terça-feira, 20 de janeiro de 2009

A ignorância em todo o seu esplendor - II

De facto, esta 'crise' não é igual às outras e vai fazer muitos professores universitários deste país dar cambalhotas intelectuais para explicar como duas grandes heresias, segundo os cânones da "Ciência Económica", afinal passaram a ser instrumentos de política económica adequados e indispensáveis:

1) A nacionalização do sistema financeiro, ainda que temporária, a que vamos assistir em alguns países;

2) A monetarização da dívida pública (para os leigos: criação de moeda pelo banco central para comprar os títulos da dívida que os governos precisam de emitir para financiar as suas intervenções na economia), algo que o BCE está proibido de fazer ... (até quando?) porque provocaria hiperinflação.

Ao contrário do que Luís Aguiar-Conraria imagina, em 2009 não haverá razões para celebrar a "mão invisível" de Adam Smith, muito menos associando-a ao Darwinismo. Em vez de celebrações, tudo se conjuga para um cenário de grande sofrimento pessoal e social.

Os profesores de economia, que não pairam acima da sociedade, irão ter de abrir-se ao ensino de outras correntes da economia, mais tarde ou mais cedo, com mais ou menos convicção. Sim, "ressuscitando teorias caducas e mais do que refutadas". É a vida ... os paradigmas não são sistemas culturais estáticos (T. Kuhn); evoluem, confrontam-se com outros, cedem a hegemonia que tinham a outros que, entretanto, também foram evoluindo, num processo sem fim.

Por isso, o conhecimento científico (também é cultura, é bom lembrar!) não é um processo linear e cumulativo, pelo que é errado usar-se a expressão "avanços da Teoria Económica". É uma pena ver que pessoas inteligentes como Luís Aguiar-Conraria se deixem cegar pela ortodoxia. A confissão de Alan Greenspan no Senado dos EUA é um exemplo que deveria encorajá-lo. Um homem idoso, no fim de uma carreira que parecia ter sido de grande sucesso, reconhece sem reservas que afinal estava errado. Uma atitude corajosa e digna que devia ser ponderada pelos jovens-turcos que abundam na nossa pobre academia.

NB: Acabo de ouvir no programa A cor do dinheiro (RTP-N) um 'analista' entrevistado por Camilo Lourenço assumir abertamente a necessidade de uma intervenção radical do Estado no sistema financeiro. Sim, é de nacionalizações que falava. Em Portugal, no jornalismo dos negócios, o 'mainstream' começa a abrir brechas!

3 comentários:

Elisiário Figueiredo disse...

Não foi na SIC Noticias, foi na RTP Noticias.

Anónimo disse...

Elisiário Figueiredo,

Obrigado pela correcção. Vou alterar na posta.

Luís disse...

1. A Crise ainda não chegou sequer a seu clímex e já o pensamento parece ter regressado a olhar sobre uma suposta "normalidade" dos acontecimentos hodiernos!

2. Eu já nem falo da nacionalizações que sempre foi uma medida-fetiche de modernização de esquerda que resultou num fracasso. O seu regresso, hoje, 2008, não consitui mais que uma regressão histórica das condições de valorização capitalista. Saberá o Estado o que fazer com a banca? A questão não é de forma, mas de conteúdo: Sócrates já se viu a controlar toda a banca, Crise oblige, mas quando isso acontecer, deixa a crítica em que pé?! Sócrates é mais institucional do que qualquer institucionalista; pois ele é o poder institucionalizado!

3. O binómio ressuscitado que parece ser neoclássicos-keynesianos e que quer dar a primazia na resposta à situação aos segundos não evita que essa mesma resposta, no concreto, mais não seja que um saco de gatos que mistura tudo e mais alguma coisa que alguma vez se ensinou academia e onde pelo meio se fazem os mais vorazes atropelos à teoria e à história; e isso dos dois lados da contenda.

4. Os economistas-estes, que na situação presente não serão outra coisa que os mais fiéis aliados dos Bernanke e Trichets deste mundo (embora este ainda tenha que cumprir a cláusula da taxa 0 - lá chegaremos) acham que o mundo só vai para a frente que um mínimo de teoria ready-made e umas quantas descargas de helicóptro!

5. A monetarização da dívida pública que é aventada... ready-made.. porque nenhum BC ainda o fez; o que fizeram foi alargar a base monetária (FED) ou os respectivos balanços (FED, BCE), é uma medida que visa apagar o fogo, vamos é ver se a casa (power-house)não arde na mesma!

6. Crise de 29 ensina; segundo os estudiosos da matérica, a crise foi provocada pela insuficiência dos BCs em fornecer liquidez ao mercado (que é uma coisa diferente de monetizar a Dívida; mas que se revelar uma operaçaão degenerada pode muito bem resultar nisso), hoje é o teste à revisão conceptual das últimas décadas à maior crise que o Capitalismo engendrou - Bernanke ensina.

7.Apostas: a)desde o eclodir da crise o Ministro das Finanças Alemão que agora não me ocorre o nome já se revelou marxista (li no Ypsilon), neoclássico-passivista (li no blog do krugman), e keynesiano-activista (saiu a semana passada nas notícias). What's next? b) Gordon Brown, que alguém disse que salvou o sistema financeiro em Outubro, prepara-se em precipitar uma queda na libra nas próximas semanas ou meses (é tanto quanto a suposta "monetização da dívida" do sistema bancário, neste caso, resulta). O bloqueio continental -hoje não comercial mas financeiro -foi de novo erigido. Wanna bet?