facto de ficarmos sempre entre a espada do controlo pelas forças do capital financeiro e a parede das suas regras políticas, importa então perguntar: por que é que a farsa de Portas e do governo em torno da soberania pode ter algum efeito político, sendo que o ponto alto será uma semana antes das eleições europeias, ao contrário do que diz o relógio? Respondo parcialmente com outra pergunta: será que é porque ainda são poucos os que apresentam com clareza o que implica recuperar efectivamente as bases materiais da tal soberania, da capacidade para exercer a autoridade democrática sobre a política económica, ficando assim tal conceito demasiado à solta, entregue a artistas como Portas, que não são assim confrontados politicamente com as suas fraudes?

Entretanto, hoje, Helena Garrido escreveu um editorial no Negócios onde pergunta, tomando Portas como pretexto: “Soberania? Mas qual soberania?” Tende a associar a palavra ao salazarismo, ao nacionalismo agressivo, a conspirativos estratagemas políticos, etc. Seria melhor que perguntasse: Democracia? Mas qual democracia? É que a soberania é uma condição necessária, ainda que não suficiente, para a democracia. Não é por acaso que a nossa Constituição proclama, no seu artigo 1º, que Portugal é uma República soberana. É que sem isso não é possível ter um Estado de direito democrático e social.

Os defensores da actuais políticas estão a dar, por essa Europa fora, um magnífico contributo para a ascensão dos nacionalismos agressivos que dizem combater. O problema da atual configuração da UE e da existência do euro, da austeridade permanente aí inscrita, é serem as maiores ameaças à paz e à prosperidade na Europa, dado que no seu ADN está a destruição do grande estabilizador chamado Estado social, está a redução dos salários diretos e indiretos e tudo isto conjugado com a arrogância imperial, de um lado, e com a humilhação da dignidade nacional, do outro. Uma potente combinação. Neste contexto, falar de delegar soberania para obter paz e prosperidade é uma grande ilusão. Não se deve nunca delegar soberania democrática para uma escala irremediavelmente menos democrática. No fundo, é a mesma história de sempre, a que se repete com formas concretas sempre novas: as utopias liberais, as que destroem a soberania democrática, estão prenhes de monstros.

1 comentário:

R.B. NorTør disse...

Que dizem combater, mas os quais não lhes trazem grandes problemas...