domingo, 21 de março de 2010

Das causas estruturais

"Uma das causas estruturais desta crise foi o acumular de desequilíbrios macroeconómicos dentro da UE, os quais resultaram de uma agressiva política alemã de controlo de custos, especialmente os salariais, o que potenciou o seu crescimento pelas exportações. Daí resultou um acumular de excedentes externos que teve por contraponto os défices nos países do Sul. Tratou-se de uma corrida para o fundo em termos de custos salariais, na qual todos os países entraram, mas onde a Alemanha levou a melhor."

Excerto da entrevista do Nuno Teles ao Negócios. O Nuno foi co-autor de um relatório do Reseach on Money and Finance sobre a crise da zona euro.

5 comentários:

arnaldo disse...

li o texto para que o link remetia e fiquei com algumas dúvidas. todas elas pelo facto de não perceber nada de economia e por isso vim aqui perguntar, já que o Nuno é co-autor do blogue.
Há duas imagens que me passam pela cabeça. De forma muito simples: falamos de crescimento em que a parcela dos países do Sul é retirado à riqueza dos países do Norte, ou falamos de crescimento à custa de de países fora da UE? É que ambas parecem perniciosas. Por um lado, podemos baixar o nível de vida dos países mais ricos, por outro pisar o dos países mais pobres. No fundo, aquilo que pergunto é se esse crescimento não implica sempre a perda de riqueza nalgum lado e se estamos dispostos a que ele venha dos pontos do planeta em que não se discute o empréstimo da casa, mas a própria sobrevivência.
Em última análise, aquilo que pretendo saber, caso haja alguma resposta possível, é se a ideia de um crescimento contínuo é real ou se deve ser mesmo um objectivo.
Obviamente isto parte da minha ignorância, porque como não entendo muito bem como funcionam as políticas do tesouro e de emissão de moeda, ainda não consegui perceber como pode um movimento ascendente num lado não implicar, forçosamente, um movimento descendente noutro.

Agradeço desde já se poder haver uma resposta, poupar-me-ia uns meses largos de leitura porque a minha formação não passa, em nada, por este campo de estudos.

um abraço.

Luís disse...

Continuando reflexão anterior, ...

"e. Derivado do facto de [a Alemanha] ser uma economia com grande intensidade capitalística industrial (dados estruturais), o seu funcionamente gera recorrentemente uma tendência para a acumulação de excedentes de capital. Mais uma vez, se não se perceber a natureza híbrida do capital (enquanto capital-dinheiro e capital-capacidade produtiva) passar-se-á ao lado de toda a questão.
A União Monetário (Euro) mais a liberalização, vamos ironizar, equivaleu ao fim a arquitectura da "repressão financeira" na Europa. Os capitais que recorrentemente ficavam ociosos nos principais centros de acumulação de capital (vulgo Norte da Europa) ganharam uma porta de saída mais permissiva. Assim, num processo parecido com o rudemente descrito como a criação de moeda ex-nihilo (Schumpeter) - embora desta vez só em parte destinado a financiar a inovação-, os países periféricos obtiveram um poder aquisitivo suplementar cujos destinos foram precisamente os países que lhe haviam emprestado em primeiro lugar, e cuja capacidade industrial para dar resposta a esse acréscimo de procura já estava instalada (enfim, o telos de todo o processo!).

f. A tendência à sobreprodução dos países centrais foi assim, transitoriamente, e mais uma vez, postergada... Simplesmente, em comparação com qualquer outra coisa alternativa, o alargamente de mercado era maior se se desse à periferia preferência na possibilidade de se endividar... (voltaremos a estes assunto)...

IV. Chegámos inevitavelmente ao ponto quente. E esse é bem claro hoje, depois de o Governo do Norte ter, primeiro, ameaçado com a expulsão do euro dos incumpridores das regras do PEC, e agora, com a sinalização à Grécia que a próxima paragem é o Fundo Monetário Internacional (FMI). Não nos devemos surpreender; nem tão-pouco estar apreensivos. Era a solução mais natural para um país que não se quer entalar perante o eleitorado, nem perante a base monetária! Claro que a retórica vale o que vale; e depois de tanto pronunciamento estamos objectivamente no mesmo ponto que estávamos há um mês atrás. A partir do momento em que a Alemanha consentiu partilhar a sua soberania monetária com o resto da Europa, o processo ganhou vida própria. Hoje o Estado Alemão revesa-se para erigir um plano de "contenção de danos", mas poderá já ter chegado fatalmente atrasado ao contra-relógio da explosão da dívida.

Bem hajam."

António Carlos disse...

"Tratou-se de uma corrida para o fundo em termos de custos salariais, na qual todos os países entraram, mas onde a Alemanha levou a melhor."
O que eu acho estranho nesta análise é que, tendo Portugal logo à partida custos salariais muito mais baixos do que a Alemanha, não tenha "levado a melhor", nomeadamente sendo receptor de deslocalizações.

Uma questão que não é referida neste post, mas que já vi referida a propósito do relatório/trabalho citado, é a de que para contrabalançar os desequilíbrios entre excedentes externos e os défices deveriam surgir transferências financeiras "do Norte2 para o "Sul". O princípio até pode ser bom, mas já nos esquecemos da forma como Portugal aplicou o Fundo Social Europeu, os Fundos Estruturais, ...? Será que a realidade mostra que essa é boa uma (suficiente) solução, nomeadamente para Portugal?

Anónimo disse...

Cá por mim, há semelhança do que já faço com os produtos Israelitas e outros quejandos amigos destes, na medida do possivel, vou deixar de comprar produtos Alemães como por ex, deixar de ir ao LIDL (que, aliás, como manda a boa técnica capitalista, foi mas já deixou de ser um super de baixo custo ou de grandes descontos).
Pode ser que assim os excedentes da Alemanha deixem de o ser.

João Aleluia disse...

Sobre esta preversão da realidade já me pronunciei no post original.

Mas nunca é demais repetir que a culpar os outros pelos seus disparates este país nunca vai chegar a lado nenhum.