segunda-feira, 13 de julho de 2009

Entre o Estado Penal e o Estado Social

A crise económica alimenta o espectro do aumento da criminalidade e reforça perigosas derivas securitárias no nosso país. Pode estar criado o caldo de cultura, feito da enésima reinvenção do tema das "classes perigosas", agora com uma dimensão espacial acentuada: "os bairros perigosos". Em sociedades desiguais como a portuguesa tudo se conjuga para transformar as fracturas socioeconómicas num problema de caridade, essa administração ineficiente de paliativos que fomenta todas as distorções, e sobretudo num problema de polícia. A minha crónica pode ser lida no i.

Leituras complementares: «O Estado Penal numa era de crise»; os trabalhos Loïc Wacquant sobre o Estado Social e o Estado Penal; o último livro de Richard Wilkinson e Kate Pickett sobre os impactos negativos da desigualdade de rendimentos (o gráfico é retirado de lá).

5 comentários:

JOSÉ LUIZ FERREIRA disse...

O Estado Penal, ao tentar punir quem não tem nada a perder, arrisca-se a instituir penas cada vez mais duras e cada vez menos eficazes. É portanto ineficaz contra os crimes cometidos pelos mais pobres.

O Estado Social, ao tentar proteger quem não tem nada a ganhar, é ineficaz contra os crimes dos ricos..

Ou seja: uma política criminal «de esquerda» empurra o crime para a direita sem o diminuir; e uma política criminal «de direita» empurra o crime, também sem o diminuir, para a esquerda.

A dimensão penal e a dimensão social da política criminal devem ser como as duas hastes duma tenaz, que não deixe escapatória, nem para os criminosos pobres, nem para os criminosos ricos.

Unknown disse...

O Estado, quer penal quer social está construído com base numa legalidade edificada por sectores do capital, de modo que se têm instituído (também desde governos ditos à esquerda, contra o que diz JL Sarmento) uma série de delitos e faltas que vão além das leis naturais: criara-se uma legislação com o fim de assegurar a tranquilidade social, o crescimento sustido do bem-estar financeiro e o a estabilidade geral das coisas. De modo que os "ricos" de que fala JL Sarmento não têm necessidade de contravir visivelmente as leis. Eles podem fazê-lo sub-repticiamente, sem fazer ruído (apenas algum escândalo cá ou lá), mas os "pobres" têm constantemente de violar essa tranquilidade geral para não esmorecerem perante o abuso silencioso do capital. Acho, pois, que não se trata de um problema de direita ou esquerda ou de puxar a criminalidade para uma parte ou outra da sociedade, mas de que há uma parte dela que impõe tradicionalmente as suas leis. Nem mais, nem menos.

JOSÉ LUIZ FERREIRA disse...

«De modo que os "ricos" de que fala JL Sarmento não têm necessidade de contravir visivelmente as leis.»

Então porque é que contravêm?

beijokense disse...

Isto vai lá com o «modelo dinamarquês» - diminui-se a população prisional para o valor da Dinamarca e espera-se que a desigualdade de rendimento também diminua.

Filipe Melo Sousa disse...

Correcção: quando o roubo é perpetuado pelo estado via impostos, os elementos parasitários da sociedade já não precisam de roubar.

Moral do autor deste post: corra a entregar o ouro ao bandido, é a melhor maneira de fingir que não existe roubo. Um pouco ao jeito de quem dá a moedinha ao "arrumador" a fingir que não está a ser roubado, e do "arrumador" que finge ser uma pessoa honesta.

É isso que defende não é? Um clima hipócrita de roubo.